Embora durante um curto período, Paulo Alves foi selecionador nacional sub-20. O técnico sublinha que este é um cargo «muito mais difícil» agora do que em tempos passados, pela falta de recursos humanos, mas lembra que nem todas as culpas são dos clubes: pode ser uma questão geracional.

O ex-treinador do Gil Vicente, em entrevista ao Maisfutebol, diz ainda que os primeiros passos estão a ser dados, com o regresso à aposta na formação.

Antes de assumir o Gil Vicente pela segunda vez, treinava a seleção sub-20. É um cargo mais difícil do que em outros tempos?

Hoje é muito difícil. Não há recursos humanos. O futebol português entrou durante muitos anos no que era mais fácil: ir ao Brasil e trazer jogadores. Hoje não é assim porque a realidade económica dos dois países mudou. Descurou-se na formação, mas nos últimos anos também é verdade que não havia muitos jogadores de muita qualidade. Havia alguns. Quando eu fui campeão do mundo em Riade e depois fomos campeões outra vez dois anos depois, havia muitos jogadores de muita qualidade. Passado uns anos deixou de haver. Não têm aparecido mas também deixou de se promover isso.

Acha que o paradigma está a mudar?

Sim, porque neste momento Portugal não tem condições para ir buscar jogadores ao Brasil. E nem falo do que é bom, digo o que é mais ou menos, não o que é de topo. Já não os conseguimos ir buscar, não há dinheiro. Estamos a voltar outra vez à formação e à procura das Divisões inferiores.

Tem de ser essa a solução?

Naturalmente. Há três exemplos fantásticos. O Sporting começou a apostar nos seus jovens e as coisas melhoraram. O V. Guimarães viu-se obrigado a apostar nos seus jovens e fez um campeonato excecional. O Leixões é outro exemplo, na II Liga. Este três clubes sempre tiveram boas escolas de formação. Aos poucos estão a surgir exemplos de que se apostarmos na formação poderemos tirar proveitos disso.

O Gil não é um clube que tenha tirado grandes partidos da formação nos últimos tempos. A que se deveu?

Em termos de formação, o Gil tem um problema: não tem condições, não tem estruturas. Não tem campos sintéticos, não tem um espaço físico onde possa desenvolver o potencial dos jogadores. Portanto ou aparecem predestinados, como é o caso do Zé Luís ou do Pecks, que por via desse talento natural são incorporados nas equipas principais, ou, se são jogadores que ainda precisam ser lapidados, vai acabar por ser complicado. É o que acontece com a maioria e nem sempre há disponibilidade para os ter sob contrato.

Enquanto jogador, o Paulo Alves foi ponta-de-lança. A ideia de quem em Portugal não se formam pontas-de-lança é um mito ou uma realidade?

Não é mito, nem realidade. É preciso é que apareçam jogadores com essas características. O que é um ponta de lança? Falo do ponta-de-lança tradicional, como eu era. Tem de ser alto, tem de jogar bem de costas para a baliza, que seja uma referência, que seja um bom finalizador e tenha um bom jogo de cabeça. São muitas coisas...Não é fácil reunir isto tudo num jogador só. Pode haver um que até joga bem de cabeça, mas não consegue jogar de costas, por exemplo. Arranjar Van Bastens é muito complicado...Aparece um de 50 em 50 anos. Depois as pessoas dizem que é um mito. Mas não, não aparecem muitos jogadores desses, é muito difícil. Porque se aparecer, ninguém vai desaproveitar de certeza.