Estão a ver aqueles momentos em que têm a certeza de ter visto algo mas não encontram provas? Buscam, buscam, buscam. Vasculham todos os cantos, não deixam pedra sobre pedra e, mesmo assim, nada. Desistem. E passado algum tempo, a confirmação que procuravam cai do céu à vossa frente.

Aconteceu-me com Ivica Kralj. Ainda bem que foi comigo. Se fosse com ele, uma vez que caiu do céu, provavelmente não iria apanhar.

Ora, eu, como qualquer pessoa que tenha acompanhado o futebol português no final dos anos 90, lembrava-me de Kralj como mais um dos que tentaram, sem sucesso (mas com alguma graça para todos os não portistas), combater aquilo a que se achou por bem chamar «o fantasma de Baía».

Kralj chegou com boas referências mas muitas indecisões. A começar pelo nome, nada vulgar por estas bandas. «Cráli» para a maioria. Mas também «Crálhe», «Crálhi» ou «Cráleje» para gostos mais requintados. Nada de mais, já que por essa altura, Drulovic também era «drulovique» e «drulóvitche», conforme o leitor seja todo o mundo ou José Nicolau de Melo.

Dizia eu, portanto, que Kralj me tinha caído do céu à frente. Numa das minhas incursões youtoubianas por vídeos de outrora tropecei então no momento mais embaraçoso (e não foram poucos) do sérvio que foi à baliza do FC Porto por uns tempos (reparem como me recuso a usar a expressão guarda-redes).

Este (2m09s):



Antes de voltarmos, um aparte: atentem que, num jogo com seis golos, dois deles foram vítimas da síndroma, muito próprio dos anos 80/90, «um lance do qual infelizmente não dispomos de imagens». É um terço do jogo. Poderia ser pior, claro. Imaginem o relato: «Em Viena, o FC Porto chegou, depois, ao empate por Madjer, num lance do qual infelizmente não dispomos de imagens». Chato, não é?

Ora este lance de Kralj (e podia escolher outros igualmente incríveis mas menos engraçados) fez-me pensar que, se este sérvio chegou aos 12 jogos de dragão ao peito, os níveis de paciência por aqueles lados recrudesceram de forma gritante em 16 anos.

O «mesmo» público que perde a lucidez por ver Quintero sair, que assobia a cada passe errado, que enerva ainda mais uma equipa em brasas, aguentou uma dúzia de jogos com Kralj na baliza. Uma dúzia. Não estou a dizer que foi pacífico, mas foi…uma dúzia!

Kralj não deixou saudades, claro. Mas deixou o aviso para memória futura: quando pensarem que trocar cinco jogadores por jogo é um problema grave, lembrem-se que Kralj foi titular doze vezes. Já houve coisas piores, não é?

PS- A discussão sobre a rotatividade do FC Porto de Lopetegui estava a ficar demasiado séria, tática, técnica, sisuda e cinzenta. Estava a faltar alguém para a estupidificar e lembrar que a vida é bela e o futebol uma bênção. De nada. 

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