Não há muito mais por onde possa crescer a capacidade humana para bater recordes no desporto. É essa a convicção de muitos cientistas, baseados nas evoluções das melhores marcas ao longo da história. Mas há sempre a hipótese de alguém furar as previsões estatísticas. Como Usain Bolt.

«Em todos os desportos assistimos a um nivelamento», nota Steve Haake, do Centro de Pesquisa Tecnológica de Desporto da universidade britânica de Sheffield Hallam, em declarações à France Press, acreditando que se podem «prever limites» para a capacidade fisiológica de os homens se superarem.

A principal constatação baseia-se na evidência. Alguns dos principais recordes no atletismo, por exemplo, são marcas antigas, que ninguém conseguiu repetir. Os 8,95 metros de Mike Powell no comprimento têm 21 anos, o de Sergei Bubka no salto à vara 18, o de Jonathan Edwards no triplo salto 17.

Além disso, algumas das marcas notáveis mais recentes tiveram ajuda «exterior». Foi assim na natação, num fenómeno que teve muito a ver com os fatos especiais usados pelos nadadores. Desde que foram proibidos, os registos voltaram à «normalidade».

Outro cientista, o francês Geoffroy Berthelot, fez uma estimativa matemática, com base nos recordes olímpicos desde 1896, e estima que os atletas atingiram 99 por cento daquilo que é possível para a fisiologia humana. Nas suas conclusões, até 2027 metade das 147 disciplinas que estudou terão atingido os seus limites e não vão melhorar mais do que 0,05 por cento. «As performances desportivas estão a atingir um limite fisiológico», sentencia.

E depois há quem ponha em causa todo este trabalho matemático em pouco menos de 10 segundos. O cientista norte-americano Reza Noubary tinha previsto que o recorde dos 100m, a disciplina de referência do desporto, não baixaria dos 9,44 segundos. Depois de 2008, quando Usain Bolt pulverizou por três vezes o anterior recorde, admitiu que o seu modelo podia ter que ser revisto.

Entre 1991 e 2007, o recorde dos 100 metros baixou 0.16 segundos. Bolt baixou-o em igual medida, em apenas um ano. Primeiro de 9,74s para 9,72s, depois para 9,69 nos Jogos Olímpicos de Pequim e um ano mais tarde para os atuais 9,58s.

«Com estes novos dados, o limite previsto provavelmente baixará um pouco», admitiu Noubary, que admite ser «imprevisível prever a magnitude da improbabilidade do talento atlético». «Bolt é um exemplo perfeito, porque combina as vantagens mecânicas dos homens mais altos com a mobilidade muscular dos homens mais baixos», analisa.

A maior parte das abordagens ao assunto têm sido matemáticas ou estatísticas. Alguns estudiosos defendem que deviam ser essencialmente fisiológicas, mas também aí admitem que não é fácil. Nomeadamente no que diz respeito à velocidade.

«É mais difícil compreender a mecânica do sprint do que da força ou da resistência», diz à BBC Peter Weyand, estudioso da ciência da corrida numa universidade norte-americana, explicando que num ciclista, é possível, por exemplo, combinar peso, posição e aerodinâmica para prever a perfomance, mas na velocidade «é um buraco negro»: «Não temos esse tipo de relações de previsão.»