Cinco reflexões de final de época:
 

1. Jorge Jesus é o grande vencedor da Liga 14/15.
 
Dos três campeonatos ganhos, em seis anos, na Luz, este terá sido o mais difícil e o que teve mais mérito do treinador. Pelas perdas na pré-temporada (Oblak, Garay, Markovic, Siqueira, Djuricic, André Gomes, Rodrigo), pelas lesões (Ruben Amorim, Fejsa, Gaitan mais na parte final), pela saída de Enzo a meio da temporada.
 
A tudo isto Jesus conseguiu responder com soluções que mantiveram o Benfica como a equipa mais regular e mais forte ao longo da temporada. Liderar a Liga desde a quinta jornada, sem intervalos, é dado suficientemente claro para resistir a outro tipo de análises mais subjetivas.
 
Não foi um título ganho de forma arrasadora (o Benfica chegou a ter vantagem maior sobre o FC Porto e podia ter resolvido a questão bem mais cedo, caso tivesse ganho em Paços ou em Vila do Conde, redutos onde acabou por perder), mas sendo um campeonato uma prova de regularidade, a justeza do triunfo do Benfica não gera grande discussão.
 
No primeiro título em confronto direto com o FC Porto (em 2010 o segundo foi o Sp. Braga, em 2014 o segundo foi o Sporting), Jesus revelou maturidade ao obter empate com sabor a vitória no 0-0 do clássico da Luz frente ao grande rival. Terá sido essa a chave do sucesso.
 
 
2. Julen Lopetegui terá margem muito curta em 15/16.
 
Foi o primeiro ano em Portugal, de um treinador sem experiência em clubes, ainda que com currículo muito assinalável em seleções jovens (foi um dos «protagonistas», termo que adora usar,  da fase de ouro do futebol espanhol, também nas seleções jovens).
 
O FC Porto teve exibições de grande nível (4-0 ao Basileia, 3-1 ao Bayern Munique, 3-0 ao Sporting), mas tendo em conta a qualidade do plantel, exigia-se mais.
 
Acima de tudo, a primeira época de Lopetegui no Dragão tem que ser rotulada de negativa por três motivos: o FC Porto passou uma temporada inteira sem vencer o Benfica (0-2 no Dragão, 0-0 na Luz), perdeu o título para o seu eterno rival e termina 14/15 sem um único triunfo para exibir aos adeptos (uma Taça da Liga ou de Portugal diminuiria o impacto de época em jejum total).
 
O que minimiza um pouco o sentimento de falhanço é a chegada aos quartos da Champions: não acontecia aos portistas desde 2009, foi fundamental para os cofres da SAD.
 
Deve chegar para que Lopetegui inicie a época II do contrato de três anos. Mas a margem do técnico basco será, em 15/16, bem menor (basta auscultar as críticas, já muito visíveis, do universo portista).
 
Sem Danilo e provavelmente também sem Jackson e Oliver, como será?
 
 
3. Marco Silva, caso saia do Sporting, é o candidato número 1 a suceder a Jesus ou Lopetegui.
 
Já se percebeu que é fim de linha para Marco Silva no Sporting, mesmo que ganhe a final da Taça de Portugal.
 
Vindo do Estoril, onde fez um trabalho simplesmente extraordinário, o jovem técnico foi escolha aparentemente acertada e consensual para suceder a Leonardo Jardim, que tinha deixado o Sporting no segundo posto, à frente do FC Porto, e partira para o Monaco.
 
O Sporting de Marco Silva ficará atrás dos dois grandes rivais, é certo, mas tendo em conta o plantel dos leões, a época tem que ser considerada como positiva: o terceiro posto foi obtido de forma clara (o 4-1 ao Sp. Braga foi prova mais recente de quem o merece), a possível vitória na Taça de Portugal e um desempenho europeu razoável seriam créditos mais do que suficientes para que, pelo menos, houvesse segundo ano num contrato que tem quatro.
 
Um treinador, seja ele qual for, num projeto como o do Sporting, terá sempre vida muita complicada com Bruno de Carvalho. Falar-se em «título» quando não há plantel para isso é ter, à partida, a discussão viciada. Leonardo Jardim sabia bem disso, agora é Marco Silva que o sabe.
 
A crise do natal (com pormenores simplesmente surreais) só não deu na saída do treinador a meio da época pela força que Marco Silva tem junto dos adeptos. Mas deixou sequelas que devem, em breve, ser fatais.
 
Duma coisa estou certo: no dia em que abrir vaga na Luz ou no Dragão, Marco Silva é candidato fortíssimo.
 

4. Paulo Fonseca, Rui Vitória e Petit são outros vencedores.
 
Paulo Fonseca pela coragem de ter voltado a Paços, quando todos os manuais de gestão de carreira o desaconselhariam. Provou que é um grande treinador, provou que sabe pôr uma equipa a jogar bem, que sabe aproveitar o melhor dos seus jogadores, que sabe descobrir talentos e não tem medo de os lançar, independentemente da idade ou estatuto. Está de parabéns e continuará, por certo, na lista dos treinadores portugueses mais cotados e desejados. Por mérito próprio.

Rui Vitória fez novo «milagre» em Guimarães: chegou a liderar a Liga, perdeu gás na segunda fase da temporada (sobretudo com a saída de Hernâni para o FC Porto), mas termina num excelente lugar (talvez quinto, mas ainda com o quarto em aberto), mesmo com um plantel extremamente jovem e inexperiente. A capacidade que tem de refazer equipas em pouco tempo faz dele um dos melhores treinadores portugueses da atualidade. 

Petit acreditou na força que a camisola do Boavista pode ter em jogadores que, noutras circunstâncias, não estariam na Liga. Ignorou avisos de uma suposta condenação prévia e, depois de arranque complicado, foi somando pontos, como quem não quer a coisa. O futebol quase nunca encantou, mas a raça estava lá, como imagem de marca. Sobretudo em casa, o Boavista mostrou regularidade suficiente para obter a permanência de forma clara. E justa.

E ainda há outros três treinadores que merecem referência positiva: Miguel Leal, pela belíssima época do Moreirense; Pedro Martins, pela campanha europeia do Rio Ave (caso não tivesse tantos jogos na temporada, o conjunto vilacondense seria forte candidato ao sexto lugar); Sérgio Conceição, pela qualidade do futebol praticado pelo Sp. Braga em boa parte da temporada (não nas últimas semanas) e pela possibilidade de vencer a Taça de Portugal.  
 

5. A violência em Guimarães e no Marquês tem que ser investigada ao pormenor. Para não se repetir.
 
Já se falou, escreveu e viu tanto sobre os acontecimentos em Guimarães e no Marquês, em Lisboa, que não tenho grande vontade em desenvolver. Até porque prefiro escrever sobre futebol.

A gravidade do que ocorreu nesses momentos são problemas de sociedade, de educação e, nalgumas situações, casos de polícia. Investigue-se, aprenda-se com os erros. Sobretudo, não repitam.
 

«Nem de propósito» é uma rubrica de opinião e análise da autoria do jornalista Germano Almeida. Sobre futebol (português e internacional) e às vezes sobre outros temas. Hoje em dia, tudo tem a ver com tudo, não é o que dizem?