Ronaldo recusou que Portugal fosse o namorado abandonado de uma grande história de amor.
Mas por partes.
Antes de mais, convém sublinhar, se possível a negrito, que o Portugal-Espanha não defraudou nem um bocadinho as expetativas. Foi um grande jogo de bola. Intenso, bem jogado, emocionante.
Durante muito tempo pareceu que Portugal lhe cabia o papel de namorado traído: alimentava a história de amor, dava tudo por ela, mas estava sempre mais perto de ser o mais descartável do casal.
A Espanha convidou-o para dançar e Portugal encolhia-se. A donzela passeava pela sala, toda airosa, elegante e graciosa, enquanto Portugal temia que ela lhe fugisse, com mais futuro para viver.
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No entanto foi tudo ilusão de ótica.
Porquê?
Porque a seleção teve Ronaldo, e enquanto tiver Ronaldo todos os sonhos são possíveis. Mesmo que não pareça, todos os sonhos são possíveis. Portugal pode assim ambicionar ser tudo o que quiser.
Cristiano inventou o primeiro, inventou o segundo e inventou o terceiro. Três golos com marca do melhor do mundo. Fosse numa jogada individual, num remate de fora da área ou num livre perfeito.
É certo que pelo meio deu muito Espanha. Deu, aliás, Espanha até dizer basta.
A Seleção Nacional entrou melhor jogo, instalada no meio campo adversário, a mandar no futebol, mas foi coisa de quatro minutos. Até que Ronaldo abriu o marcador.
A partir daí Portugal encolheu-se, retraiu-se, fechou-se enfim numa gaiola. Da qual só saiu perto do fim. Mas já lá vamos. Antes disso importa dizer que esta Espanha joga muito à bola. Com um meio-campo formado por David Silva, Iniesta e Isco, a Roja quase nem precisa de treinador para jogar.
Não se notou nem um bocadinho a troca de Lopetegui por Hierro de há três dias.
A Espanha jogou como joga sempre, com a bola nos pés e o futebol na cabeça: recebeu, tocou, fugiu, entrou, voltou a tocar, fugiu outra vez. Um futebol que foi um regalo para a vista, interpretado por verdadeiros talentos, daqueles para quem este jogo não tem segredos nem o céu tem limites.
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Por isso esteve duas vezes em desvantagem e por duas vezes a conseguiu anular.
Nessa altura parecia que faltavam a Portugal mais dois ou três Ronaldos. Faltava mais quem olhasse para o adversário com altivez, com orgulho, com soberba, com um bocadinho até daquela arrogância: os jogadores espanhóis estavam sempre muito confortáveis a jogar perante um Portugal temerário.
Parecia que faltavam a Portugal mais dois ou três Ronaldos, mas foi só isso: ilusão de ótica.
No fim um foi suficiente para arrancar do fundo da alma um empate com sabor a vitória, perante uma forte candidata ao título: um empate enfim que nos deixa sonhar.
Nesta altura apetece aliás citar Victor Hugo Morales, quando o jornalista argentino deixou para a história um pedaço de poesia em forma de tributo a Maradona depois do golo do século.
Obrigado, meu Deus: por estas lágrimas, por Ronaldo, por Portugal.