PLAY é um espaço semanal de partilha, sugestão e crítica. O futebol espelhado no cinema, na música, na literatura. Outros mundos, o mesmo ponto de partida. Ideias soltas, filmes e livros que foram perdendo a vez na fila de espera. PLAY.

SOUNDCHECK:

«UEFA CHAMPIONS LEAGUE» - de Tony Britten.
Não sei o que é pior em Jorge Jesus. Se a incoerência omnipresente no discurso ou a arrogância com que normalmente lida com a comunicação social. Mesmo na hora da derrota.

Três exemplos, fresquinhos:

1. Depois do insucesso em São Petersburgo, um colega da SporTV questiona-o sobre a relevância do Bayer-Mónaco (na altura ainda não se sabia o resultado) e Jesus, já farto de ouvir perguntas, lá disse que isso não lhe interessava «nada». O Mónaco acabou por vencer e o Benfica assinou o check-out das provas europeias.

2. Outro colega, agora da TVI, pretende saber que consequências pode ter o último lugar na Liga dos Campeões. 48 horas depois, pelos vistos, Jesus ainda não sabia que tinha ficado em último, atrás de Bayer, Mónaco e Zenit. «Ainda não sei se fico em último. Falta um jogo…»

3. Só mais uma, para não aborrecer os leitores. Quem viu o jogo na Rússia percebeu, facilmente, que o Benfica perdeu o controlo da bola após a saída de Talisca e a entrada de Derley. Podia ter resultado, não resultou. Quisemos ouvir a opinião de Jesus sobre isso. O que disse o treinador? «O que tem o Talisca a ver com o golo sofrido?» Tudo? Nada? Alguma coisa? Pelos vistos, nada. «Tirei um avançado e meti outro avançado».

Não vale a pena enunciar, pela enésima vez, os méritos de Jorge Jesus no crescimento do Benfica desde 2009. Eles existem, são óbvios, merecem aplauso.

Mas há outro lado, porventura superior, que me faz uma confusão tremenda. Será que ninguém explica a Jesus que quando fala a um jornalista está a falar para os adeptos do Benfica?

Será que ninguém ainda lhe explicou que a Liga dos Campeões não é um mero torneio de verão e que em cinco anos só por uma vez chegou aos oitavos de final?

Será que assumir as culpas e retirar consequências, por uma vez que seja, é pedir demasiado ao inimputável treinador do Benfica?

Será que o plantel é mesmo fraco e que o último lugar na Champions é uma condenação natural?

E por falar em plantel. Quem escolheu Loris Benito? Cristante, Bebé ou César? Já para não falar de Luís Felipe, Djavan ou Candeias.

A Liga dos Campeões é a mais bela competição do mundo. Jogá-la sem ambição é incompreensível. Perdê-la sem uma amostra de dor, como se fosse inevitável, é intolerável. Afinal, o Benfica é ou não um dos maiores emblemas do mundo? É.

Entrar no relvado e escutar a composição escrita por Tony Britten é um privilégio. Por favor, alguém é capaz de explicar isto direitinho a Jorge Jesus? 



PS: «La Petite Mort» - James.
Estação de São Bento, cidade do Porto, dia 27 de novembro. Durante uma hora, os majestosos James tocam, respondem a perguntas dos fãs, fazem do histórico edifício uma arena de som doce e poderoso, um paradoxo que identifica a coerência de uma longa carreira.

O momento, inimaginável à partida, é um excelente aperitivo para os espetáculos anunciados para Guimarães e Lisboa. O álbum mais recente, La Petite Mort, será o pilar da atuação, mas os grandes êxitos estarão todos lá. E o público vai cantar até que a voz lhe doa.

Deste último trabalho de estúdio, destaco o fantástico Moving On (claramente ao nível dos anos áureos da banda de Manchester, ali entre 1988 e 1994), mas também Walk Like You, Frozen Britain e All I’m Saying. Um registo muito digno para o 14º cd dos James.

