7 de outubro de 1921. Um ano depois de ter sido criada para participar no torneio olímpico de futebol dos Jogos de Antuérpia, onde conquistou a medalha de prata, a seleção absoluta de Espanha realizava o seu primeiro jogo no seu país.

Um bis de Paulino Alcántara, avançado de origem filipina que a par de Samitier foi o primeiro grande goleador do Barcelona, decidiu o particular diante da Bélgica.

A casa da seleção nessa estreia em solo pátrio foi uma escolha interessante: San Mamés, Bilbau.

Quase um século depois, a seleção espanhola só voltou a jogar no estádio que foi alcunhado como «A Catedral» do futebol espanhol em mais seis ocasiões.

O novo estádio do Athletic, inaugurado em 2013, foi construído junto ao antigo San Mamés

Desde 31 de maio de 1967, quando Espanha recebeu e venceu também por 2-0 a Turquia num jogo de qualificação para o Euro 68, que Bilbau não voltou a acolher La Roja. A situação não se alterou mesmo quando em 2013 o histórico recinto deu lugar ao novo San Mamés, uma novíssima arena com 60 mil lugares que é a casa do Athletic Club Bilbao.

Meio século passou desde a última atuação espanhola na cidade bilbaína, mas o assunto não esmoreceu e esta semana a Comissão de Cultura e Desporto do Parlamento Basco rejeitou a proposta do Partido Popular (PP), partido de direita e unionista do primeiro-ministro Mariano Rajoy, para que a seleção espanhola de futebol jogasse no novo San Mamés.

Reivindicação basca e «antiespanholismo»

A proposta de lei, com o objetivo de solicitar à Real Federação Espanhola de Futebol, curiosamente presidida pelo bilbaíno Ángel Maria Villar (antigo jogador do Athletic), a realização no País Basco de um jogo da seleção e agora orientada por outro basco, o ex-treinador portista Julen Lopetegui, foi rejeitada pelo Partido Nacionalista Basco (27 deputados) e pelo Euskal Herria Bildu (21 deputados), as duas forças políticas que defendem a autodeterminação do território e as que são mais representativas no Eusko Legebiltzarra (parlamento autonómico).

Martxel Toledo Garmendia, coordenador e fundador da Euskal Seletkzioaren Aldeko Iritzi Taldea (ESAIT), plataforma que entre 1996 e 2015 defendeu a criação de meia centena de federações de diferentes modalidades e de um comité olímpico basco à margem de Espanha e também de França (que tem jurisdição sobre três pequenas províncias bascas) esclareceu ao Maisfutebol a divisão na sociedade basca:

«A nossa reivindicação tem força suficiente para ser alcançada. A maioria dos bascos quer ter uma seleção própria. Apesar das conquistas da seleção espanhola, no Mundial e em Europeus, potenciadas pela mediatização da imprensa, sobretudo em Guipúscoa (San Sebastián) e Viscaia (Bilbau) há um fortíssimo apoio a uma seleção de Euskadi, mas a nossa posição tem esbarrado na intransigência da Federação Espanhola e da UEFA. Gibraltar, no entanto, tem uma seleção e não é um estado independente. O entrave à nossa causa deve-se a uma questão política, que impede o avanço desta causa tanto no País Basco como na Catalunha, onde também existe um fortíssimo apoio a uma seleção própria.»

Na sequência da proposta recusada, o PP acusou «o “antiespanholismo” de alguns responsáveis políticos», tendo recebido do PNB, de direita, e do Bildu, de esquerda, a justificação de que a seleção espanhola não representa a comunidade autónoma do País Basco (composta pelas províncias de Biscaia, Guipúscoa e Álava) e precisamente pela necessidade de oficializar a seleção basca.

Jogo particular Catalunha-Euskadi (País Basco) em dezembro de 2015

Em 2015, o governo autonómico basco colocou na sua agenda a proposta de que a Euskal Selekzioa deixe de jogar apenas um jogo particular anual, na quadra natalícia, e passe a defrontar regularmente seleções nacionais de outros países em jogos particulares nas datas agendadas pela FIFA.

Este primeiro passo colide com os interesses da equipa espanhola, que poderia perder jogadores como o guarda-redes Arrizabalaga, o lateral Azpilicueta ou o médio Illarramendi, que fizeram parte da mais recente convocatória da seleção nacional.

Esta questão é uma das cisões que leva ao «boicote» à seleção de Espanha tanto no País Basco como na Catalunha.

Madrid, Sevilha e Valência: sim. Bilbau e Barcelona: não

Com efeito, nos últimos anos, as duas regiões autónomas têm sido terra interdita à seleção espanhola.

Se San Mamés não recebe Espanha desde 1967, o Camp Nou de Barcelona, maior recinto da europa com capacidade para 98 mil espectadores, não serve de casa a La Roja desde janeiro de 1987 – 1-1 num particular frente à Itália.

Em 296 jogos disputados em casa, a seleção espanhola fez apenas sete no País Basco (seis em Bilbau, um em San Sebastián) e 18 na Catalunha (todos em Barcelona). A título comparativo em termos de regiões, Espanha jogou 72 vezes na Andaluzia, 65 vezes na Comunidade de Madrid e 50 na Comunidade Valenciana. Em termos de cidades, Madrid é a cidade que mais vezes foi anfitriã da seleção espanhola, 63, à frente de Sevilha, 45, e Valência, 33.

Último jogo da seleção espanhola, que venceu na Macedónia (1-2) na qualificação para o Mundial 2018

Com efeito, faz sentido a pergunta: Espanha voltará a jogar algum dia no País Basco?

Martxel Toledo Garmendia só vê uma hipótese: «Bilbau será uma das sedes do Euro 2020 (que se disputará em várias cidades pelo continente europeu). Se Espanha se apurar e o sorteio assim ditar poderá jogar no San Mamés.»