A época passada foi de fracasso para o Barcelona deixando fugir campeonato espanhol e Liga dos Campeões para o rival Real Madrid. A Taça do Rei foi um prémio de consolação na despedida de Luís Enrique, que abriu as portas a Ernesto Valverde.

O ex-Athletic Bilbao assumiu a equipa e na pré-época manteve a base tática da última época, em 4-3-3 com Messi na direita, Neymar na esquerda e Suárez na frente. As coisas davam resultado, mas… o mercado mudou os planos de Valverde.

Neymar rumou a Paris e o Barcelona ficou, em teoria, menos forte. Valverde pareceu ficar um pouco confuso com o que fazer e numa Supertaça jogada a duas mãos com o Real Madrid mostrou essa confusão.

Em Camp Nou jogou no habitual 4-3-3, com Deulofeu a fazer de Neymar, e no Bernabéu mudou para um 3-5-2, colocando Messi e Suárez na frente.

Nenhuma das táticas deu resultado, com duas derrotas, mas do Bernabéu trouxe uma ideia que lhe está agora a dar resultado: Messi em terrenos mais centrais, solto do processo defensivo e com liberdade total.

Assim sendo, Valverde fez do seu Barcelona um «camaleão tático» e dizer que joga em 4-3-3 ou em 4-4-2 acaba por ser falacioso.

Passo a explicar.

No momento ofensivo este Barcelona organiza-se no 4-3-Messi-2. Ou seja, os quatro defesas, um triângulo a meio-campo, normalmente Busquets, Rakitic e Iniesta, e depois um extremo bem aberto na direita (Deulofeu ou Dembelé que chegou entretanto), Suárez a partir da esquerda para dentro e Messi entre o uruguaio e o extremo, mas com liberdade para percorrer os terrenos que quiser (como poderá ver mais abaixo).

Jordi Alba funciona como extremo, já que Suárez entra para a posição 9 e Iniesta joga muito por dentro.

Lá está Suárez a vir dentro e a deixar o corredor para Alba
Posicionamento inicial com bola: Suárez aberto à esquerda, Deulofeu à direita, três médios no meio e Messi onde quer. Com o decorrer da jogada, Suárez entra para 9 e Alba é o extremo.

No momento defensivo, o Barcelona tenta logo pressionar o adversário desde os centrais. Numa primeira fase num 4-3-3 disfarçado, com Suárez a tapar um pouco pela esquerda e Messi ao meio, e caso o adversário consiga avançar no terreno fechando em 4-4-2, com Iniesta a fechar pela esquerda.

O 4-3-3 disfarçado na primeira zona de pressão, antes de passar ao 4-4-2 (caso não recupere a bola), que se vê na imagem seguinte.
Organização em 4-4-2

ONZE PROVÁVEL

A maior incógnita prende-se com o lado direito, a lateral e o extremo. Semedo luta com Sergi Roberto e Aleix Vidal, mas deve ser titular, já que aos poucos tem convencido a afición e a crítica. Com ele em campo, o Barcelona ganha mais velocidade e acutilância ofensiva. Com Sergi Roberto ganha mais capacidade de passe (já tem duas assistências) e jogo interior. Defensivamente, Semedo dá mais segurança e maior capacidade de recuperação e anulação do espaço nas costas de Piqué. Se jogar em Alvalade, fará o primeiro jogo a titular longe do Camp Nou (jogou a segunda parte no Bernabéu).

Como extremo o reforço Dembelé era a opção prioritária, mas lesionou-se e só volta daqui a uns meses. Deulofeu deve ser chamado ao onze, ele que está de regresso ao clube, mas ainda não convenceu. Há ainda a hipótese de Valverde colocar Sergi Roberto ou Denis Suárez naquela posição, ganhando mais jogo interior e dando a Semedo mais capacidade para desequilibrar.

Paulinho foi outro dos reforços e tem estado bem, já com dois golos marcados. É normalmente o substituto de Rakitic e André Gomes o substituto de Iniesta. Caso um deles não esteja bem, Valverde pode chamar estes internacionais.

O super-Messi que vale 50% dos golos

Com o modelo bem definido, nesta altura da época, o Barça segue imparável com sete vitórias consecutivas (seis em seis para a Liga e uma na Champions) e com um super-Messi. O astro argentino soma já 12 golos sendo que os catalães têm 24 apontados. 50% dos golos são do génio, numa época em que Suárez ainda está a arrancar (2 golos).

