* Por Patrice Sintzen, especial para o Maisfutebol

Ficou conhecido em todo o lado devido a um vídeo com falhanços incríveis e morreu na estrada, no último sábado, por causa da louca vertigem da velocidade. Depois da sua morte, saíram notícias de que tinha sido multado 21 vezes nos últimos seis meses, dez vezes com registos superiores a 200 km/h. Na Bélgica, no entanto, a imagem que fica de Junior Malanda não é assim tão sombria: os testemunhos do mundo do futebol recordam-no como um grande talento e, acima de tudo, um amigo.

Nada tinha sido fácil para o filho de Bernard Malanda Adje, antigo jogador de voleibol e de andebol refugiado congolês em Bruxelas. Começou a jogar num parque de Bruxelas antes de passar por vários clubes e de chegar ao Anderlecht quando tinha 11 anos. Como os pais não tinham dinheiro, jogava muitas vezes com chuteiras já muito usadas. Talvez por isso, não conseguiu impor-se numa equipa com Adnan Januzaj, Jordan Lukaku (irmão de Romelu) e Davy Roef (segundo guarda-redes da equipa atual).

O Anderlecht deixou-o saír e Junior – como se tornou conhecido, por ter exatamente o mesmo nome do pai - optou por Lille, onde nunca conseguiu sair da segunda equipa. Quando Zulte Waregem, aconselhado por John Bico, lhe propôs um contrato mínimo (1.200 euros brutos por mês), ele aceitou e impôs-se - e a partir daí as coisas mudaram. Apenas com 17 anos, foi vice-campeão da Bélgica ao lado de Thorgan Hazard e Bryan Verboom.

Com 1,91 m e 81 kg, começou a ser conhecido como o novo Fellaini. «Chocar contra ele era como bater contra um autocarro», conta Brian Hamalainen, lateral esquerdo de Zulte Waregem. Esse corpo poderoso era o seu orgulho. Quando jogava nas equipas base, era conhecido pela alcunha de Urso. «Posso fazer cem flexões sem parar», orgulhava-se.

Pouco depois chegou à seleção belga de Sub-21. Vários clubes mostraram interesse no seu passe. O Fulham ofereceu 4,5 milhões de euros, mas o Zulte Waregem não o deixou sair. O pai convenceu-o a romper o contrato e ele foi treinar-se com o Roeselaere, da II Divisão.

«Não gostava da situação, foram os únicos momentos em que ele fugiu dos jornalistas, que tratava sempre por senhores», conta Jürgen Geril, do Het Nieuwsblad. A solução veio da Alemanha, mais propriamente do Wolfsburgo, próximo adversário do Sporting na Liga Europa, que ofereceu três milhões pela transferência e emprestou o médio defensivo ao Zulte Waregem, até ao fim da época.

Na Alemanha nem sempre foi titular, mas foi muitas vezes utilizado - e, apesar de uma rotura do ligamento cruzado, o clube recusou emprestá-lo ao Anderlecht. Malanda lutou para voltar ao onze mas jogava com menos frequência e desperdiçou oportunidades flagrantes frente ao Eintracht Frankfurt e ao Bayern Munique.

Triste, Junior vinha mais vezes à Bélgica para estar com os amigos de uma geração dourada, chamada Team 94: Michy Batshuayi, Jordan Lukaku, Natan Kabasele, Tortol Lumanza, Yannis Mbombo ou Anthony D'Alberto, que conduzia o carro na tarde desse fatal dia 10 de janeiro. Alguns não jogavam com regularidade, e a velocidade dava-lhes a dose de adrenalina de que precisavam e que não conseguiam alcançar em campo.

A morte de Malanda deixou muita gente sem palavras. Os jogadores de Zulte Waregem, a estagiar em Marbella no dia , foram dos mais afetados. «Nunca notei um silêncio tão pesado», conta o treinador, Francky Dury, que teve de anunciar a notícia aos antigos parceiros. «Junior gostava imenso de futebol, era a vida dele. Muitas vezes, ele e Thorgan Hazard ficavam em campo a seguir ao treino para rematar à baliza. Não tinha tanto talento com Thorgan, Praet ou Vazquez, mas estava sempre pronto a ajudar, a trazer o material de volta ao fim do treino, a tentar falar flamengo com os parceiros. Era obediente, respeitador, trabalhador, sério. Por isso toda gente gostava dele. Perdemos um amigo», resume.

A mesma coisa na seleção de sub 21, da Bélgica, onde era capitão. «Tinha-lhe dado a braçadeira, pois era um exemplo para todos», conta Johan Walem, o selecionador. «Falava muitas vezes com ele, sobre o seu futuro. Perdemos não só um talento, mas também um grande homem.» Até na seleção principal da Bélgica, onde ainda não tinha chegado, Malanda tinha amigos: na última segunda-feira, Romelu Lukaku chorou ao dedicar-lhe o golo apontado frente a West Ham.



Recorde alguns dos melhores momentos da curta carreira de Malanda: