O FC Porto venceu em casa o Moreirense. Esse é o único ponto em comum com os tradicionais embates entre portistas e cónegos na Invicta. Para a história fica o resultado mas igualmente uma reviravolta que os azuis e brancos não proporcionavam há quarenta anos (3-2).

Os veículos oficiais do clube portista projetaram o jogo deste final de tarde como uma oportunidade para regressar às vitórias e honrar a tradição. Isto porque o Moreirense surgia como uma das equipas da Liga sem registo de triunfos sobre os portistas e nunca tinha sequer marcado um golo no Dragão.

Sabemos porém que o futebol atual dita mudanças a um ritmo vertiginoso e que a tradição já não é o que era. Neste caso, nem o FC Porto está imune a erros de gestão nem o Dragão é um reduto temível para os seus adversários.

É certo que o FC Porto criou oportunidades em cima de oportunidades para recuperar de uma desvantagem inusitada. Mas isso só aconteceu após dois golos de um adversário que nunca tinha marcado no Dragão. Preocupante e motivo de reflexão para o futuro.

A equipa de José Peseiro encontrou em Stefanovic um opositor de peso às suas intenções e sobra essa curiosidade: o sérvio já foi um entre muitos guarda-redes dos quadros portistas. Opções para a baliza nunca faltaram, ao contrário do que acontece no eixo defensivo, onde um jovem nigeriano que chegou à Europa em janeiro de 2015 como médio pega de estaca na equipa principal dos dragões no espaço de um ano, já como central.

Chidozie, autor de uma exibição soberba no clássico da Luz, demonstrou frente ao Moreirense as falhas naturais de quem tem apenas 13 meses de futebol europeu e 6 de defesa-central. Boateng viu o adversário entregar-lhe de bandeja o corredor central após perda de bola de Maxi e toque de Nildo - no limite do terreno de jogo? - para Evaldo. Casillas não foi lesto a sair da baliza, evitou o primeiro ensaio mas Iuri Medeiros marcou à segunda.

Abra-se um parágrafo para escrever sobre Iuri Medeiros. Que grande, grande jogador. Faltava-se dimensão física para associar ao pé esquerdo vertiginoso mas até nesse aspeto o criativo dos quadros do Sporting parece estar a evoluir.

Perto da meia-hora de jogo, com o FC Porto sem perceber ainda o que lhe estava a acontecer, Iuri fez uma abertura brilhante para Fábio Espinho e o Moreirense voltou a beneficiar dos equívocos da dupla Chidozie-Casillas. Um deixou o adversário ganhar nas costas, o outro ficou a meio caminho.

Convém recordar que estas foram duas das melhores unidades dos dragões no providencial triunfo no clássico, no Estádio da Luz. Mas os elogios foram tão merecidos como as críticas deste domingo.

O FC Porto via-se a perder por 0-2 frente a um Moreirense repleto de personalidade e a respirar confiança, mesmo sem o seu goleador-mor (Rafael Martins). José Peseiro agradeceu o regresso de Marcano para compensar a lesão de Indi e sentou Aboubakar para entregar a frente de ataque a Suk.

Hyun-Jun Suk fez pela vida, em esforço, representando no fundo o que os adeptos esperam dos seus jogadores: a qualidade pode não ser a suficiente – e ela falta a algumas unidades, é claro – mas o suor tem de escorrer por aquelas camisolas listadas de azul e branco.

O avançado recrutado ao Vitória de Setúbal participou no assalto dos dragões à baliza do Moreirense e chegou a atirar ao ferro, num golpe de cabeça.

O FC Porto precisava de marcar pelo menos um golo antes do intervalo e ele chegaria envolto em polémica. Antes, Brahimi tinha caído na área em lance com Danielson. O árbitro mandou seguir e merece o benefício da dúvida. Como merece ao minuto 42, quando considerou que André Micael não tocou apenas na bola mas igualmente em Maxi. Não parece, ainda assim. Layún, da marca de penálti, reduziu a desvantagem.

Dos pés e da cabeça de Layún vieram sobretudo boas notícias para a formação portista. Para além do que joga, o lateral mexicano vai demonstrando ser um dos elementos com maior entrega e atitude no seio do grupo. Discutiu, incentivou, puxou pela equipa. No fundo, demonstrou que a mística não é apenas uma questão de antiguidade. Por vezes, o perfil certo é meio caminho andado.

O Moreirense regressou para a equipa complementar com a vontade de repetir a graça e Casillas teve de se aplicar perante remates de Nildo Petrolina e Iuri Medeiros. A partir daí, porém, deu apenas FC Porto.

José Peseiro trocara o inconsequente Jesus Corona por Evandro e correu maior risco ao minuto 64, numa corrida contra o tempo, abdicando de Chidozie para lançar Marega. O empate chegaria pouco depois.

As bolas paradas foram a solução, já que o carrossel portista não tinha sucesso perante a muralha visitante. Na sequência de um canto cobrado por Layún, Suk finalizou com categoria ao primeiro poste.

Sobrava tempo para a reviravolta completa, embora tal não fosse comum nas últimas décadas do FC Porto. Mas, como se escreveu acima, a tradição já não é o que era.

Os dragões fizeram esta noite o que não faziam há 40 anos na Liga: recuperar de um 0-2 para um 3-2. Foi isso que Evandro garantiu de cabeça, após cruzamento de Layún e desvio acrobático de Herrera ao segundo poste, numa bola que motivou protestos dos jogadores contrários. 

O FC Porto operou a reviravolta em esforço, agarrado ao coração, impulsionado por um Dragão que trocou os assobios iniciais por um ato de fé. O tempo deu-lhe razão. Ainda não é hora de atirar a toalha para o chão.