O 10 sempre foi mais do que um número, um dorsal, mais até do que uma posição em campo. O 10 era o craque, o líder incontornável do ataque. Criador e, muitas vezes, também finalizador. No passado, muitas vezes o 10 era o 10, outras camuflava-se noutros números. «Os 10 e os deuses» recupera semanalmente a história destes grandes jogadores do futebol mundial. Porque não queremos que desapareçam de vez. 

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O nome diz pouco ao adepto comum. Nándor Hidegkuti faz parte da poderosa Hungria que domina o futebol nos anos 50 e é – com o risco que é dizê-lo perante a abrangência planetária do jogo – o primeiro (grande) número 10 de que há memória.

Na verdade, o jogador do MTK Budapeste é um falso-9, mais recuado no terreno, que com essa posição desfaz o WM magiar e ajuda a transformá-lo num revolucionário 4-2-4, graças também ao diferente posicionamento de Zakarias (mais central do que médio) e Bozsik (um pouco mais à frente, mais perto de Hidegkuti).

A menor profundidade de Hidegkuti provoca o equívoco nas marcações dos defesas rivais, indecisos em subir no terreno – abrindo espaço para os avançados-centro Puskas e Kocsis – ou ficar à espera, libertando o nosso herói para mostrar toda a inteligência em campo.

Dois jogos com a Inglaterra, em 1953, consolidam definitivamente as ideias de Gusztav Sebes. Em Wembley, os inventores do foot-ball caem copiosamente por 6-3, pela primeira vez perante um adversário não britânico, e a diferença até é magra tal a superioridade dos visitantes, que ainda têm um golo mal anulado, bastantes mais oportunidades e apresentam-se ainda pouco oleados na defesa. A diferença abismal começa a notar-se aos 90 segundos, com golo de... Hidegkuti, que marca ainda mais dois.

A Inglaterra já tinha tido antes problemas com esquemas diferentes do WM, em estado de graça há 30 anos, como no amigável com a Àustria perante o talento de Matthias Sindelar em 1932, com a Suíça e Alfred Bickel em 1947 e a Argentina e José Lacasia em 1951. Perante Hidegkuti, Harry Johnson fica sem saber o que saber, tem ataques de fúria e a sua seleção é atropelada. A história repete-se de forma mais dolorosa em Budapeste (7-1).

Hidegkuti e os poderosos magiares revolucionam o jogo. Não só com o fresquinho 4-2-4, mas também com a versatilidade dos seus elementos, dispostos a ocupar diferentes posições em campo, década e meia antes do totaalvoetbal holandês de Rinus Michels.

A Hungria permanece imbatível por cinco e ninguém tenta copiá-la, sair do WM que é a zona de conforto de muitas outras equipas. É Bela Guttman (sim, esse!) quem emigra para o Brasil e leva as novas ideias para o São Paulo, que, por sua vez, inspira o «Escrete» a tornar-se tricampeão mundial (1958, 62 e 70) e a conquistar de vez a Jules Rimet com uma última linha de quatro definitivamente implantada. O tal 4-2-4.

Com excelente controlo de bola, visão periférica, capacidade de passe, sentido posicional e o ainda 9 a assentar-lhe nas costas, Hidegkuti é o primeiro grande 10 da história. É com ele que começa a lenda.

A exibição de Hidegkuti frente à Inglaterra em 1953:

Nándor Hidegkuti
3 de março de 1922

1942-45, Elektromos FC, 53 jogos, 27 golos
1945-46, Herminamezei AC, sem registo
1947-48, MTK*, 314 jogos, 226 golos

* O MTK mudou várias vezes de nome nesta fase.

Campeão Olímpico (Hungria, 1952)
Vice-campeão mundial 1954
3 campeonatos húngaros (1951, 1953 e 1958)
1 taça húngara (1952)

Primeira série:

Nº 1: Enzo Francescoli
Nº 2: Dejan Savicevic
Nº 3: Michael Laudrup
Nº 4: Juan Román Riquelme
Nº 5: Zico
Nº 6: Roberto Baggio
Nº 7: Zinedine Zidane
Nº 8: Rui Costa
Nº 9: Gheorghe Hagi
Nº 10: Diego Maradona

Segunda série:

Nº 11: Ronaldinho Gaúcho
Nº 12: Dennis Bergkamp 
Nº 13: Rivaldo
Nº 14: Deco
Nº 15: Krasimir Balakov
Nº 16: Roberto Rivelino
Nº 17: Carlos Valderrama
Nº 18: Paulo Futre
Nº 19: Dragan Stojkovic
Nº 20: Pelé

Terceira série:

Nº21: Bernd Schuster