O Club Deportivo Palestino está no centro de uma polémica com a comunidade judaica do Chile. O novo equipamento do clube originou um conflito que já atravessou as fronteiras do país e chegou a Israel. Mas como pode uma camisola gerar tamanha indignação?

A 4 de janeiro de 2014, o emblema chileno entrou pela primeira vez em campo com o novo equipamento. A principal inovação prendia-se com o número 1, idêntico ao mapa da Palestina antes da criação do Estado de Israel.

Após o embate com o Everton, na primeira jornada do Torneio Clausura, o CD Palestino teve de ouvir as críticas da comunidade judaica do país mas continuou a usar a camisola nos duelos com a Universidade do Chile e os Santiago Wanderers. 

«Eles devem ser sancionados porque infringiram os artigos da Associação Nacional de Futebol Profissional e da FIFA, que sancionam atos que afetem a dignidade das pessoas que veem o espetáculo desportivo e o uso do desporto como uma plataforma de reivindicação política», defendeu Marcelo Isaacson, diretor executivo da comunidade judaica do Chile.


O Tribunal Disciplinar da ANFP (Associação Nacional de Futebol Profissional) precisaria de uma queixa de outro clube para intervir.

A iniciativa partiu do Ñublense de Chillán. Patrick Kiblisky Fried, presidente do clube, fez a denúncia mas gerou desconforto entre os seus adeptos, considerando que o nome do Ñublense foi utilizado para satisfazer interesses pessoais. Kiblisky tem ascendência judaica.

Na segunda-feira, o Tribunal Disciplinar decidiu punir o Palestino com uma multa de 1.300 dólares. Porém, o órgão não se manifestou claramente sobre a questão política. A punição teve a ver com as dimensões do número 1, obrigando assim o clube a desistir da sua ideia original.

«Acataremos a decisão e não usaremos o mapa como número, mas está claro que não há proibição de usar o mapa no equipamento», considera o presidente Fernando Aguad.
 


«Vamos desenhar uma nova camisola, tendo toda a liberdade para incluir o território e toda a simbologia palestina», acrescentou Aguad, em declarações ao El Mercurio. 

A comunidade judaica considera que o clube pretende divulgar uma mensagem política nos campos de futebol, enquanto os palestinianos garantem que tudo não passa de uma simples homenagem às suas raízes.

A disputa não fica por aqui. Sem os contornos lamentáveis do conflito no Médio Oriente, esta questão relança o debate sobre as fronteiras entre o desporto e a política.  



O Clube Deportivo Palestino foi fundado em 1920 por um grupo de imigrantes palestinianos no país. Inicialmente, aceitava apenas jogadores árabes mas acabou por ceder e, com atletas de diversas origens, chegou ao topo do futebol chileno.

Campeão em 1955 e 1978, o CD Palestino venceu ainda duas Taças (1975 e 1977). Usa desde sempre as cores da bandeira da Palestina: verde, vermelho e branco.

O seu trajeto cruza-se com a história da comunidade, a maior fora do mundo árabe – mais de 400 mil pessoas. Não há uma justificação clara e única para o fluxo migratório entre Palestina e Chile, iniciado por volta de 1850.

Roberto Bishara e Alexis Norambuena nasceram em Santiago do Chile mas fazem parte dessa realidade. Os dois jogadores de futebol representaram a Seleção Nacional da Palestina.

«Não acho que tenha sido feito com fim político»

Alexis Norambuena, de 29 anos, joga atualmente num clube polaco mas acompanha a polémica em torno da camisola do CD Palestino. Em declarações ao Maisfutebol, o defesa ilibou o emblema chileno. «Não quero ser irresponsável nas minhas declarações mas tanto as pessoas da Palestina como as pessoas judaicas têm diferentes crenças em relação ao território. Dito isto, não acho que o CD Palestino tenha feito isso nas camisolas com algum fim político.»

«Fora esta questão, o Chile tem a maior comunidade de palestinos fora do mundo árabe e por isso é natural que se lute tanto pelos direitos das gentes da Palestina», frisa Alexis.

Em 2012, Alexis Norambuena somou cinco internacionalizações pela seleção da Palestina. «Para mim foi uma experiência muito linda e fiquei muito agradecido pela forma com fui recebido. De futuro, só desejo o melhor para as gentes da Palestina e que se resolvam os problemas quanto antes», conclui o jogador nascido no Chile.

Do outro lado do conflito no Chile continuará a comunidade judaica, igualmente representativa. De acordo com os dados mais recentes, há perto de vinte mil judeus a viver no país nesta altura, muitos deles com posições de relevo na sociedade local. Haverá solução para este diferendo histórico? O CD Palestino continuará a lutar pela sua causa.