Gianni Infantino foi eleito presidente da FIFA no final de fevereiro, com um programa de candidatura que defendia um Campeonato do Mundo a 40 seleções. Mais oito do que o atual formato e mais 16 do que há 20 anos, no Mundial 94. Ainda em setembro o suíço defendia a sua teoria do Mundial a 40. Um mês depois apresentava uma outra ideia: e se fossem 48 equipas? Ambas as hipóteses serão mesmo levadas à discussão no Conselho da FIFA marcado para a próxima semana, garantiu nesta quinta-feira o suíço. Estamos a falar de um eventual terceiro alargamento daquela que é a grande fonte de rendimento da FIFA, com lucros que não param de crescer. O argumento de Infantino em defesa de um Mundial com mais gente é alargar a «festa», como ele próprio lhe chama, a mais países.

Então, a última proposta de Infantino é esta. «Um Mundial a 48 equipas, que na verdade seriam apenas 32», disse Infantino, que antes tinha posto a coisa assim: «Continuamos com um Mundial a 32 equipas, mas há 48 que vão à festa.»

Confuso? Pois. A ideia seria apurarem-se automaticamente para o Mundial «as 16 melhores equipas da qualificação», sendo que o presidente da FIFA ainda não explicou que critério definiria as melhores. Depois, as 32 seguintes também viajariam para o local da fase final, para jogarem entre si um play-off que definiria as 16 que ficam. Ou seja, estaríamos a falar de 16 equipas que fazem todo o processo de preparação para uma fase final e a viagem até ao país anfitrião, mas arriscando-se a voltar para casa ao fim de um jogo. E estaríamos a falar de um Mundial alargado a quase um quarto do total de seleções filiadas na FIFA.

A primeira vez que Infantino falou no assunto foi na semana passada, na Colômbia, quando participou num jogo de velhas glórias. Agora, disse em entrevista à France Press que o tema vai mesmo a discussão no Conselho da FIFA de 13 e 14 de outubro próximos e que uma decisão final, que se aplicará a partir do Mundial 2026, será tomada no próximo ano. A hipótese do Mundial a 40 seleções, «com grupos de quatro ou cinco equipas», também será debatida, acrescentou. 

O Conselho da FIFA é o organismo que sucedeu ao Comité Executivo, caído em desgraça depois do escândalo que envolveu as cúpulas do organismo no ano passado, com casos em várias frentes: investigação da justiça norte-americana a altos dirigentes suspeitos de corrupção, suspeitas sobre o anterior presidente Joseph Blatter e Michel Platini, ex-dirigente máximo da UEFA, investigações sobre os processos de atribuição do Mundial 2018 à Rússia e de 2022 ao Qatar. O Conselho apresenta-se no site oficial do organismo como um órgão «não executivo, de supervisão e estratégia, que define a visão para a FIFA e para o futebol global».

A ideia, ou proposta, ou o que quer que seja neste momento, levanta uma série de questões sobre a lógica desportiva de um campeonato dessa dimensão. O selecionador alemão, Joachim Low, foi contundente na crítica a qualquer decisão desse tipo.«Os Mundiais e Europeus deviam ter as melhores equipas. Se continuam a aumentar o número de equipas, diluem a qualidade. Na minha opinião, do ponto de vista desportivo o torneio está perfeito com 32 equipas», disse o técnico campeão do mundo, que já se tinha mostrado crítico do alargamento do Europeu, que passou de 16 seleções para 24, na edição de 2016.

Infantino defende o contrário, recorrendo precisamente ao exemplo do Euro 2016. «As pessoas falam muito sobre um declínio no padrão da competição, mas na minha opinião a qualidade do Europeu não foi pior, pelo contrário. Houve seleções que não imaginávamos que poderiam ser tão fortes e com nível tão alto», diz.

