Tirambaço: substantivo masculino; Chute violento em direção ao gol (Brasil) 

Fora de jogo já foi fora-de-jogo.

Perdeu hífens num acordo, apesar de no Brasil ser impedimento.

O Fora de Jogo nasceu offside em Inglaterra. É Hors-jeu em França, Abseit na Alemanha e Buitenspel na Holanda.

Já na cabeça de Marco van Basten é coisa estranha.  

E a cabeça de Marco van Basten foi uma das coisas mais valiosas na história do futebol mundial.

As Leis do Jogo nasceram em 1863. E já lá tinham o Offside: nenhum jogador da equipa que ataca podia estar à frente da linha da bola. Parece estranho, não é?

Anos mais tarde, adotou-se a regra de «três defesas», guarda-redes incluído. Um jogador estava impedido se pela frente tivesse apenas três adversários. O que levou a mudanças profundas no estilo: em vez do drible para progredir, o passe para a frente passava a opção.

Em 1920, o lançamento lateral deixou de contar para o Fora de Jogo. E em 1925, a regra de três defesas passou a dois.

Em 1990, um avançado que estivesse em linha com o penúltimo defesa passou a estar em posição regular. O que levou a novos desenvolvimentos, sobretudo defensivos, até aos dias de hoje: a linha de trás passou a ter de ser perfeita, alinhada, as referências entre colegas de uma mesma equipa mudaram e até o guarda-redes teve de avançar uns metros em várias situações.

Já em 2017, o diretor técnico da FIFA para o desenvolvimento sugere abolir o offside. Sugeriu-o entre outras coisas. Sobre essas, o presidente da UEFA, em entrevista ao alemão Die Welt, nesta semana, riu-se. Sobre o Fora de Jogo foi mais sério.

«Não precisamos de revolução, porque o jogo tem sido fantástico. O offside é importante.»

Mas se todas as mudanças na Lei levaram ao futebol que hoje adoramos, porque será diferente se a abolirmos?

Pela ideia que deu Humberto Coelho.

Porque o Fora de Jogo é que torna o futebol profissional numa coisa de uma elite com a qual o resto se espanta.

Um campo pode ter 120 metros de comprimento e 90 de largura. Mas o Fora de Jogo encolhe-o, aperta-o de forma a que só mesmo os melhores executantes consigam ter sucesso entre quem também quer a bola.

No fundo, o Fora de Jogo aumenta a exigência. Sem ele, o jogo competitivo é banal. 

Onde não há ninguém, qualquer um é Maradona. Consegue parar uma bola. Onde há muitos, por todos os lados, fica mais difícil. Às vezes só mesmo Deus [Maradona] consegue. Porque quando ela vem, ali tem de ficar.

Coletivamente, o jogo também iria perder. Para nós que o vemos e para aqueles que o jogam. O futsal não tem fora de jogo, mas agora façam equipas de um guarda-redes e mais dois e joguem a campo inteiro. Ninguém aluga pavilhão para isso.

«Não precisamos de revolução, porque o jogo tem sido fantástico. O offside é importante.» Ainda bem que alguém com autoridade o lembrou a Van Basten. Se não, qualquer dia, ainda nos pedia para escrever fu-te-bol, foot-ball, fuss-ball ou cal-cio. Mesmo que para ele seja Voetbal.

O Tirambaço é um espaço de opinião do jornalista Luís Pedro Ferreira. Pode segui-lo no Twitter.