Neste Barça, Messi ocupa terrenos mais centrais e, por isso, volta a estar mais perto de Iniesta e Busquets, «resto» do que sobra dos tempos de Guardiola. Talvez por causa desta mudança, os catalães têm subido a média de passes por jogo (602) e têm melhorado a eficácia de passe (89%), comparativamente à última época.

Não é um Barcelona com muitas oportunidades de golo, mas é um Barça mais objetivo e com uma velocidade extrema a tomar decisões no último terço. O processo até à zona de finalização baseia-se no toque curto, jogadores próximos e superioridade numérica em quase todas os lances, o que impede a perda de bola e possibilita desequilíbrios no adversário.

Normalmente o ataque do Barcelona desenvolve-se mais pela direita, fruto da presença do extremo (ora Deulofeu ora Dembelé, agora lesionado), das entradas de Rakitic e das basculações de Messi para esse lado (ver mais abaixo).

Só que do outro lado há Alba, um autêntico vaivém, e muitas vezes o Barça trabalha de um lado para virar o centro de jogo rapidamente e possibilitar as subidas e entradas na área do lateral.

Messi, o lateral, o médio e Suárez do lado direito. O argentino levanta a cabeça e coloca em Alba, liberto, já que Dembelé levou o lateral para dentro.

O espanhol é o melhor assistente do Barcelona com três passes certeiros, sempre ao 1º poste a solicitar a entrada de médio ou avançado.

Aliás, quer de um lado quer do outro esta é a preferência de cruzamento do Barcelona: passe pelo chão para o 1º poste.

Alba para Messi e golo. Suárez faz o trabalho de arrastar os defesas
Novamente um cruzamento para a entrada ao 1º poste. Mais frequente do lado esquerdo do ataque

Os 24 golos do Barcelona, esta temporada, foram apontados todos dentro da área e apenas cinco são de bola parada. Duas grandes penalidades convertidas por Messi e três golos na sequência de cantos, dois deles ao segundo poste (atenção a Piqué e a Paulinho, caso entre em jogo).

Os restantes 19 resultaram de jogadas de envolvimento e de combinação, quase sempre pelo chão. Para além da zona do 1º poste para finalizar, há mais uma zona a ter em conta pelos leões: a entrada da área.

Lionel Messi é exímio no remate e tem feito vários golos daquela zona. E mesmo que se saiba o que vai fazer, a diferença está na velocidade com que ele o faz, a tal sétima mudança.

Veja-se o primeiro golo com a Juventus.

Messi, de frente para o rival, vai tabelar com Suárez (que está entre os centrais) e entrar na área com bola para o remate que bate Buffon. Este movimento central de Messi é muito natural, mas feito a grande velocidade. O terceiro golo neste jogo é também naquela zona, mas a+i de forma individual. Veio da direita para dentro e fez mais um belo golo.

O segundo golo à Juventus também é exemplo do camaleão que Messi é dentro de campo. Como o jogo se desenrola pela esquerda ele faz-se de esquecido do lado direito, muitas vezes colado à linha e quando o Barcelona consegue virar rápido ele faz o resto. Aqui isolou-se, Buffon defendeu e depois Rakitic apareceu a fazer o golo.

Fez-se de esquecido na direita e acabou por decidir.

Valverde formou este camaleão com base em Messi e ele tem justificado a mudança. Golos, golos, golos e muita criação. A frase de Jorge Jesus explica um pouco o que tem acontecido aos adversários do Barcelona: «Quando o Messi está forte o Barça está forte.»

Mas há outra frase de Jesus, em entrevista à Marca, que explica como o argentino desbloqueia os rivais.

«Messi joga numa posição entre linhas que é mais difícil de identificar.»

E é verdade. O argentino joga onde quer, mas há um padrão. Quando não está em zona central, de costas para a baliza, cai muitas vezes para o lado direito, juntando-se muitas vezes a Rakitic e ao lateral ao extremo, para confundir marcações e depois atacar o adversário de frente.