O selecionador nacional, Fernando Santos, foi questionado esta quinta-feira sobre o assunto e disse que espera para ver. «Não conheço os detalhes, não me debrucei sobre isso. Vou debruçar-me sobre o assunto, irei perceber qual a ideia do presidente da FIFA e na altura certa, que não é esta, irei pronunciar-me sobre essa matéria», disse.

Quantos alargamentos e para quem

Quanto a reações institucionais, para já há apenas um comentário do novo presidente da UEFA, Aleksander Ceferin, que diz nunca ter ouvido falar no assunto. «Ouvi falar disto pela comunicação social, por isso devem compreender que é difícil comentar. Mas devem falar-nos disso no próximo conselho da FIFA. Vamos ver. A UEFA vai tomar uma posição oficial quando tiver informações sobre o assunto», disse o esloveno ao jornal LÉquipe.

Para já, Infantino pôs a questão na agenda. Com muito ainda no ar, começando pela forma como seriam definidas as 16 equipas adicionais a acrescentar ao atual formato. Essa é seguramente uma questão central, a questão política do equilíbrio entre confederações.

O Mundial já teve três formatos diferentes no que diz respeito ao número de equipas, se descontarmos a primeira edição, em 1930, que foi por convite. Começou com 16 seleções e foi assim durante 44 anos, até ao primeiro alargamento para 24, em 1982, que viu a Europa ganhar peso na distribuição de lugares: de 8 a 10 nos anos anteriores, dependendo do campeão e do anfitrião, para uma base de 12 a 14.

Mas com o crescimento da dimensão global e da rentabilidade potencial da competição através da televisão e da publicidade, o processo acelerou depressa. Apenas 16 anos depois surgiu o  segundo alargamento, para as 32 equipas que já estiveram em França, em 1998. E aí ganharam espaço outras confederações: o contingente europeu manteve-se, mas houve quem ganhasse. África, que passou de duas (3 em 1994) para cinco seleções, mas também a Concacaf, de um a dois representantes para os atuais 3,5, a Ásia, de 2 para 4,5, ou ainda, marginalmente, a América do Sul, de um máximo de quatro para os atuais 4,5.

Mais dinheiro, cada vez mais

Como pano de fundo a toda a questão está, claro, o dinheiro em causa. Um olhar às contas apresentadas pela FIFA nos últimos anos não deixa dúvidas. O Campeonato do Mundo, a grande competição do planeta em termos de dimensão financeira, é a galinha dos ovos de ouro da FIFA, responsável pela esmagadora maioria dos seus rendimentos. E a receita vem aumentando a cada quatro anos. O raciocínio, portanto, parece simples. Quanto mais jogos e mais países envolvidos, mais dinheiro.  

No ciclo de 2011 a 2014, o Mundial do Brasil representou 84,4 por cento das receitas da FIFA. Foram no total 5,718 mil milhões de dólares (cerca de cinco mil milhões de euros), sendo que o Mundial rendeu 4,826 mil milhões de dólares.

Fonte: relatórios e contas da FIFA

Um enorme aumento em relação ao ciclo que culminou em 2010, quando o Campeonato do Mundo na África do Sul rendeu 3,655 mil milhões de dólares, para receitas totais de 4,189 mil milhões nesse período.

Ou ainda em relação a 2006. No ciclo de quatro anos que terminou no Mundial da Alemanha, a FIFA teve 2,955 mil milhões de euros de receitas, 2,608 dos quais são exclusivos do Campeonato do Mundo.

A grande fatia das receitas vai para os direitos televisivos, mas o licenciamento de direitos de marketing também tem enorme peso. A esses valores a FIFA acrescentou em 2014 os valores da bilheteira, que chamou a si neste ciclo.

A FIFA não divulgou para 2014 a distribuição de receitas televisivas pelos vários continentes, mas em 2010 deu essa informação e os dados dão uma ideia do equilíbrio de forças. Do total de 2,408 mil milhões de dólares que o Mundial rendeu em direitos TV, 1,289 vieram da Europa, sendo 211 milhões da América e 908 referentes ao resto do mundo.