Aí estão eles, os fabulosos sete: Tim Booth, Jim Glennie, Larry Gott, Saul Davies, Mark Hunter, Andy Diagram e um dos meus bateristas favoritos: David Baynton-Power.
     
 


SLOW MOTION:

«SONS OF BEN» - de Jeffrey C. Bell
A Major League Soccer arrancou em 1996. Philadelphia, apesar de ser uma das maiores cidades dos EUA, não foi contemplada para acolher uma das equipas do campeonato profissional norte-americano.

Dez anos depois, em 2006, o cenário não se invertera. Farto do ostracismo a que a MLS o votara, um grupo de amigos apaixonados por futebol – o nosso, não o americano – fez o  impensável: criou um grupo de apoio, uma claque se preferirem, ainda mesmo de haver uma equipa de soccer.

Inspiraram-se em Benjamin Franklin, nome maior na história dos EUA e filho pródigo de Philadelphia, e formaram os Sons of Ben (Filhos de Ben).     

Este documentário recupera todos os passos de Bryan James e Andrew Dillon, fundadores deste coletivo de adeptos apaixonados por soccer (afinal, eles existem nos EUA), até ao nascimento do sonho mais ansiado: os Philadelphia Union.

James, Dillon e outros milhares de anónimos organizaram manifestações, encheram estádios desertos, aplaudiram jogadas imaginárias, lutaram pela causa que mais amavam.

A 25 de março de 2010, a luta cessou e os Union estrearam-se na MLS.

Mais do que historiar todos os eventos até à criação da equipa, a película é um assomo de paixão brutal pelo futebol, com origem num país onde outros desportos continuam a reinar.

Antes de haver clube, havia o amor lúdico pelo soccer. Uma lição para os que se deixam cegar pela clubite e esquecem o essencial.

 

PS: «Boyhood» - de Richard Linklater.
Preparem-se para as próximas palavras: este é um dos melhores filmes que alguma vez vi. E é o cinema a fazer história. Mais história.

Linklater, venerável realizador - consagrado pela trilogia Before Sunrise, Before Sunset e Before Midnight -, acompanha durante 12 anos (2002 a 2014) o trajeto do jovem Mason, aqui interpretado por Ellar Coltrane.

Nunca antes alguém se atrevera a tamanha empreitada. Cada ano, durante algumas semanas, o grupo de atores juntava-se e filmava as cenas idealizadas pela equipa de Linklater.

Coltrane cresceu, Ethan Hawke e Patricia Arquette envelheceram, o filme transforma-se num ensinamento soberbo sobre a vida e a evolução da nossa própria espécie.

Ainda é cedo, mas coloco-o desde já como o grande candidato a vencedor na próxima cerimónia dos Oscars. Um verdadeiro triunfo.     

 


VIRAR A PÁGINA:

«ENTRE LINHAS» - de Carlos Carvalhal

Os direitos de autor do livro escrito pelo treinador português revertem, na íntegra, para Zé António. O antigo jogador de Leixões e Desportivo das Aves continua a lutar com um heroísmo admirável contra a esclerose lateral amiotrófica. 

Todos os que quiserem contribuir para a melhoria de vida de Zé António podem mandar um donativo para o seguinte NIB: 000704330002286000485.

O livro de Carvalhal, além desta importante componente humanitária, tem um conjunto de histórias muito interessantes, questões com que cada treinador se depara no dia a dia e experiências vividas e narradas por Carvalhal sobre todos os balneários onde já trabalhou.

Zé António não foi esquecido, como fez questão de mostrar publicamente o plantel do Aves:

 

«PLAY» é um espaço de opinião/sugestão do jornalista Pedro Jorge da Cunha. Pode indicar-lhe outros filmes, músicas e/ou livros através do e-mail pcunha@mediacapital.pt. Siga-o no Twitter.