Cristiano Ronaldo, para já, é apenas um dos melhores jogadores portugueses de todos os tempos.

Será, acredito, indiscutivelmente o melhor pouco depois de terminar a carreira. E só não subirá o degrau para ícone incontestável, pré-santo, se atingir a imortalidade algo que, dado tudo o que já o vi alcançar ao longo da carreira, não dou como adquirido que não irá conseguir. Quem ganha quatro Bolas de Ouro também pode perfeitamente descobrir o elixir da vida eterna.

Se falhar e, pela primeira vez, se revelar igual a todos nós, os cá ficarem não deixarão de o carregar aos ombros até ao trono dos heróis de uma nação.

E será banal que seja nome de rua, de estádio, de escola ou aeroporto.

Agora não. Agora, Ronaldo é só um jogador de futebol.

Aliás, mais do que isso, Ronaldo é só o melhor jogador de futebol do mundo, algo corriqueiro no nosso país de contradições que ainda há uns anos foi chamado a escolher o melhor português de sempre e deu a vitória àquele que não os deixaria escolher o melhor português de sempre.

No dia em que Portugal tiver o melhor economista do mundo, o melhor cientista do mundo, o melhor professor do mundo, o melhor merceeiro do mundo ou o melhor carpinteiro do mundo – e, sublinho, basta um deles – podem então dizer-me que Ronaldo é só o melhor jogador de futebol do mundo.

Há sempre a hipótese de alguém dizer que a questão não é ser Ronaldo, mas ser futebol. Ou seja, não se desvaloriza o melhor na sua arte, mas a arte em si. Como não me lembro de uma decisão qualquer de um político dar alegria a tanta gente como «O Golo do Eder» em Paris, rebato, pois claro.

Como já tenho vindo a dizer, o futebol é o maior fenómeno de massas da atualidade, além de uma indústria gigante, que faz milhões e traz, também, largos milhares por ano a Portugal. Ou alguém acha que quem vem assistir a um jogo das competições europeias chega à hora do jogo e parte mal ele termina?

E ainda há um dado extra. Para cúmulo do azar, aquele que é só o melhor jogador de futebol do mundo, é também só o português mais conhecido em todo o mundo. Porque, e digam-me se isto não é de propósito, o futebol é só o desporto mais popular do mundo.

Portanto, como é óbvio, não tem a mínima lógica e roça a falta de respeito que a terra que o viu nascer ache que faça sentido dar a um lugar onde, deseja-se, cheguem pessoas de todo o mundo, o nome do seu cidadão mais conhecido.

Por isso, vão continuar as queixas, as invejas e as denúncias de falta de respeito por um país de grandes em vários mundos, mas poucos, ou nenhum, acima de todos os demais. Quando a poeira assentar, então, vai ser mais fácil perceber que aterrar no Ronaldo, pese o potencial para piadas, não é a coisa mais descabida que este país já fez. Daí à justa homenagem será um salto.

Daqueles que o Ronaldo, que é só um jogador de futebol, até é perito a dar.

«O GOLO DO EDER» é um espaço de opinião no Maisfutebol, do mesmo autor de «Cartão de memória».Porque há momentos que merecem a eternidade e porque nada representará melhor o futebol português, tema central dos artigos, do que o minuto 109 de Paris. Siga o autor no Twitter.