A equipa de hóquei do Benfica vai tentar conquistar a Europa este fim de semana, numa final-four disputada no Pavilhão da Luz.

Entre o plantel das «águias» há um campeão do mundo da modalidade: Carlos Nicolia, de 30 anos, é internacional argentino e foi o carrasco de Portugal no Mundial de 2015, nas meias-finais.

Brilhou, esteve em grande, decidiu as «meias», ajudou a aniquilar a «toda poderosa» Espanha na final e agora aponta o seu foco para a Liga Europeia, a Champions do Hóquei em Patins.

«Qualquer desportista quer ganhar um Mundial e uma Champions. É o objetivo de cada um. O Mundial consegui ganhá-lo pela seleção argentina, oxalá possa levantar a taça [da Liga Europeia] no domingo».

Este foi o início de conversa com um dos melhores do mundo da modalidade, após mais um treino de recuperação de uma lesão que o atormentou durante quase dois meses.

Sozinho, no Pavilhão da Luz, Nicolia treinou mais uma vez para melhorar a sua condição física, já que em dois meses fez apenas uma partida, no passado fim de semana, frente ao Paço D’Arcos, com o objetivo de ganhar ritmo para o duelo com o Barcelona.

Atrasou-se, pediu desculpa de imediato e ainda enquanto se sentava fez um pedido: «Puedo hablar español? No hablo português muy bien.»

Não havia problema, claro, e lá prosseguimos para a antevisão da Liga Europeia.

O argentino não escondeu a ambição de conquistar pela primeira vez este troféu, mostrou muito respeito pelo Barcelona, rival das «meias» e contou que os argentinos que compõem o plantel dos catalães também respeitam muito os «encarnados».

Pode ler a antevisão da final-four da Liga Europeia com Carlos Nicolia e Ricardo Barreiros (jogador da Oliveirense) AQUI.

Não há como não haver respeito mútuo, até porque são os dois últimos campeões europeus de hóquei em patins: o Benfica em 2013 e o Barcelona com o bicampeonato em 2014 e 2015.

Nicolia não fazia parte do plantel do Benfica que foi pela primeira vez campeão europeu e que bateu o Barcelona nas «meias» em 2013, nem do que perdeu a meia-final com os «culés» em 2014. Chegou à Luz na temporada transata, ganhou campeonato e Taça de Portugal, mas na Liga Europeia o Benfica caiu nos «quartos» com o FC Porto.

Este ano a história é outra, com uma equipa diferente da de 2015: «O ano passado tínhamos grandes jogadores como o Carlos Lopéz [que vai disputar a final-four pela Oliveirense] ou o Avalos. Este ano chegaram Marc Torra e Jordi Adroher, que deram um toque diferente. Somos muito bons no ataque, temos outras prioridades como equipa e se estamos na final four é porque merecemos e queremos competir com o Barcelona da melhor maneira.»

Apesar de ser a principal figura do plantel «encarnado», Nicolia não tem o título que as «águias» vão disputar novamente, ao contrário de vários dos seus companheiros que já a conquistaram. A possibilidade de vencer a Liga Europeia foi um dos motivos que o fez rumar a Lisboa.

«Vim para um grande clube para ganhar. Em Itália era muito difícil ganhar a Champions. Em 2015 ganhei o Mundial, aliás a Argentina ganhou o Mundial, e se eu me senti muito bem com a minha seleção foi graças ao trabalho que fiz todo o ano anterior com o Benfica, isso é uma realidade. Aqui trabalha-se de uma maneira incrível e espero continuar assim na Champions», destacou.

Nicolia veio para o Benfica depois de três títulos conquistados no campeonato italiano, pelo Valdagno. Antes tinha representado o Bassano (2005 a 2007), também em Itália, mas sem conseguir o título nacional nem o sucesso europeu.

O argentino, que começou a jogar em 2003 no Olimpia do seu país natal, teve também uma curta passagem por Espanha em 2004, no Tordera, mas rapidamente regressou a «casa» (logo no mesmo ano devido a questões regulamentares) para alinhar pelo Vecinal de Trinidad, onde conquistou a Taça dos Campeões Sul-Americanos.

Resumindo, Nicolia venceu em todo lado, tudo o que era possível, mas falta-lhe a Liga Europeia e este fim de semana tem essa oportunidade. Como já referiu, escolheu o Benfica para tentar conquistar este troféu, porque «é um dos melhores clubes do mundo» e porque o campeonato português está cada vez melhor.

«O hóquei português está a crescer muito, no último ano muitos jogadores espanhóis vieram para a Liga Portuguesa. Está cada vez mais competitiva e penso que é bom para o hóquei português e sobretudo para quem joga aqui, para aproveitar, porque assim nunca se sabe quem pode ganhar a Liga e oxalá que ganhe sempre o Benfica, que é para isso que trabalhámos diariamente», disse o jogador.

