Desde 28 de Junho de 2000 que eu devia odiar Zinedine Zidane. Não consigo. Aquele penalty a Portugal até pode ficar atravessado na garganta para sempre, mas não consigo odiar «Zizou». Aquele momento, por mais que doa, é apenas mais um símbolo de uma classe inesquecível. A três minutos do final do prolongamento, e com a presença numa final em causa, quantos jogadores se atreveriam a marcar uma grande penalidade ao ângulo? Muitos atirariam ao meio, na esperança que o guarda-redes caísse redondo para um dos lados. Zidane jamais cairia nessa simplicidade.

A primeira vez que olhei para ele devo ter pensado que era «trinco» ou interior. Talvez por me sentir sempre mais tentado a elogiar aqueles que fazem o chamado «trabalho invisível». Os médios que nunca jogam mal, que têm um papel preponderante, mas que ficam sempre na sombra de quem marca golos e faz assistências. Alto, calvo, com uma pinga de suor prestes a cair pelo nariz. Não tinha ar de artista da bola. Como se a «pinta» contasse para alguma coisa.

Zidane tinha controlo total sobre a bola e sobre o espaço em seu redor. Como poucos, ao longo da história. A bola encostava-se ao peito do francês e acabava adormecida no peito do pé, sem chorar. Quando descia à relva era para ficar perfeitamente posicionada por baixo do tronco, como se não quisesse sair mais dali.

Recepção de olhos fixados no chão, pois os génios são aqueles que já sabem o que vão fazer antes de ter a bola, e deixam tudo preparado ao primeiro toque. Aquela «pirueta» de ballet encantou-me vezes sem conta. Aquela imagem falsa de que «Zizou» está em desequilíbrio, quando a bola continua a obedecer apenas a ele.

Despediu-se à cabeçada, mas até isso lhe perdoo. Zidane nunca foi igual aos outros.