O FC Porto assume no Relatório e Contas da SAD relativo à epoca 2015/16, onde apresenta prejuízos recorde de 58,4 milhões de euros, que está em incumprimento das regras de fair play financeiro da UEFA. Os dragões caem assim na alçada do controlo financeiro do organismo, sujeitos a um processo de monitorização e a eventuais sanções. São o segundo clube português nesta situação, depois do Sporting.

O incumprimento mais óbvio pelo FC Porto das regras do fair play financeiro prende-se com os resultados dos últimos três anos. Os regulamentos da UEFA prevêm que um clube não possa dar mais de cinco milhões de euros de prejuízos ao longo de um período de três anos, admitindo que esse limite seja ultrapassado se o gasto adicional estiver «inteiramente coberto por uma contribuição/pagamento por parte do(s) dono(s) do clube ou entidade envolvida, até um tecto máximo». Esse tecto era de 45 milhões para os períodos de 2013/14 e 14/15, e de 30 milhões nos anos seguintes.

Ora nas últimas três épocas, as próximas que a UEFA vai avaliar, o FC Porto teve 40 milhões de prejuízo em 2013/14, depois 19,3 milhões de lucro em 2015/16 e agora 58,4 milhões de prejuízo. Um saldo muito superior ao limite de 30 milhões de euros admitido pelas regras do Fair Play.

Estes dados levam à conclusão óbvia, assumida pelos «dragões» no Relatório e Contas divulgado nesta quarta-feira. «Tendo em consideração os resultados obtidos nos exercícios económicos 2013/14, 2014/15 e 2015/2016 aqui apresentados, o resultado agregado do break even, no período de monitorização 2013/14 a 2015/2016 da FC PORTO, SAD, será deficitário e acima do desvio aceitável», lê-se no documento.

Este é o procedimento normal, diz ao Maisfutebol António Samagaio, professor no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG). «Tem de ser a própria entidade a dizer se está ou não a cumprir. Quem está do lado de fora não consegue fazer diretamente esse cálculo. A questão dos três anos é a que chama mais a atenção, mas há um conjunto de outros parâmetros, como os capitais próprios negativos, o ratio de gastos com o pessoal», explica o economista, confirmando que nesta altura o FC Porto «já está sujeito» ao processo de investigação aos clubes incumpridores: «Agora é aberto um processo do outro lado e vai ser analisado a que medidas o clube estará sujeito. Já vai ser sujeito a um processo de averiguações, uma análise ao que se está a fazer para recuperar as perdas, em função disso é que a UEFA irá deliberar.»

«Foi o que se passou com o Sporting», lembra António Samagaio. «No próximo ano o FC Porto tem necessariamente tem que apresentar resultados positivos, caso contrário tem consequências graves», constata.

Os números das últimas três épocas colocam seguramente os dragões sob monitorização apertada e em risco de consequências mais sérias se não inverterem a tendência. Mas para o conseguirem fazer já na próxima temporada precisariam de conseguir lucros muito altos, na ordem dos 39 milhões de euros: estaremos a contar com um ano de lucros de 19,3 milhões e outro de prejuízos de 58,4.

O FC Porto informa também no Relatório e Contas que já está em contacto com a UEFA. «O Conselho de Administração da Sociedade abordou os responsáveis da UEFA no sentido de explicar os motivos para o deficit apurado, que passaram pela decisão de não alienar os direitos desportivos de determinados jogadores de forma a não prejudicar a performance desportiva da equipa», diz o documento.

Portanto, a partir de agora entra em marcha um processo que coloca o FC Porto sob alçada do Comité de Controlo Financeiro de Clubes da UEFA (CFCB). O regulamento do fair play financeiro prevê uma série de sanções para os clubes em incumprimento, num leque que vai de uma simples repreensão à exclusão das competições europeias, tendo pelo meio medidas como retenção de prémios ou limitação de inscrição de jogadores nas provas da UEFA.

O Sporting já passou por esse processo. Numa primeira situação, em setembro de 2012, a UEFA anunciou ter retido prémios monetários aos leões e a mais 22 clubes, por «dívidas relevantes para com outros clubes e/ou para com funcionários e/ou referentes a impostos e taxas sociais». Em novembro o Sporting anunciou ter feito prova da inexistência de dívidas, mas dois anos depois o clube viria a estar de novo sob alçada das regras do fair play financeiro, agora devido ao desequilíbrio das contas, num processo que começou com a direção de Godinho Lopes e transitou para a de Bruno de Carvalho.

O Comité de Controlo Financeiro da UEFA começou por abrir uma investigação aos leões, entre outros clubes. Seguiu-se um processo de negociação e um acordo, que previa que os leões revertessem essa situação, apresentando lucro de pelo menos 4.9 milhões de euros positivos no saldo do exercício de 2014/15, para atingir o patamar dos 30 milhões negativos ao longo de três épocas. Mas o acordo não deixava de aplicar sanções: o clube ficou obrigado a inscrever apenas 22 jogadores nas competições da UEFA e também sujeito a uma multa de dois milhões de euros, esta suspensa.

Depois de a SAD do Sporting ter apresentado, 19,3 milhões de lucros nas contas de 2014/15, a UEFA viria a retirar o clube da lista de incumpridores em janeiro deste ano.

Quando caiu na alçada da violação do fair play financeiro, o Sporting tinha estes registo nas três épocas avaliadas: 45,9 milhões de prejuízo em 2011/12, mais 43,5 milhões negativos em 12/13 e 8,6 milhões de lucros em 13/14, um saldo global negativo de mais de 80 milhões de euros. Nos três anos em análise agora, de 13/14 a 15/16, o saldo negativo do FC Porto é de 79 milhões de euros. 

Os dragões acreditam que a UEFA seguirá o procedimento de estabelecer um acordo com o clube, antes de avançar para uma sanção mais pesada. Foi a ideia que deixou o administrador Fernando Gomes na apresentação das contas, nesta quarta-feira, sendo também o que defende o clube no Relatório e Contas. «É expectativa do Conselho de Administração da FCP, SAD, à semelhança de processos de investigação levados a cabo em épocas anteriores por clubes em situação similar, que a Sociedade tenha que cumprir com algumas obrigações e implementar algumas medidas, definidas pelo Comité de Controlo Financeiro dos Clubes da UEFA, que tenham como objetivo o equilíbrio do break-even em exercícios futuros», lê-se: «No entanto, é convicção do Conselho de Administração da Sociedade, tendo em consideração processos de investigação levados a cabo em épocas anteriores em clubes em situação similar, que as medidas passarão por uma abordagem de reequilíbrio económico-financeiro ao invés de uma mais punitiva, pelo que é expectável que não tenham um impacto significativo na performance desportiva e económica da Sociedade.»