Os processos de candidaturas aos Campeonatos do Mundo de futebol que têm deixado a FIFA
a braços com muita controvérsia tinham caído um pouco em banho maria, mas, nesta semana, o Mundial do Qatar volta à ribalta da polémica com a detenção de jornalistas.

Repórteres das estações alemãs «ARD» e «WDR» que estavam no Qatar a documentar as condições de trabalho envolvidas na construção do Mundial 2022 revelaram agora que foram presos, que tiveram material confiscado, que ficaram detidos várias horas e retidos vários dias no país.
 


As revelações dos jornalistas das emissoras alemãs foram feitas após a exibição do documentário «A venda do futebol: Sepp Blatter e o poder da FIFA» pela estação «ARD». Os estilhaços da bomba que rebentou em pleno Qatar apanham a FIFA pelo caminho quando o organismo que regula o futebol mundial tinha conseguido que o processo de eleição do seu presidente ganhasse espaço em relação à polémica que (ainda) envolve as escolhas dos países organizadores dos Mundiais 2018 e 2022: Rússia e Qatar, respetivamente.

As eleições são no final do mês. A polémica foi colocada no tal banho maria. Por enquanto, saíram da berlinda o «relatório Garcia», o «resumo Eckert», a demissão daquele e as ameaças à FIFA.

À espera da «forma apropriada»

As acusações de atos de corrupção na atribuição dos Mundiais 2018 e 2022 levaram à investigação de Michael Garcia, antigo procurador do EUA. O presidente da câmara de investigação do Comité de Ética da FIFA fez um relatório de 430 páginas sobre os processos de atribuição dos Mundiais. O relatório de Garcia foi passado a um resumo de 42 páginas da responsabilidade do juiz alemão Hans-Joachim Eckert. O texto do presidente da câmara decisória da Comissão de Ética da FIFA ilibou de ilícitos os processos de escolha das candidaturas.

«O resumo contém várias incorreções e interpretações erróneas dos factos, bem como as respetivas conclusões», foram as palavras de Garcia quando todos esperavam saber como decorreram os processos de atribuição das organizações à Rússia e ao Qatar.

Não ficou só pela rama. Não correspondeu ao que Garcia assumiu ter investigado. «O resumo de Eckert fez-me perder confiança na independência dos decisores da FIFA. No entanto, é a falta de liderança da FIFA nestes temas que me levou a concluir que o meu papel neste processo tinha chegado ao fim. (...) «Agora ficou claro, pelo menos num futuro próximo, que a decisão de Eckert ficará como a palavra final no processo de atribuição de sedes para os Mundiais 2018/2022», afirmou Michael Garcia ao anunciar a demissão depois de ter visto recusado o apelo contra o resumo do seu relatório.

Numa sucessão muito rápida dos acontecimentos com a polémica num dos seus auges, Sepp Blatter reagiu com a promessa da divulgação do relatório «de forma apropriada». Esta forma apropriada pretende garantir a devida proteção a fontes da FIFA que participaram no processo como permitir o termo das investigações ainda em curso sobre indivíduos alvo das averiguações de Garcia – como Angel Maria Villar ou Franz Beckenbauer.

Os relatos das detenções

Por entre esta delonga já passaram importantes decisões sem, no entanto, as investigações de Garcia terem sido publicitadas: como foram as candidaturas à presidência da FIFA ou a definição das datas do Mundial 2022 (a ser disputado entre 21 de novembro e 18 de dezembro). Ficaram por ultrapassar as eleições elas mesmas: são no diz 29 deste mês – ficaram por ultrapassar no que respeita a mais bombas que não a divulgação do relatório...

A exibição nesta segunda-feira do documentário «A venda do futebol: Sepp Blatter e o poder da FIFA» pela estação «ARD» foi precedida por uma revelação de um dos seus jornalistas: Florian Bauer.
 


 



Bauer revelou o que lhe aconteceu, assim como a uma equipa de reportagem da «WDR». Um comunicado desta estação alemã já nesta quinta-feira descreve que os seus elementos foram «presos quando filmavam em Doha» e depois «interrogados pela Polícia do Estado e pelo procurador» sendo apenas «libertados 14 horas depois». E que os repórteres tiveram de permanecer no Qatar «cinco dias antes que o ministro dos Negócios Estrangeiros autorizasse a sua partida».

A «WDR» conta também que as câmaras de filmar, os computadores e os telefones dos seus elementos «foram confiscados e devolvidos apenas um mês depois», mas que «toda a informação foi apagada».

Este incidente não impediu a exibição do documentário, onde um membro do Comité Executivo da FIFA admite a existência de negócios com empresas do Qatar quando o processo de escolha das candidaturas estava em curso; além de apresentar documentos assinalando a apropriação indevida de dinheiro por parte de um dirigente do continente africano com direito de voto nas próximas eleições.

Florian Bauer foi um dos centros de atenção nesta terça-feira não só pelo que aconteceu aos jornalistas no Qatar, mas também pelo que viu em relação às condições em que estão muitos trabalhadores que irão pôr de pé
o Mundial 2022.
 


O jornalista alemão acabou por explicar também por que não foram antes reveladas as detenções.
 


Autoridades do Qatar responsáveis pelo Mundial 2022 vieram, entretanto, «clarificar» o que consideram informações «incorretas». O comité responsável pelo Campeonato do Mundo no Qatar classificou como «explicitamente falso» qualquer relação entre as detenções e o Mundial 2022. As autoridades dão como exemplo que filmar «exige uma licença» e que fazê-lo «em certos lugares sem autorização tem o risco de repercussões legais».