Não tem mal nenhum ganhar dez medalhas, três delas de ouro, nos Jogos Europeus. Especialmente se resistirmos à tentação de ver nessas conquistas algo mais do que lá está.

Porque as medalhas da Telma, do Rui, do Marcos, do Tiago, do João e dos outros podem ser muita coisa, mas não são, seguramente, fruto da nossa forte e multifacetada cultura desportiva comum. Nem, muito menos, o corolário de uma política integrada, da base ao topo, para generalizar a prática de desporto a partir das escolas. E menos ainda são promessa de um verão de 2016 rico em pódios e metais preciosos no Rio de Janeiro – onde a exigência será incomparavelmente mais alta do que nestes Jogos.

Nessa altura, quando grande parte dos adeptos aproveitar os furores olímpicos para arejar a bandeira e reclamar enquanto as medalhas não chegam, os nossos feitos de Baku - tão relativos como um 18º lugar entre 50 países - irão transformar-se nos fiascos deles. Se calhar os mesmos eles – a Telma, o Rui, o Marcos, etc. - que agora tão bem representaram a cultura desportiva que não temos nem queremos ter.

Entre muitas virtudes, uma das mais depreciadas na prática do desporto é a da valorização do trabalho. Das rotinas, da persistência, do falhar melhor a cada treino, do enfrentar e superar defeitos e limitações. Qualquer medalha – e nas medalhas portuguesas isto é ainda um pouco mais verdade - é um tributo ao trabalho obsessivo em pequena escala. De quem a conquista e dos seus cúmplices mais diretos: técnicos, dirigentes, família e colegas, acima de todos. Postos no fim da cadeia de produção, como espectadores ocasionais, habituámo-nos a ver pela TV o resultado final, desligando-o do processo que a ele conduz. Sucesso ou insucesso, vitória ou derrota, lucro ou prejuízo: De comando na mão, com uma pressa acentuada pelo défice de atenção e o second screen, exigimos o rótulo definitivo e imediato, para reduzir anos de trabalho ao tempo de um ippon ou de um penálti falhado.



Também não tem mal nenhum ganhar 5-0 à Alemanha nas meias-finais de um Europeu sub-21. Especialmente se, entre Baku e Olomouc, medalhas e goleadas nos ajudarem a perceber melhor que os resultados são efémeros mas os processos bem desenhados garantem continuidade. Dito de forma mais simples: os talentos nascem e descobrem-se, mas os campeões dão muito trabalho a fazer. E, mesmo não dando por isso, é de respeito pelo trabalho que falamos quando discutimos algumas das coisas importantes que acontecem atualmente no mundo. Podia estar a falar só de desporto, mas não estou. E não tem mal nenhum.