Difícil encontrar, nos últimos anos, um clássico tão desequilibrado como foi o FC Porto-Sporting de domingo passado.
 
Foi mesmo um jogo de sentido único, como esta análise mostra com números, numa superioridade absoluta do FC Porto sobre o Sporting.
 
O triunfo dos dragões sobre os leões não causou surpresa: era, de resto, o desfecho mais provável, tendo em conta o momento das duas equipas; a maior qualidade das opções à disposição de Lopetegui, quando comparadas com as de Marco Silva; e também se atendermos ao facto do Sporting vir de um esforço extraordinário (e inglório) perante o Wolfsburgo, na segunda mão em Alvalade, para a eliminatória que ditou a queda nas competição europeias.
 
Os dados jogavam a favor do FC Porto, a vitória dos azuis e brancos era esperada.
 
Mas foi de todo surpreendente a facilidade com o que os azuis e brancos não só ganharam o jogo, como dominaram por completo o seu adversário.
 
Analisando a partida com mais detalhe, o que causa estranheza é que a diferença de andamento e de qualidade não fez parecer «um clássico».
 
Parecia, antes, uma partida do FC Porto em casa, para o campeonato, mas perante uma equipa de meio de tabela ou até de menor porte. Terá sido, olhando para trás, uma das vitórias mais fáceis do FC Porto, no Dragão, nesta Liga.
 
Desequilíbrios
 
Razões para tão grande diferença? Uma das melhores exibições do FC Porto esta época e um dos piores desempenhos dos leões na temporada.
 
Uma coisa agravada pela outra? É possível.
 
Se, muitas vezes, em futebol, uma equipa joga «o que a outra deixa», este foi daqueles casos em que o FC Porto pode jogar muito porque o Sporting não teve organização e, a partir de certo ponto, também não teve capacidade anímica nem frescura física para o impedir.
 
Quase tudo saiu bem ao FC Porto no clássico: Jackson foi sublime naquele passe magistral para o primeiro golo de Tello (e na assistência para o segundo, também); Tello foi eficaz no hat-trick (e fez, claramente, a melhor exibição deste que está em Portugal).
 
Como bem notou o João Tiago Figueiredo, na crónica publicada no Maisfutebol logo a seguir à partida, foi uma espécie de «sociedade ao contrário», com o ponta de lança a servir o extremo, nos dois primeiros golos.
 
Mesmo sem ter marcado desta vez, Jackson reforçou, perante o Sporting, a ideia de que não é «apenas» o melhor marcador da Liga portuguesa. O «Cha Cha Cha» é mesmo o melhor jogador do campeonato e um dos melhores avançados do futebol mundial, neste momento.
 
Ver Jackson Martinez ainda a jogar na Liga portuguesa é um privilégio e um prazer. Em situação normal, já estaria num colosso europeu (há-de lá parar), mas a aposta que o FC Porto continua a fazer nele é confirmada jogo a jogo, semana a semana.
 
Gaitán é muito talentoso (notou-se na qualidade do jogo do Benfica a falta que fez nos últimos tempos). Nani já teve, nesta época de regresso improvável a Alvalade, momentos de génio. Jonas é um avançado com uma cotação que o poderia também colocar num grande europeu.

Mas se tiver que atribuir o prémio de «melhor jogador da Liga», nesta fase pelo menos, daria ao avançado colombiano do FC Porto, muito mais que apenas «goleador», bem mais completo que apenas um «ponta de lança».
 
A forma como recebeu a bola, convidou Tello à desmarcação e passou de forma acrobática, lançando o espanhol para o 1-0, ficará como um dos grandes momentos desta Liga 14/15.
 
O resto foi tão claramente azul e branco que até parece que esse momento não foi decisivo. Mas um clássico, mesmo tão desequilibrado como este, decide-se por detalhes. E, neste, o caminho para a vitória fácil do FC Porto foi aberto por um pormenor sublime de um jogador de topo a nível mundial.
 
Finalmente, Tello

E, claro, Tello, que entra para história com este hat-trick. Todo o mérito ao jovem espanhol emprestado pelo Barcelona, que de algum modo provou, frente ao Sporting, que o rótulo de craque com que chegou no início da época, e que ainda não tinha conseguido mostrar todo o seu potencial.

Muito rápido, presente no jogo da equipa, Tello foi acusando no entanto, até este clássico, pouca objetividade na hora da concretização. Mas no domingo a mira estava afinada: e foram logo três golos, em três boas desmarcações. Dá para confirmar que Tello é craque, mas não retira por completo as críticas de pouca objetividade de que foi alvo até ao jogo com o Sporting. 

Um caso a acompanhar nos próximos jogos, mas até neste ponto Lopetegui ganhou o clássico: quem contestava a preferência do técnico espanhol por Tello, em detrimento de Quaresma, nas opções para o onze portista, talvez baixe o tom das suspeitas (e sim, ter Quaresma como «suplente de luxo», e ainda por cima motivado, é mesmo uma sorte).  

Lopetegui acertou também na aposta em Evandro para o lugar de Oliver, resistindo à tentação de recuar Brahimi e colocar Quaresma no onze. Depois dos solavancos dos primeiros meses, este FC Porto passa, talvez, a melhor fase da época. 

E agora?

Bom, agora ficou completamente claro que a ideia do Sporting sonhar com o título era desfasada.

Com o Sp. Braga a apenas um ponto, e o FC Porto a quatro do Benfica, a reta final desta Liga parece vir a ter, nos lugares da frente, duas competições próprias: a luta pelo título, com o Benfica ainda favorito mas um FC Porto a passar a melhor fase da época, a tentar reduzir distâncias; e a disputa do terceiro lugar, com os leões a sentirem os calcanhares pisados por um Sp. Braga em crescendo.

Numa palavra: promete.
 
«Nem de propósito» é uma rubrica de opinião e análise da autoria do jornalista Germano Almeida. Sobre futebol (português e internacional) e às vezes sobre outros temas. Hoje em dia, tudo tem a ver com tudo, não é o que dizem?