«O Sporting está a tentar recuperar o prestígio, em Portugal e fora, mas tem prioridades desde a primeira hora: as competições nacionais, não deixando de fora a Liga Europa, claro, mas as prioridades toda a gente sabe quais são.»

Os leões regressaram à Europa nesta quinta-feira, em Moscovo, horas após o sorteio dos oitavos de final da Taça de Portugal. E fizeram-no com uma vitória importantíssima, resultado de um desempenho de qualidade superior (2-4).

Na véspera, falando sobre essa divisão de interesses do Sporting, Jorge Jesus voltou a vincar a sua posição e o privilégio pelas provas nacionais. Aliás, repetiu a ideia após o triunfo frente ao Lokomotiv, chegando ao ponto de dizer que, se achar que faz sentido, coloca a equipa B no jogo decisivo com o Besiktas.

Olhando para trás (e para a frente, tendo em conta esse aviso do treinador), os adeptos ficaram plenamente satisfeitos com uma vitória em Arouca após a humilhação na Albânia, frente ao Skenderbeu? A vitória, mais uma, frente ao Benfica na Taça tornou relativamente irrelevante o resultado seguinte na Liga Europa?

A lógica não é consensual e torna-se questionável do ponto de vista financeiro, chegando a colidir com a ambição do próprio Jorge Jesus. Um treinador que ambiciona conquistar uma Liga dos Campeões sujeita-se a manchar a sua imagem no panorama internacional. Aliás, já falhou o acesso à fase de grupos da principal competição europeia.

Valeu a pena, de qualquer forma? Acredito que sim, que pode fazer sentido. Se houver sucesso final.

O adepto de um grande português prefere invariavelmente o sucesso nas competições nacionais a um bom desempenho europeu. O administrador de uma SAD, por norma, aponta no sentido contrário, embora não acredite que esse seja o caso na Sociedade Anónima do Sporting.

É possível ter uma coisa e outra? Claro. E esse afigura-se como o grande desafio das maiores equipas do Velho Continente. Obriga a uma gestão moderada de recursos humanos a cada semana, evitando quebras abruptas de rendimento ou de motivação.

Observando friamente a gama de recursos do Sporting, sou levado a dar razão a Jorge Jesus. Foi inadmissível a derrota pesada na Albânia mas assentou na premissa certa: tendo de escolher, perante um plantel relativamente curto, prioridade à luta interna.

Liderar o Campeonato, vencer a Supertaça, superar o maior rival em três ocasiões, incluindo a Taça de Portugal, mesmo que tal corresponda a risco de adeus à Liga Europa? Ou ficar sem Supertaça, sem Taça, ficar para trás no Campeonato e ter apuramento garantido para os oitavos de final da Liga dos Campeões?

Em suma, o cenário atual do Sporting ou o cenário atual do Benfica? A escolha parece-me clara.

Jorge Jesus tem um plano e, acredito, procura fazer o que ainda não foi feito no futebol português. Tem desde já um lugar na história mas pretende algo inédito.

Otto Glória, ainda na década de 60, foi o único treinador a sagrar-se campeão nacional pelos dois maiores clubes de Lisboa. Quase meio século mais tarde, Jesus sonha fazer o mesmo e – objetivo máximo – superar a marca.

O atual treinador do Sporting afastou o Benfica da Taça e pode ser o primeiro – entre 98 que triunfaram na prova - a levantar o troféu no Jamor por leões e águias. Para tal, depois de afastar os encarnados, enfrenta novo desafio hercúleo na 5ª eliminatória, em dezembro: uma visita a Braga.

Esse seria ponto obrigatório para outra façanha inédita, porventura irrepetível: a conquista da dobradinha nos dois lados da Segunda Circular.

Perante um cenário tão sedutor, percebo que Jorge Jesus esteja a negligenciar a Europa – e a colocar em risco o seu currículo internacional – para correr atrás de algo que ficaria perpetuado na história do futebol português.

Entre Linhas é um espaço de opinião com origem em declarações de treinadores, jogadores e restantes agentes desportivos. Autoria de Vítor Hugo Alvarenga, jornalista do Maisfutebol (valvarenga@mediacapital.pt)