No mesmo cemitério onde repousam Beethoven, Brahms, Schubert e Strauss, um mausoléu negro acolhe os restos mortais do mais genial dos futebolistas austríacos: Matthias Sindelar. Morreu em janeiro de 1939, no limiar da II Grande Guerra Mundial, debaixo de circunstâncias misteriosas.

No regresso do FC Porto a Viena, o Maisfutebol entrevistou o autor da aclamada biografia sobre o Homem de Papel, «Inside his skin» [Dentro da pele dele]. Wolfgang Weisgram acompanha-nos numa visita ao maior ícone do Áustria Viena. E não só.

«O Sindelar foi mais do que um futebolista. Foi um símbolo da resistência austríaca à invasão Nazi de 1938», resume o escritor e jornalista, enquanto nos fala sobre o «prazer» de trazer à luz contemporânea uma história esquecida por «quase todos na Áustria».

«No Mundial de 1934 o Matthias Sindelar consagrou-se aos olhos de todos. Ele, o Giuseppe Meazza (Itália) e o György Sarosi (Hungria) eram os melhores futebolistas do planeta. Infelizmente, a tragédia levou-o demasiado cedo. Tinha 36 anos».

Suicídio, homicídio ou acidente?

Não faltam teorias sobre a morte de Sindelar. Uns falam em suicídio, outros em homicídio perpetrado pela ominosa Gestapo. Wolfgang Weisgram aponta apenas uma certeza: «a autópsia prova que o Matthias e a esposa Camilla Castagnola, judia italiana, faleceram em casa por inalação de monóxido de carbono».

As suspeitas têm razão de ser. Uma lesão grave no Mundial-34 atirou Sindelar para uma cama de hospital. Lá conheceria a enfermeira italiana com quem haveria de casar. A génese judaica de Castagnola tornou Sindelar persona non grata aos olhos do Terceiro Reich.

«O Ministro da Propaganda, Joseph Goebbels, fez-lhe ameaças públicas quando recusou representar a seleção da Alemanha, após a anexação da Áustria. O Sindelar tinha convicções sólidas. Nunca cumprimentou um dirigente Nazi. Nem o próprio Hitler».

Um golo no adeus sem saudação a Hitler

Após um jogo entre a Áustria ocupada e a Alemanha Nazi, Sindelar e Karl Sesta (outro jogador) viraram a cara aos seus novos governantes. Foram detidos e interrogados num cárcere em Viena. A fama e a adoração do povo austríaco salvaram-lhes a pele. Ficaram, ainda assim, marcados.

«Na Noite dos Cristais (9 de novembro de 1938, a noite de todas as agressões a judeus) foram bater à porta do Matthias. Ele foi levado para a rua, em pijama, mas acabou por ser salvo por vários populares», conta Wolfgang Weisgram.

A clemência não duraria muito, infelizmente. «Nesse período ele voltara a jogar pelo Áustria Viena. Foi a Berlim defrontar o Hertha, na final nacional, e empataram 2-2. O Matthias fez um golo e celebrou sem fazer a saudação nazi. Nunca mais foi visto em público».

Matthias Sindelar foi encontrado morto a 23 de janeiro de 1939. Oito meses antes do nojento eclodir da II Grande Guerra.

É, até hoje, um símbolo do Áustria Viena, oponente do FC Porto na Champions.

Documentário sobre Matthias Sindelar: