Paulo Fonseca não regateia elogios a Jorge Jesus, seu antigo treinador no Estrela. «Nunca tive dúvidas de que iria chegar a um grande, mas confesso que não imaginava que viesse a ser o primeiro técnico português bicampeão».

Mas isso não tira méritos ao FC Porto de Lopetegui: «O problema em Portugal é que só se valorizam os resultados. E para valorizarmos quem ganha, geralmente desvalorizamos quem não ganha. E muitas vezes, não deve ser assim.»

Tudo para ler em longa entrevista ao Maisfutebol.

O Benfica é um justo campeão?
Quem ganha acaba por ser sempre um justo vencedor. O problema em Portugal é que só se valorizam os resultados. E para valorizarmos quem ganha, geralmente desvalorizamos quem não ganha. E muitas vezes, não deve ser assim. O Benfica fez um campeonato muito bom, muito bom mesmo em alguns aspetos, mas o FC Porto também fez. A pontuação do FC Porto tinha dado para ser campeão em quase todos os anos. A pontuação do FC Porto terá estado próxima dos melhores anos de sempre. E é preciso ver que o percurso do FC esta temporada foi marcado pelo trajeto na Liga dos Campeões, que foi excelente. Não sinto, por isso, necessidade, de desvalorizar a época do FC Porto para valorizar o mérito do Benfica.
 
Jorge Jesus já entrou para a história do futebol português?
Claramente. Todos sabem a admiração que tenho pelo Jorge Jesus. Foi meu treinador no Estrela, influenciou-me…

«Jesus tem feito coisas magníficas»

Imaginava, já nessa altura, que ele iria chegar onde chegou?
Nunca tive dúvidas que ele iria treinar um dos grandes. Mas nem sequer pensei que pudesse estar seis anos e ser o primeiro treinador português bicampeão no Benfica. Mas além dos resultados há outras coisas a analisar no trabalho do Jorge Jesus. Ele tem feito coisas magníficas, não só ao nível da qualidade do jogo, porque realmente apresenta uma ideia diferente e veio trazer ideia diferente em termos estruturais ao Benfica e ao futebol português. A valorização que ele consegue tirar dos seus jogadores, a forma como consegue fazê-los evoluir. Estar seis anos num clube como o Benfica só está ao nível dos melhores. Considero-o um dos melhores.

Dava-lhe muitas «broncas» quando era seu treinador?
Nem por isso (risos). Era muito exigente, sempre foi. E nós, como jogadores, somos com ele obrigados a pensar em todos os momentos. Eu tinha as minhas limitações, mas já estava numa altura em que pensava o jogo. E do ponto de vista tático e ao encontro do que ele queria. Não me lembro de ter qualquer situação com ele em que ele me afrontasse. Pode ter acontecido, mas não me recordo. Agora, ele é muito exigente e tem uma forma muito particular de lidar com as situações. Mas os jogadores percebem facilmente isso e aceitam isso. Os jogadores sentem que, com ele, evoluem.

Que treinador do futebol internacional tem como principal referência?
Pep Guardiola.
 
«Admiro quem tem uma ideia de jogo»
 
Além de Mourinho e Jesus, que outros treinadores portugueses quer destacar (seja a trabalhar em Portugal ou no estrangeiro)?
Admiro todos. Sinceramente. Admiro todos os que têm conseguido uma carreira ascendente, como é o caso do Leonardo Jardim, o André Villas-Boas e outros treinadores a trabalhar cá, como o Miguel Leal, que fez um excelente trabalho no Moreirense, ou o Rui Vitória, que está a fazer um excelente trabalho em Guimarães. O Sérgio foi também um excelente trabalho no Braga. Admiro quem tem uma ideia clara de jogo, independentemente de ser mais atacante ou mais defensivo. Desde que seja perfeitamente identificável, porque aí há trabalho. E todos os nomes que referi têm uma ideia muito particular sobre o que querem para as respetivas equipas.
 
«Estamos ao nível dos melhores»
 
Há uma forma especial de ser treinador português? Um jeito especial que leva ao sucesso repetido a nível internacional?
Acho que é uma competência que está aos olhos de toda a gente. Tenho tentado perceber como se trabalha lá fora, tentando perceber as outras formas de pensarem o treino e o jogo, e não tenho dúvidas em afirmar que nós, treinadores portugueses, estamos ao nível dos melhores. Os resultados dizem isso. O Leonardo tem feito um trabalho fantástico no Monaco; o Nuno foi para Espanha e está a fazer bom trabalho no Valência; o Paulo Sousa no Basileia. Já nem falo no Mourinho, não é preciso. Temos seis ou sete treinadores portugueses campeões em diferentes ligas e isso não é por acaso.


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O Paulo Fonseca coloca-se no lote dos melhores treinadores portugueses?
De maneira nenhuma. Não ponho as coisas dessa forma. O que sei é que tenho muito a evoluir, tenho 42 anos e tenho um longo caminho para percorrer e evoluir. Como treinadores, somos sempre um produto inacabado. Não me posso pôr ao nível dos melhores treinadores portugueses porque também os resultados não comprovam isso.