Foi há cerca de quatro anos que conheci uma das figuras mais improváveis que passou pelo futebol português. Depois da azáfama provocada pela passagem de Mourinho pelo F.C. Porto, que proporcionou grandes momentos aos adeptos e muitas horas de trabalho aos jornalistas, surgiu no Dragão um sósia de Peter Sellers, que se apresentava como a melhor solução para substituir o «special one».
O campeão europeu em título passava a ser orientado por um italiano, pretensamente mestre em tácticas, que vinha do surpreendente Chievo Verona e prometia cumprir a transição em continuidade, mantendo o espírito de vitória. Pois bem, não durou muito.
De «Gigi» Del Neri recordo as palavras amigáveis, as viagens constantes a Itália e a evidente falta de ritmo para acompanhar a voracidade de um clube com vontade de afirmação internacional. Tratava-se de uma figura simpática, sem dúvida, mas que não tinha o «pedal» necessário para agarrar a oportunidade. Saiu do clube quase ridicularizado, sem tempo para mostrar o seu talento, explicando que regressava ao seu país «por motivos pessoais».
Passado este tempo, voltei a recordar-me do treinador italiano, que entretanto voltou a não ter grandes aspirações e só assim se fez grande. Pelo menos durante um jogo, cumprindo a suprema ironia de humilhar quem tanto o assombrou na cidade Invicta.
Por incrível que pareça, Del Neri venceu o super-Mourinho com a sua pequenina Atalanta. Não houve Adrianos, Ibrahimovics ou Cambiassos que segurassem aquele jogo inesquecível de uma equipa que já não conta para o calendário e que só serve para atrapalhar as contas do título. «Gigi», esse, permanecia impávido, naquele ar de quem foi retirado à pressa de um universo de panteras cor de rosa e não conhece a diferença entre o sonho e a realidade.
É claro que Del Neri é mais do que isto. Trata-se de um treinador com créditos firmados no seu país, mas que nunca vai ser mais do que isso. Depois de falhado o F.C. Porto, mas também a Roma, será sempre um timoneiro de equipas medianas. Com as suas pequenas conquistas e desaires naturais. Sem grande ambição, responsabilidade ou pressão. Mas, nem que seja por nos fazer recordar Peter Sellers, vale sempre a pena revê-lo junto ao banco de suplentes, de olhar no infinito e lançando indicações vagas para o centro do relvado.
«Futebolfilia» é um espaço de opinião da autoria de Filipe Caetano, jornalista do PortugalDiário, que escreve aqui todas as semanas