Suárez a 9, Deulofeu como extremo direito, o triângulo do meio-campo bem montado e Messi cola-se a Semedo para organizar. O corredor esquerdo é todo para Alba
Mais uma vez Messi numa zona recuada para depois encarar o jogo de frente para a baliza.
Messi substitui os médios na primeira fase de construção
Messi entre linhas, centrais ficam sem ninguém para marcar
Messi novamente do lado direito. Aqui, sem Iniesta em casa, o Barça ataca mais declaradamente em 4-4-1 + Messi, com André Gomes a jogar à esquerda.
Não estando recuado pela direita, ocupa uma posição central do terreno, arrastando Suárez um pouco mais para a esquerda.

Cria superioridade, pensa o jogo e depois acelera rumo à baliza. É um génio e já esta época houve muitas formas de o tentar parar, quase sempre em vão. No último jogo, com o Girona, Pablo Maffeo fez marcação homem-a-homem durante os 78 minutos em que esteve em campo, mas nem isso parou o Barcelona, embora Messi não tenha marcado. Mas fez jogar e muito!

O que falta olear na máquina?

Só que este Barça não é uma máquina perfeita, aliás não existem. Há zonas que os leões podem explorar, embora terão de ser muito eficazes, já que estas situações não são muito frequentes.

Quando o Sporting conseguir iniciar o jogo por trás, sobretudo pela esquerda, ou seja, atraindo para aquela zona o Barça, deve bascular rapidamente para a direita, já que nesse momento a ajuda a Alba está indefinida.

Suárez tapa pela esquerda do Barça, mas muito adiantado e Iniesta só mais tarde cai na zona para formar a linha de quatro. Nesse período Piccini e Gelson podem ter superioridade, a chave está em conseguir passar rapidamente a linha do Barça e bascular para aquele lado.

Em momento de posse no meio-campo dos blaugrana, o Sporting também pode aproveitar aquele lado ou o espaço entre os centrais. 

Lado esquerdo do Barcelona sempre pouco povoado, Iniesta entra muito dentro

Outro aspeto a explorar é o contra-ataque. Se os leões conseguirem roubar a bola na zona central podem tirar partido da projeção dos laterais do Barcelona para chegarem a zona de finalização.

A Juventus recuperou e podia ter tirado partido das laterais, mas não tinha ninguém do lado direito. É uma zona que Gelson pode aproveitar. Neste jogo a Juventus não tinha um extremo pela direita nem um lateral ofensivo.

O Barcelona é uma equipa que joga com as linhas sempre muito próximas e sempre muito subidas. Não raras vezes, os centrais jogam para além da linha de meio-campo. Por isso as costas estão sempre vulneráveis, mas o segredo culé está na pressão defensiva coordenada por Busquets, quando existe a perda de bola. Algo raro!

Centrais e médio defensivo identificados, quase nos últimos 30 metros

Entrando em zona de finalização, o espaço preferencial para cruzamento será o 1º poste, sobretudo as costas de Piqué. O Barcelona sofreu até agora sete golos, mas cinco deles foram ainda na fase de transição de sistema, nos dois jogos com o Real Madrid.

Daí para cá apenas dois golos sofridos: um com o Getafe num remate de longe (pode ser solução para Bruno Fernandes) e outro com o Eibar precisamente na zona do 1º poste. Já com o Real Madrid, Piqué fez um autogolo ao tentar cortar a bola nessa zona.

Para além dos golos, a maior parte das oportunidades que o Barça concede dentro de área são naquela zona. Do outro lado, Umtiti é mais difícil de ultrapassar.

Piqué não vai conseguir o corte e Espanhol consegue finalizar, embora sem dar golo.

O jogo avizinha-se muito complicado e é fácil dizer que o segredo de parar o Barcelona está em parar Messi. Difícil é fazê-lo!

A FIGURA: MESSI, acima de todos!

Dispensa apresentações, certo? Eterno candidato a melhor jogador do mundo, um dos melhores jogador de sempre e já com cinco Bolas de Ouro em casa. Este ano já leva 12 golos em 24 do Barça. Este é o cartão de visitas do argentino. Dentro de campo está acima de todos os craques que o Barcelona tem e neste esquema de Valverde é ainda mais letal, livre de qualquer amarra defensiva e solto para percorrer os terrenos que quiser. Daqueles pés pode sair qualquer coisa e todo o cuidado é pouco para os pupilos de Jorge Jesus.