O meu pub em Hammersmith». A esta zona da cosmopolita Londres chega gente de todo o mundo. Enquanto se bebe uma pint, fala-se de desporto: futebol, basquetebol, ténis, Fórmula 1, o que for. Depende de quem passa pela porta. O consumo é obrigatório e as bebidas nunca são por conta da casa. Aqui também se pode falar da NFL, mas se alguma vez se proferir a palavra «soccer», Woody, o cozinheiro, tem cara de Vinnie Jones e andou na escola do Cantona. Ah, e é primo do Roy Keane.

Alguém pagou ou vai pagar 15 milhões por André Gomes.

Se as notícias forem corretas, o Benfica vai receber o mesmo que o Sporting recebeu por Cristiano Ronaldo. Mas será mesmo assim?

Vamos lá por partes: não se pode comparar os dois futebolistas. Nem Ronaldo o merece, nem é desejável para André Gomes. Mas pode comparar-se o investimento, ainda que no futebol atual os clubes sejam pouco claros sobre as reais operações financeiras que fazem.

Num negócio há sempre dois pontos de vista: o de quem compra e o de quem está do outro lado da mesa.

Vejamos quem compra.

Cristiano Ronaldo chegou à Premier League em 2003/04. Nessa época, em média, uma transferência na Premier League custou 1,97 milhões de libras (quase 2,4 milhões de euros). Não sou eu que o digo, é Paul Tomkins, autor do livro Pay as you Play, que fez um levantamento sério da matéria na era da Premier League.

Pagar 15 milhões por um futebolista era bom dinheiro para a altura.

A média é sempre afetada pelo número total. Neste caso, a quantidade de transferências. Se houve um número astronicamente maior em 2003/04 do que em 2012/13 desconheço. Mas não é expectável.

Assim, é seguro arriscar que os 15 milhões que alguém vai pagar por André Gomes são bem menos do que os 15 milhões que o United pagou por Ronaldo: a média de uma transferência na Premier League está nos 6,7 milhões de euros (lembre-se, dez anos antes era de 2,4 milhões), o que quer dizer que o passe do benfiquista está 2,2 vezes acima da média: o de CR7 estava 12,2.

No fundo, ainda que o montante seja igual, um investidor está a pagar bem menos por André Gomes do que por Cristiano Ronaldo. Fará sentido, portanto.

Vai para o Mónaco, interrogam.

Certo, até pode ir, mas a Premier League é o principal agitador do mercado.

Não é difícil chegar a esta conclusão, basta ter andado neste mundo nos últimos anos: começou com o Chelsea de Abramovich, passou pelo Manchester City e o United esteve sempre lá. Junte-se-lhe Arsenal, Tottenham e Liverpool (sobretudo na era Benítez). Algum outro campeonato tem tantas equipas com capacidade para gastar? Aliás, números atuais, a Premier League gastou mais do dobro em transferências do que Itália, o segundo campeonato da lista.

A média anual de transferências na Premier League tem, assim, uma enorme influência nos outros mercados. Aliás, acho que todos sabemos isto.

Ora, onde íamos? Nos 15 milhões de André Gomes com uma média atual de transferências de 6,7 milhões no principal escalão inglês. 

Nova questão: estamos em 2013/14. O mercado ainda não fechou pelo que ainda não se pode chegar a números concretos. Mas sabemos duas coisas: que o Manchester United pagou à volta de 45 milhões de euros por Mata (segunda transferência mais cara da época em Inglaterra atrás de Ozil, logo, a média tem tendência a subir) e que vem aí um novo acordo de TV para a Liga.

Sempre que houve novos direitos televisivos negociados (na Premier League, o montante é distribuído pelos clubes), o preço das transferências aumentou. De novo, Paul Tomkins: 22 por cento em 2010, 51,3 por cento em 2007 (pré-crise financeira, não esquecer), 10,2 por cento em 2004 (fator Chelsea a inflacionar), mais 35,8 por cento em 2001.

Em resumo, é previsível que as transferências para e na liga inglesa aumentem de valor, uma vez que haverá novo dinheiro para gastar. E, como é expectável, se o preço em Inglaterra sobe, subirá também no resto da Europa.

Não estou a dizer que 15 milhões não são nada, ainda para mais neste país. Mas para os principais compradores do futebol europeu, em breve, não serão assim tanto quanto isso.

Como disse, há sempre o outro lado da mesa.

E um empresário não faz de intermediário para não ganhar dinheiro. O Benfica pode receber 15 milhões de euros de Jorge Mendes, representante de André Gomes. Mas não receberia mais se o interesse de Manchester City, Liverpool ou Mónaco fosse real e negociasse diretamente com os clubes?

Essa é a parte que os encarnados devem explicar. Para se perceber também melhor o que é a aposta na formação, na era de Vieira e Jesus.

O meu pub em Hammersmith» é um espaço fictício e de opinião do jornalista Luís Pedro Ferreira. Pode segui-lo no Twitter