Foi imperfeita, mas nada má a história de amor escrita por Rio Ave e Marítimo em véspera de S. Valentim.

O romantismo das jogadas, a paixão impetuosa dos remates de longe, a força que move montanhas das arrancadas rumo à área contrária, a emoção da incerteza, o conforto de uma segurança defensiva que só não travou o impossível. Houve de tudo. Faltou consumar no golo. Marcar ficou, enfim, para outras núpcias. O que, tendo em conta que foi um jogo bem agradável de seguir, dá mais uma prova de que há várias formas de fazer resultar um relacionamento. O desta noite resultou sem golos.

E foi justo que assim seja, embora o Rio Ave possa queixar-se mais. Foi quase sempre o lado ativo da história. Dominador por mais tempo. Perigoso. Alternando o romantismo do rendilhado, com a paixão da verticalidade. Mas teve pela frente um Marítimo organizado. Muito bem organizado. Como, certamente, já esperava.

Daniel Ramos assenta o futebol da sua equipa na organização e só depois lhe acrescenta vertigem. O Rio Ave não é muito diferente, é certo, mas esta noite quis mais. Compreende-se: está atrás na tabela e precisa recuperar, dentro daquela meta estabelecida do melhor lugar possível dentro dos oito primeiros. Só deu para um ponto.

Mas com tudo isto, não é de estranhar, em suma, que, sem deslumbrar, tenha sido um jogo bom de seguir.

Luís Castro apostou em Rúben Ribeiro como falso extremo, no lugar do lesionado Heldon, entregando a batuta a Krovinovic, nas costas de Gonçalo Paciência. A verdade é que, apesar de várias jogadas bem gizadas e de rendilhados que saíram bem e arrancaram palmas, foi através da força bruta que o golo se aproximou mais. Sobretudo em tentativas de longe.

Só na primeira parte, Gonçalo Paciência, depois Lionn e, já em cima do apito para o intervalo, Petrovic tentaram a sorte e não ficaram longe. Paciência, aliás, ainda atirou ao lado, em esforço, a melhor jogada coletiva do Rio Ave no primeiro tempo, após centro de Gil Dias.

Havia rosas e chocolates. Sedução pura. Mas também convites diretos que aproximavam o final, sem nunca este chegar.

O Marítimo, por seu turno, apoiou no inesgotável pulmão de Fransérgio o seu jogo. As arrancadas pelo centro do médio já atado pelo Sp. Braga foram uma dor de cabeça constante para Luís Castro, provando que a dupla de médios, hoje sem Tarantini (só entrou no segundo tempo) e formada por Petrovic e Pedro Moreira, ainda precisa afinação.

Numa delas, de resto, Fransérgio isolou Dyego Sousa, só que o remate saiu ao lado. A par de um livre de Ghazaryan, que também saiu a rasar o poste, foi a melhor amostra do Marítimo no primeiro tempo. A equipa de Daniel Ramos, mesmo estando mais tempo por baixo, nunca perdeu a cabeça, deu sempre ideia de ter o jogo controlado, mas faltou-lhe outra acutilância na hora de decidir.

A melhor notícia para o jogo é que se a primeira metade tinha sido agradável, a segunda foi ainda melhor. Se o aperitivo correu bem, o jantar não ficou atrás.

Houve mais Rio Ave, que colocou duas bolas no ferro, por Rúben Ribeiro e Krovinovic, intervaladas por uma resposta idêntica do Marítimo, numa chapelada de Maurício que quase resultava no golo da época.

Gonçalo Paciência, mesmo que, na reta final, com Guedes por perto, continuava a ser o homem em foco. Arrancadas imparáveis, remates com força. Nem sempre decidiu bem, é certo, e, também por isso, as suas obras tiveram sempre o mesmo destino: qualquer coisa que não o golo: ou ia ao lado, ou esbarrava na perna do rival ou morria nas mãos de Charles.

Do lado insular, além de dois remates de Brito, entrado perto do fim, que Cássio defendeu, até houve festa, por segundos, antes de Luís Ferreira anular, bem, o golo de Maurício. Estava fora de jogo. Não terá estado tão bem o árbitro num lance na outra área, em que parece ter havido falta de Patrick sobre Rúben Ribeiro.

Um percalço mais nesta história de amor de 22 homens com a bola. Com vontade, com arte, com paixão, mas sem golo. Já diz o povo: não há amores perfeitos. Mas quem tenta com tanta veemência fica sempre mais perto de o conseguir.