Ibtihaj Muhammad nasceu em Maplewood, no estado de Nova Jérsia, nos Estados Unidos. Vai estrear-se como atleta olímpica nos Jogos Rio 2016. Será na esgrima, na disciplina de sabre. A atleta de 30 anos é por esta altura a nova estrela do desporto num país habituado a dominar o medalheiro olímpico. Mas não é só por ser candidata a uma medalha. É porque vai fazê-lo usando o hijab, o véu islâmico que lhe cobre a cabeça, enquanto representante dos EUA.

O inédito ganhou proporções de destaque nacional no início deste mês não só pelas qualificações da equipa norte-americana para as Olimpíadas, mas ainda porque o próprio presidente dos EUA, Barack Obama, destacou a presença de Ibtihaj Muhammad na missão desportiva do país ao Rio de Janeiro esperando dela uma medalha.

Ibtihaj é estrela nas notícias – do «New York Times ou das agências mundiais – pelo véu que uma norte-americana usará nos Jogos Olímpicos, mas isto só é possível pelos seus méritos desportivos. Estes, pelo seu lado, tiveram como ponto de partida as convicções religiosas da sua família, que implicam o uso do hijab, sempre, mesmo na prática do desporto.

«Quando a maioria das pessoas imagina uma esgrimista olímpica, provavelmente não imagina uma pessoa como eu. Felizmente eu não sou a maioria das pessoas. Sempre acreditei que com trabalho, dedicação e perseverança eu podia um dia caminhar com as minhas companheiras da equipa norte-americana em direção à história olímpica», afirma a atleta na página do seu perfil no site da federação de esgrima dos EUA.

Chegar onde chegou não foi por acaso, mas começou com algum acaso. A religião de Ibtihaj não só lhe impõe cobrir a cabeça com o véu como também não ter qualquer outra parte do corpo que não a cara descoberta: como braços ou pernas, por exemplo; o que implicaria sempre adaptações do equipamento.

Ela tinha 13 anos quando, junto com a sua mãe, repararam na equipa de esgrima do seu liceu a treinar. «Como elas estavam totalmente cobertas, a minha mãe sugeriu que eu experimentasse. Como uma mulher muçulmana, o desporto cumpria unicamente uma função. A minha religião requer que o meu corpo esteja totalmente coberto e a esgrima permitiu isso mesmo», afirma.

Permitiu-lhe que 17 anos depois vá estar nos Jogos Olímpicos e seja candidata às medalhas. A equipa feminina dos EUA de sabre foi campeã do mundo em 2014 e tem mais quatro bronzes em mundiais (2011, 2012, 2012 e 2015). Ibtihaj Muhammad esteve em todas essas equipas ao lado da compatriota Mariel Zagunis, campeã olímpica de sabre em 2004 e 2008.

Na recente prova de qualificação em Atenas, a equipa dos EUA de sabre confirmou a presença no Rio de Janeiro. Ibtihaj ganhou o bronze em Atenas e é atual nº2 do ranking norte-americano (e a 7ª do mundo) estando apenas atrás de Zuganis na tabela dos EUA (que é a nº3 do mundo).

Confirmada a presença dos EUA nos Jogos Olímpicos 2016 está também confirmada a presença de uma muçulmana norte-americana usando o hijab nas Olimpíadas. «Eu quero competir pelos Estados Unidos para provar que nada deve impedir alguém de atingir os seus objetivos: nem a raça, nem a religião, nem o género. Eu quero ser um exemplo de que, com perseverança, tudo é possível», diz a esgrimista.

Numa altura em que o Reino Unido levanta a questão da proibição do uso do véu islâmico que cobre a cara de forma integral (como o niqab ou a burqa) em locais públicos e o tema também já foi alvo de processos em tribunal pela sua interdição pela lei francesa, a atual campanha eleitoral para as primárias das eleições presidenciais norte-americanas também já teve posições mais extremas de alguns candidatos quanto às comunidades minoritárias e aos seus descendentes ou imigrantes.

A posição de Barack Obama foi a de destacar o papel de uma muçulmana envergado o véu islâmico em representação da sua nação. O presidente dos EUA fez por associar uma questão da globalidade sociopolítica atual ao desporto. E fê-lo pelo enaltecimento da importância que tiveram para o seu país atletas que, para este caso concreto, eram muçulmanos.

Num discurso na Sociedade Islâmica de Baltimore, no início deste mês, Obama lembrou o pugilista Muhammad Ali ou os basquetebolistas Kareem Abdul-Jabbar e Hakeem Olajuwon como exemplos da integração social no seu sentido pleno no âmbito desportivo. E não podia deixar o exemplo de Ibtihaj de fora; ela que estava presente na cerimónia.

«Uma das norte-americanas que vai acenar a [bandeira] vermelha, branca e azul será uma campeã de esgrima usando o seu hijab nas próximas Olimpíadas», disse o presidente dos EUA incitando-a a ganhar uma medalha mesmo sem querer colocar-lhe «qualquer pressão» em cima: «Ela está aqui hoje, Levanta-te, vá. Eu disse-lhe para ela trazer o ouro para casa.»