A absolvição de Pinto da Costa no Tribunal de Gaia, no «caso do envelope», não é uma vitória do presidente do F.C. Porto. No limite assemelha-se a uma bola tirada sobre a linha de baliza.
Pinto da Costa estava acusado de corrupção desportiva e foi ilibado. Agora haverá recursos, até que o tempo passe e o assunto definitivamente se encerre.
Digo que não se trata de uma vitória por duas razões.
1. Ninguém ganha depois de passar pelo que o presidente do F.C. Porto passou.
2. Apesar de ilibado em tribunal, o facto de o processo ter sido abundantemente publicitado permitiu a milhares de portugueses formar uma opinião própria. Sem sustentação e/ou validade jurídica. Mas válida, pelo menos para a consciência de cada um. E basta ouvir conversas e ler comentários para formar a convicção de que, para muitos portugueses, Pinto da Costa é culpado. Seja lá do que for.
A imagem de Pinto da Costa é sofrível há muitos anos e nisso ninguém é mais responsável do que o próprio, sempre disponível para guerrilhas inúteis e combates maus para o futebol e até prejudiciais para o clube que dirige há décadas.
Deste ponto de vista, ser ilibado em tribunal nada altera. Quem adora Pinto da Costa vai continuar a fazê-lo. Quem vê nele a origem de todos os males não alterará uma vírgula.
De todo este processo resulta uma discussão, que a Liga deveria ter a coragem de patrocinar: como explicar que os mesmos factos resultem em desfechos tão distintos?
A justiça civil ilibou Pinto da Costa. A 9 de Maio de 2008, a Comissão Disciplinar da Liga puniu-o com dois anos de suspensão e retirou seis pontos ao F.C. Porto. Suspendeu por seis temporadas o árbitro Augusto Duarte, que agora também foi ilibado em tribunal.
Não sei o que pensa o leitor, mas esta diferença inquieta-me.
Claro que existem actos (muitos, mesmo) que podem ser punidos na justiça desportiva e que não constituem crime. Mas aqui estamos a falar de corrupção desportiva.
Para que todos aprendêssemos com este caso, seria de esperar que a Liga, a começar pela Comissão Disciplinar da Liga, se pronunciasse sobre o assunto. Voltasse ao tema e emitisse opinião, depois do que foi decidido pelo Tribunal de Gaia.
Também era importante que não entrássemos na nova temporada sem de facto revermos algumas das regras fundamentais que regem o comportamento dos agentes desportivos. Por exemplo: se um árbitro for a casa de um presidente dois dias antes de um jogo, isso só por si deve dar origem a que punição?
Na época passada a CD propôs alterações profundas que foram chumbadas. Será que a Liga ainda tem energia para as trazer de volta?
O «apito» é importante de mais para o futebol português para terminar assim.
P.S. Há casos que me causam profunda estranheza. Esta semana a Federação Portuguesa de Futebol retirou três pontos ao Olivais e Moscavide por o clube não ter pago oito euros. Em Maio a Comissão Disciplinar da Liga puniu o F.C. Porto com a perda de seis pontos por tentativa de corrupção. O Estrela da Amadora passa uma época sem pagar ordenados e nada acontece. A desproporção entre tudo isto é tão grande que creio ser legítimo dizer que uma das mais urgentes tarefas do futebol português é construir um edifício regulamentar em que seja possível acreditar. E onde se vislumbre alguma coerência.
NOTA: as páginas do Maisfutebol estão abertas aos juristas que aceitem ajudar-nos a compreender o processo.