PLAY é um espaço semanal de partilha, sugestão e crítica. O futebol espelhado no cinema, na música, na literatura. Outros mundos, o mesmo ponto de partida. Ideias soltas, filmes e livros que foram perdendo a vez na fila de espera. PLAY.

SLOW MOTION:

«EL VIAJE DE SAN MARINO» - de Martin Ainstein/Damián Ainstein
Lima Pereira e Celso; Geraldão e Demol; Fernando Couto e Zé Carlos; Aloísio e Jorge Costa; Ricardo Carvalho e Jorge Andrade.

Pelos caminhos da história do FC Porto. Do final da década de 80, passando pelos anos 90, até ao século XXI. Escola de centrais, excelência no eixo da defesa, solidez e categoria.

Diferentes no estilo, uns mais agressivos, outros até selvagens, alguns de inteligência e classe delicada. Todos, porém, unidos na qualidade e na capacidade de jogar de dragão ao peito.

E agora, para algo completamente diferente, Chidozie e Bruno Martins Indi. Os deuses no Dragão devem estar loucos.

Proponho um exercício. Simples. Observem com atenção o resumo do FC Porto-Sporting, parem as imagens e analisem o posicionamento dos centrais escolhidos por José Peseiro. Não só nos três golos.

Comparem a movimentação de Islam Slimani nas bolas paradas. Percebam de onde parte o argelino e onde cabeceia, sempre sem oposição. E depois carreguem no pause e procurem Chidozie e Indi.

Vamos lá ver se nos entendemos: o FC Porto treina todos os dias? Sim. O plantel ensaia lances de bola parada? Presumo que sim. A equipa técnica analisa os jogos dos adversários? A este nível a resposta só pode ser afirmativa.

Ora, se tudo isto sucede, seria interessante perceber a origem de tamanha confusão, tamanho caos, tamanha fragilidade e anarquia. É só falta de qualidade? O diagnóstico é esse, pelo menos para quem só tem acesso aos jogos e não analisa o dia a dia dos atletas: não têm dimensão para este nível.

Bruno Martins Indi causa-me maior estranheza, confesso. Não evoluiu desde a chegada ao clube, continua a ser muito fraco no jogo aéreo e comete mais erros do que nunca.

Se calhar, a ausência da Holanda do Europeu 2016 não é assim tão estranha e descabida.

O FC Porto tem muitos problemas. O centro da defesa é apenas um deles. Ao ver o Clássico, ao seguir atentamente Chidozie e Martins Indi, pensei em defesas de equipas pequenas e no que teve de piorar o dragão para entrar em campo com um setor recuado tão… simpático.

Imaginei-me nas bancadas de um Inglaterra-San Marino, em que uns atacam e massacram e os outros, genuínos amadores, padecem de limitações monstruosas. Neles, nos heróis de San Marino, perfeitamente aceitáveis.

Em Chidozie e Martins Indi, particularmente neste, inadmissíveis. E se tivessem de jogar no coração da defesa de San Marino contra Inglaterra? Vale a pena ver estes maravilhosos 23 minutos de documentário.

PS: «Mergulho Profundo» - de Luca Guadagnino
Uma estrela rock no início da decadência e o companheiro, um fotógrafo a recuperar dos danos provocados por uma tentativa de suicídio falhada; um produtor musical histérico, consumidor de todos os tipos de droga e de todos os parceiros sexuais; uma adolescente com as crises de adolescente, com a mania narcisista que os adolescentes pretendem ter.

Quatro personagens reunidas no idílio de Pantelleria, ilha italiana não muito afastada da costa tunisina. Um produto indie, interessante, capaz de captar o ambiente de ócio e boémia transalpinos e com uma notável interpretação de Ralph Fiennes.

Quando Harry (Fiennes) dança, incontrolável, ao som de Emotional Rescue, dos Rolling Stones, o filme agarra, o filme prende. É a melhor cena filmada por Guadagnino.

SOUNDCHECK:

«CLUB FOOT» - dos Kasabian
Leicester está na moda e os Kasabian também. O sucesso dos Foxes recolocou a principal banda da cidade nas manchetes e se houver título o King Power Stadium vai receber um concerto «inesquecível».

A promessa é de Tom Meighan, vocalista dos Kasabian e adeptos «louco» do Leicester. Claudio Ranieri vai ter de subir ao palco e cantar este Club Foot.

«One...take control of me?
Yer messing with the enemy
Said its 2..it's another trick
Messin with my mind, I wake up
Chase down an empty street
Blindly snap the broken beats
Said it's cut with a dirty trick
Its taken all these days to find ya
I tell you I want you
I tell you I need you»

PS: «The White Album» - dos Weezer
Não há ponta de pretensiosismo no rock simples, direto e luminoso dos Weezer. Aqui procuram-se guitarras pesadas, refrões orelhudos e pessoal a dançar, longe de depressões e crises existenciais.

Rivers Cuomo, vocalista e guitarrista dos californianos, continua a fazer música para se divertir. E divertir-se. Não é coisa pouca.

VIRAR A PÁGINA:

«QUANDO É DIA DE FUTEBOL» - de Carlos Drummond de Andrade
Crónicas e poemas, metáforas da sociedade brasileira associadas ao futebol, incidência grande sobre os agitados anos de 60 e 70. Leve e inteligente, incómodo e bem humorado, os textos foram publicado em livro após rigorosa escolha de dois dos netos do autor mineiro, falecido em 1987.

A obra contempla uma das mais felizes definições sobre Mané Garrincha: «Se há um deus que regula o futebol, esse deus é sobretudo irónico e farsante; Garrincha foi um dos seus delegados incumbidos de zombar de tudo e de todos, nos estádios».

«PLAY» é um espaço de opinião/sugestão do jornalista Pedro Jorge da Cunha. Pode indicar-lhe outros filmes, músicas e/ou livros através do e-mail pcunha@mediacapital.pt. Siga-o no Twitter.