Esta é daquelas crónicas para começar com um tom de voz próprio. Aquele que todos temos quando nos lembramos de algo que já não vemos há muito tempo. É com ele que devem exclamar: «Ei, o FC Porto!!! É verdade…Xiiii, que será feito dele?».

O FC Porto foi uma verdadeira máquina de futebol. E esta é mesmo a palavra certa porque se adequa a todas as valências. Dentro do campo, fora do campo, nos negócios, nos detalhes, enfim, em tudo o que faz falta a um grupo vencedor.

Ganhou muito. Campeonatos seguidos, como mais ninguém. Troféus internacionais, como nenhum outro. Criou ícones nos relvados, vendeu-os a preço de ouro, voltou ao início, fez tudo de novo. Lançou treinadores, trocou-os, manteve-se no topo, mais coisa menos coisa. Vi-o pela última vez a erguer em ombros um miúdo que, do nada, ajoelhou o rival de sempre.

Lembrei-me deste FC Porto ao ver, por estes dias, uma equipa que usa o mesmo nome e (por vezes) veste de forma parecida a fazer a vida negra ao Tondela e ao Paços de Ferreira, mas perdendo, invariavelmente.

Estudei um pouco sobre este FC Porto, para perceber o que o liga ao que conheci. Pouco, percebi rapidamente.

Em primeiro lugar, este FC Porto não ganha, nem muito, nem pouco. Fatura, como o anterior, mas esses são os números que alegram dirigentes (e empresários) e adeptos que gostam mais do clube do que de futebol. Esses gostam de muitos zeros, os outros contentam-se com apenas um, desde que do lado contrário do placard.

Curiosamente, o FC Porto que eu conheci (como todas as equipas geridas como um modelo de negócio) também pagava ordenados chorudos e comissões relevantes, mas poucos o sublinhavam. Neste, o problema é real, encarado e exposto.

No outro FC Porto o líder atava e desatava, riscava a torto e a direito, mas sempre com o farol acertado e a bússola a apontar para norte. Neste, o líder aparece menos vezes e, quando o faz, deixa muitas interrogações, até porque a mão não parece tão firme.

Há negócios de família neste FC Porto, o que nunca (e este nunca é para todas as áreas) é processo tranquilo. No FC Porto de antigamente os familiares assistiam de fora. Talvez desse para fazer do filho de um dirigente campeão nacional, mas, pronto, nem ficava muito caro.

O outro FC Porto tinha um rumo definido. Este demorou cinco jogos a trocar de treinador e não se consegue, ainda, perceber se a aposta é mesmo para valer, porque ninguém o garante.

Este FC Porto tem estrelas, mas não tem equipa. Diz muitas vezes que é FC Porto. Bem mais vezes que o antigo FC Porto. Mas não o mostra. Olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço.

Enfim, este FC Porto é diferente. Curiosamente, para mim, não é assim tão diferente. Já vi este FC Porto outras vezes, mas vestia de outra forma. Umas vezes de vermelho, outras de verde. Nunca tinha visto era este FC Porto vestido de FC Porto.

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