Manuel Balela, treinador que assumiu o comando técnico do Kawkab Marraqueche, da II Divisão de Marrocos, continua invicto no seu percurso no clube presidido pelo ex-jogador Tahar, que apostou no técnico algarvio para recolocar o emblema, com tradições no futebol do país, no escalão principal do futebol marroquino. No último fim-de-semana, o Kawkab venceu o líder da competição, o RSD, e ocupa actualmente o 4º lugar, a três pontos do topo da tabela. A subida de divisão é um objectivo, «mas extremamente difícil de concretizar», garante Manuel Balela, «porque a maioria dos jogos são decididos fora do campo, comprando os árbitros ou os jogadores das outras equipas». Ainda assim, após cinco encontros realizados como o português no banco, a formação de Marraquexe somou três vitórias e dois empates.
«É uma loucura. A maioria das pessoas acredita que só se conseguem os objectivos comprando árbitros, jogadores adversários, tudo o que se possa imaginar. Num dos últimos jogos, conseguimos ganhar por 1-0, mas a arbitragem foi surreal, com expulsões, grandes penalidades e faltas ao contrário. Mesmo assim, conseguimos ganhar», diz, entre gargalhadas, o técnico luso, que pegou numa equipa construída a pensar na manutenção e corre o risco de voltar a ter sucesso no futebol marroquino: «Na última vez que cá estive, há dez anos, coloquei a equipa na Taça de África e, no ano seguinte, conquistaram-na. Por isso, sempre fui muito respeitado, consideram que fui eu que montei essa equipa vencedora».
Os treinadores portugueses gozam de imenso prestígio em Marrocos, algo que acaba por surpreender os próprios, segundo confessa Manuel Balela. «Há dez anos, quando estive cá, treinei o Kawkab e estive apenas três meses no WAC, onde está agora o José Romão, e mesmo assim ele estava sempre a dizer-me que, quando chegou, só lhe falavam num Pires, o grande Pires. Só depois percebi que esse era eu, Manuel Pires, como era conhecido», relata o irmão de Fernando Pires, vulgo «Fanã», que treina desde Julho uma equipa de Omã.
Loucura generalizada e uma metrópole em crescimento
Manuel Balela não esconde o seu espanto quando confrontado com a crescente loucura em torno do futebol e o desenvolvimento de Marraquexe, «a capital económica de Marrocos». «Há duas coisas que me têm surpreendido, a forma como os adeptos vivem o futebol e o desenvolvimento de Marraquexe. No último jogo do campeonato, contra o líder da prova, estavam cerca de nove mil pessoas nas bancadas. Nos treinos, chegam a estar dois mil, e não adianta fechar as portas, porque eles saltam redes, telhados, vedações, tudo. No jogo do fim-de-semana, contra o líder, que vencemos, o árbitro ameaçou interromper a partida e castigar-nos com a derrota, depois de adeptos terem entrado em campo por três vezes. Quanto a Marraquexe, está cada vez mais desenvolvida, desapareceram os carros velhos que ainda se viam há uns anos e agora é só carros novos e luxuosos».
Satisfeito pelo regresso ao país africano, depois de ter «cumprido ou superado os objectivos em todos os clubes» por onde passou, em Portugal, Manuel Balela evita a euforia, lembrando ter ao seu dispor um grupo de jogadores que estão a superar-se mas que acusam de forma recorrente a pressão, como aconteceu no seu segundo jogo, frente a outra equipa, o Nejm, orientada por um técnico português, Eurico Gomes. «Foi um dérbi de Marraquexe e empatámos a zero, os meus jogadores acusaram muito a pressão do encontro e é isso que me leva a ter algumas cautelas, porque esta equipa foi construída para não descer e eu já sou o quarto treinador nesta época. O clube só estabilizou quando o Tahar assumiu a presidência, aliás, na mesma altura que eu entrei», concluiu.