«Eu já vi o André Silva em ação muitas vezes e quem quisesse ver o André Silva bastaria ter tido a maçada de fazer meia dúzia de quilómetros até Pedroso»

A frase não é recente nem é André Silva que me traz aqui hoje. Ainda assim, posso começar por recordar essas curiosas palavras de Pinto da Costa, presidente do FC Porto, sobre o jovem avançado que volta a estar na órbita da equipa B. Haveria muito para escrever sobre o assunto, com Lopetegui e Suk à mistura. Mas adiante.

O que me ficou na memória foi a referência a Pedroso. Em poucas palavras, o máximo dirigente portista deixou um recado ao adepto portista, pedindo mais gente nos jogos da formação secundária. Na altura, confesso, não estava a par dos números exatos.

Na quarta-feira, ao ver um Estádio Cidade de Barcelos longe da lotação máxima numa meia-final da Taça de Portugal, discuti o assunto com o meu colega Bruno José Ferreira e fomos parar à média de espectadores no segundo escalão.

Aplaudi desde sempre o modelo adotado pelo Gil Vicente: um recinto moderno, eficiente, com valências à medida da dimensão do clube Mas nunca me convenceu a sua localização. Os galos saíram do centro da cidade e foram perdendo o contacto diário com os adeptos.

Analisando as médias na II Liga, os gilistas estão ainda assim no 5º lugar, com média de 1.012 adeptos por jogo. Não é mau, num cenário globalmente pobre. Bem pior, confirmei entretanto, estão as equipas B. O Sporting, por exemplo, tem apenas 260 adeptos nas bancadas por cada jogo caseiro da sua formação secundária. É a pior média do segundo escalão.

Porquê? É certo que o número de jogos aumentou, com o incompreensível formato com 24 equipas (felizmente, vai acabar), a qualidade do espetáculo é geralmente insuficiente, a vida está cara e a disponibilidade é reduzida perante compromissos diurnos a meio da semana. Porém, um dos maiores problemas é a localização.

Sporting B (Alcochete), FC Porto B (Pedroso) e Benfica B (Seixal) não conseguem atrair adeptos porque jogam fora dos centros urbanos. Tão simples quanto isso. Nem a classificação altera essa realidade: os jovens dragões lideram a II Liga e têm uma média de 405 espectadores. Sofrível.

A equipa secundária do Sp. Braga, jogando no velho Estádio 1º de Maio, está nesta altura acima de dragões e leões (média de 431). O Benfica é o melhor dos três grandes, contando habitualmente com 653 adeptos no Seixal, mas fica bem longe do maior fenómeno: o V. Guimarães B.

Os vitorianos são reconhecidos pela sua dedicação ao clube e a realização de jogos no Estádio D. Afonso Henriques contribui para uma média assinalável: 1227 adeptos, perdendo apenas para Varzim (1334) e os impressionantes D. Chaves (1949) e Famalicão (2555).

Voltemos ao início. Jorge Nuno Pinto da Costa falou em «alguns quilómetros» para ver os jogos em Pedroso. Contas feitas, são cerca de 15 quilómetros de distância entre o Estádio do Dragão e o Estádio Jorge Sampaio, uma obra recente mas sem valências em seu redor. E o Olival fica a distância idêntica.

Do Estádio da Luz ao Centro de Estágios do Benfica no Seixal são perto de 25 quilómetros e o Sporting supera essa marca com os 37 quilómetros que separam a Academia de Alcochete e o Estádio de Alvalade. Era expectável que os adeptos tivessem constante disponibilidade para acompanhar jogos nos locais remotos?

O cenário não se esgota nas equipas B – os escalões jovens seguem o mesmo caminho – mas os números oficias da Liga permitem apresentar dados inquestionáveis. As médias foram caindo progressivamente desde o regresso das equipas secundárias e ameaçam seguir essa tendência. Urge mudar algo.

Na primeira época (2012/13), o Benfica B disputou alguns jogos no Estádio da Luz e a média era bem superior, como os números abaixo demonstram. No ano seguinte, depois de passar por Rio Maior, o Sporting B também experimentou o Estádio de Alvalade e teve o mesmo retorno positivo.

É difícil sujeitar o relvado principal a um desgaste constante, a Liga não permite a realização de jogos em recintos sem determinadas condições e vão escasseando locais à altura no interior das cidades. Percebo tudo isso. Mas caberá aos responsáveis dos clubes encontrar soluções.

Quando morava em Portimão, via da minha janela o Estádio do Portimonense e por lá fui alimentando a paixão pelo futebol. Em Rio Tinto, ia a pé para o velhinho Campo da Ferraria e passei a gostar do Sport local. Enquanto estudei em Faro, passava pelo S. Luís e cheguei a ver alguns jogos do saudoso Farense. Era antes de mais uma questão de proximidade. Até porque não tinha carro.

Quem andava pelos estádios ao longo da semana, durante o dia? Sobretudo gente que não tem forma de transporte para fazer 15, 25 ou 37 quilómetros para locais remotos. Os anciãos, os verdadeiros portadores da mística, e os jovens, os aprendizes. Não os pais, que estão geralmente a trabalhar, mas os avós e os seus netos. Velhos a fazer crescer o sentimento nos mais novos. Sem rios nem portagens pelo caminho.

Médias de espectadores nos jogos caseiros das equipas B

(dados oficiais da Liga Portuguesa de Futebol Profissional):

V. Guimarães B:

2012/13: média de 1775

2013/14: terceiro escalão

2014/15: média de 1629

2015/16: média de 1227

Benfica B:

2012/13: média de 1176

2013/14: média de 662

2014/15: média de 791

2015/16: média de 653

Sp. Braga B:

2012/13: média de 1056

2013/14: média de 517

2014/15: média de 429

2015/16: média de 431

FC Porto B:

2012/13: média de 972

2013/14: média de 590

2014/15: média de 458

2015/16: média de 405

Sporting B:

2012/13: média de 523

2013/14: média de 865

2014/15: média de 276

2015/16: média de 260

Marítimo B:

2012/13: média de 537

2012/13: média de 537

2013/14: média de 500

2014/15: média de 241

2015/16: terceiro escalão