Os «encarnados» estão perto de se sagrarem bicampeões portugueses, falta apenas um ponto, já que têm uma vantagem de 11 pontos para o FC Porto (que tem menos um jogo), quando faltam disputar três jornadas. Nesta edição e pela diferença pontual parece ter existido um grande desequilíbrio, sobretudo em relação ao campeonato anterior disputado até final.  

«O grau de dificuldade do campeonato foi igual, o Benfica somou os três pontos em cada jogo, como sempre fez o ano passado. A diferença esteve nas outras equipas que perderam muitos pontos e nós aproveitamos as debilidades das outras equipas para chegar a este momento e faltar apenas um ponto para conseguir o objetivo principal do Benfica que é o campeonato nacional», rejeitando qualquer cenário de facilidade no que será conquistado.

Este é o segundo ano na Luz e o argentino tem contrato para a próxima temporada. Não há outro pensamento senão o de continuar de «águia ao peito», num lugar onde é muito «valorizado».

«Oxalá fique muitos anos, estou muito bem aqui, tratam-me muito bem e muito bem também como pessoa. É um clube que dá muita importância tanto ao desportista como à pessoa e a minha família está bem aqui em Lisboa, oxalá fique muitos anos, senão ficarão boas recordações dos anos que ficar aqui.»

Nicolia não gosta dos holofotes da fama, «prefere o recato da família», mas por onde passa deixa fãs e admiradores. No Valdagno, esteve sete anos e na hora da despedida foi homenageado: camisola 5 (número que utiliza) retirada e a Chave da Cidade entregue ao jogador.

Na Luz pode ser o sucessor de «Panchito» Velasquez, que vestiu a camisola dos «encarnados» entre 2000 e 2003, e ainda hoje é um dos ícones do hóquei do Benfica. Por curiosidade, Nicolia nasceu na mesma cidade que o antigo jogador, San Juan.

«O «Panchito» foi um jogador que fez a diferença no Benfica e a nível dos adeptos ficou com muito boas recordações. Oxalá um dia fique, mas tenho outro carácter, a minha vida é em família, a fazer o desporto que gosto, e que nasci praticamente a jogar, e poder ganhar títulos.»

E em seguida contou uma história, que não sabia ao certo o ano, mas que aconteceu já depois de ele ser internacional e de «Panchito» ter deixado o Benfica: «Lembro-me que vim com a minha equipa treinar a Lisboa e perguntaram-me o que é que eu jogava. Eu mal disse «hóquei», a resposta imediata das pessoas foi «Panchito» Velazquez.»

A «maldade» de Nicolia no Argentina-Portugal das «meias» do Mundial

Portugal e Argentina têm se encontrado constantemente nas meias-finais dos Campeonatos do Mundo de Hóquei em Patins com Nicolia sempre em ação.

Nas últimas cinco edições do Mundial, que se realiza de dois em dois anos, as duas seleções encontraram-se quatro vezes nas «meias» com o resultado sempre favorável à Argentina, mas com os argentinos a só levantarem por uma vez o «caneco», em 2015.

Nicolia e companhia destronaram a Espanha, que procurava o sexto título consecutivo (antes desta série Portugal foi campeão do Mundo em 2003), mas o jogador do Benfica não esquece a partida com a seleção nacional: «Argentina e Portugal, creio que nos últimos cinco mundiais, jogaram quatro semi-finais e tivemos sempre a sorte de passar nós», brincou o hoquista.

Neste último duelo, Nicolia fez um grande jogo e, para além de duas assistências, marcou dois golos na conversão de livres diretos, um deles uma «obra-prima». (ver vídeo a partir do minuto 1).

 «Acho que o golo foi algo que se treina todos os dias, quando já estamos na fase de divertir-nos. Com o jogo já decidido foi a melhor maneira de o terminar. Depois tudo culminou com a conquista do troféu, mas não esqueço esse golo.»

A Argentina venceu o jogo por 5-2, com dois golos de Nicolia, um de Carlos Lopéz, na altura jogador do Benfica e agora na Oliveirense, e dois de Reinaldo Garcia, ex-FC Porto.

Esse «brilharete» de livre direto foi o último golo, mas confrontado se esse foi o melhor da sua carreira, Nicolia surpreende:  

«Não foi o melhor, penso que o anterior foi o melhor, um que fez o Reinaldo Garcia. Foi melhor porque eu sempre fui menos para golos e mais para assistir. As minhas características são outras, nunca fui um finalizador. Ali tocou-me finalizar e foi um lindo golo, mas não lhe dou importância.» (ver quarto golo a partir do segundo 48)

A impressionante humildade de um dos melhores do mundo, que só tem em mente fazer tudo para erguer o troféu da Liga Europeia.

«Me desculpa o atraso, vale?», foi assim que se despediu, recordando a demora inicial por causa do treino.

«Vale», Nicolia!