O futebol português tem os seus bigodes famosos. De Toni a Artur Jorge, com passagem por António Oliveira, Chalana, Bento, Frasco ou Carlos Manuel. O futebol mundial também tem os seus bigodes famosos. Como Scolari, Ian Rush, Rudi Voller ou Rijkaard. Uns mantiveram-se fiéis ao estilo até aos dias de hoje. Outros cederam à tentação da lâmina e colocaram um ponto final numa imagem de marca.

A história de hoje é daquele que é, muito provavelmente, o melhor bigode do futebol mundial. Não pelo talento com a bola nos pés mas pelo…bigode, lá está.

Falamos de Abe Van den Ban. Quem? Pois. É provável que, se não for conhecedor a fundo do futebol holandês ou apaixonado pelo estilo retro deste universo da bola, nunca tenha ouvido falar dele.

Apresentamos, aos que não conhecem, este senhor.

E, prepare-se, esta história não tem uma exibição de sonho, um golo decisivo ou um momento que entra diretamente para a história do futebol. Van den Ban não foi um craque que fez os miúdos sonhar, mas é uma personagem que dificilmente cai no esquecimento. Hoje, na Holanda, é figura de culto, a ponto de se terem juntado jornalistas, bloggers e simples admiradores para um jogo em sua homenagem, em 2012.

Quem é, então, Van den Ban? Em outubro irá completar 70 anos de vida e, por isso, longe vão os tempos da bola nos pés. Ou nas mãos. É que no final dos anos 60, quando iniciou a sua vida desportiva, Van den Ban era jogador de basquetebol. Uma experiência curta, porque foi o futebol, pouco depois, que o cativou de vez. Destacou-se como defesa, mas passou a jogar mais à frente, no miolo, rapidamente.

Foi no ZFC Zaandam, equipa que militava na II Divisão da Holanda, que começou a sua carreira no futebol. Por pouco tempo, pois em 1970, então com 23 anos, já assinava pelo AZ Alkmaar, um dos maiores clubes da Holanda.

Poderia ter sido o início da sua cavalgada até ao topo, mas não foi. O talento, é certo, não abundava e poucos jogos fez no AZ. Dois anos depois de chegar, saiu. Rumo ao FC Amesterdam, o primeiro clube que lhe marcou a carreira.

O dia em que tirou um cartão do bolso do árbitro

O FC Amsterdam tinha sido fundado há muito pouco tempo quando Van den Ban assinou contrato. Em 1973/74, na estreia na I Divisão holandesa, o clube terminou em quinto lugar, o que valeu um bilhete para a Taça UEFA do ano seguinte. E a prestação na prova superou, também as expectativas.

Eliminou o Hibernians e o Inter de Milão, em jogos em que Van den Ban não alinhou, e, já com o histórico bigode no onze, despachou também os alemães do Fortuna Dusseldorf. Caiu nos quartos de final, novamente frente a adversário germânico e novamente com Van den Ban em campo…mas por pouco tempo.

No jogo com o Colónia, Van den Ban foi expulso no início da segunda parte com o resultado em 2-1 e os alemães acabaram a golear (5-1). Apesar disso, não foi réu da eliminação do seu clube, já que a caminhada havia sido histórica. E Van den Ban era, por aquela altura, ídolo dos adeptos.

Ainda muitos tinham na memória o caricato episíodio que aconteceu em 1972, em jogo da Taça Intertoto frente ao Nitra, da Eslováquia. Van den Ban discordou de uma decisão do árbitro, perdeu a cabeça e dirigiu-se a ele. Quando muitos pensaram que iria agredir o juiz, optou por algo diferente: tirou-lhe um cartão amarelo do bolso e mostrou-o, como forma de desagrado.

Não se livrou da expulsão…

O mito: Van den Ban existiu mesmo?

Em 1976 deixou a equipa da capital holandesa rumo ao Harleem, o clube que, ainda hoje, mais facilmente lhe é associado. Foi lá que jogou ao lado do jovem Ruud Gullit, por exemplo, e onde conquistou o único título da carreira: campeão da II Divisão holandesa em 1981.

Jogou mais dois anos e pendurou as chuteiras. Abriu…uma barbearia. Curioso, não?

Abe Van den Ban no seu jogo de homenagem (Foto: Facebool Indenbanvanabe)

Tão ou mais foi, contudo, todo o misticismo que se seguiu. Durante a carreira, apesar do vistoso bigode, Van den Ban sempre foi muito discreto. Num tempo em que a informação não corria à mesma velocidade de hoje, havia muitos holandeses que nunca o tinham visto jogar e apenas o conheciam das cadernetas de cromos.

E se centramos o foco em adeptos de futebol holandês, imagine-se como seria noutros pontos do globo.

Não foi preciso esperar muitos anos para nascer o mito: Van den Ban existiu mesmo como jogador de futebol ou foi apenas uma figura curiosa que preencheu coleções de cromos e revistas da especialidade?

Não havia entrevistas conhecidas, presenças em eventos desportivos, ligações fortes a um clube ou a outros jogadores. Havia relatos que passavam de boca em boca. E garantias de quem viu.

Hoje, como é óbvio, já ninguém duvida que existiu mesmo. Aliás, em 2012 foi mesmo homenageado por um grupo de jornalistas holandeses, que jogaram perante o olhar atento de Van den Ban. Que hoje não tem cabelo, continua, simpaticamente, sem dar muita conversa e, acima de tudo, mantém quase intacto o bigode que faz dele um dos maiores fenómenos de culto do futebol holandês.