PLAY é um espaço semanal de partilha, sugestão e crítica. Cultural, quero crer. O futebol espelhado no cinema, na música, na literatura, no teatro. Outros mundos, o mesmo ponto de partida. Mas não só. Ideias soltas, reflexões comuns, filmes e livros que foram perdendo a vez na fila de espera das nossas prioridades. PLAY.

SLOW MOTION:

«PLAYDAY» - Victor Santos. Saíamos de casa, bola debaixo no braço, joelhos rasgados, calções puxados até ao umbigo. As equipas faziam-se à pressa, o gordo ia à baliza, a baliza eram dois paralelos.

Uma, duas, três horas. A bola batia nos passeios, desviava nos buracos, só parava para deixar passar os carros. E jogávamos, jogávamos, sem que o tempo passasse ou as forças faltassem. As peladinhas acabavam de três formas:

1. A avó preocupada chamava para o lanche; 2. O gordo fartava-se de ser guarda-redes e de levar cuecas humilhantes; 3. A bola saltava para o pátio da casa do sr. Moreira e morria furada na ponta de uma tesoura.

Nenhum de nós se atrevia a saltar o muro da pequena vivenda. O homem vivia para atormentar-nos, desde que um remate desconchavado lhe partiu uma janela. Acidentalmente, claro. A partir desse dia, o velho Moreira passou a ser o inimigo oficial do nosso reino.

Aquele muro, aquele jardim, aquela casa sugeriam-nos medo, terror, verdadeiro pânico. Uma fortaleza habitada por um monstro impiedoso, atento a qualquer lapso técnico ou desvario irreverente da miudagem da rua.

O realizador Victor Santos terá testemunhado cenas parecidas e fez esta premiadíssima curta-metragem. Há um grupo de putos, uma bola chutada para a casa errada e um monstro que de maquiavélico nada tinha. Basta ver o vídeo até ao fim.

Vocês querem ver que o sr. Moreira, afinal, era uma joia de homem?

PLAYDAY from Victor Santos on Vimeo.



SOUNDCHECK:

«WORLD IN MOTION» - New Order. Não deixa de ser irónico: o único single da banda de Peter Hook, Bernard Summer e Stephen Morris a atingir o número um no top do Reino Unidos foi uma música sobre futebol.

Nem o atabalhoado rap de John Barnes a conseguiu estragar. O antigo médio do Liverpool ganhou direito a entrar no vídeo depois de bater Peter Beardsley, Paul Gascoigne e Chris Waddle num concurso interno.

Outra curiosidade. O nome pensado originalmente foi «E for England». A FA vetou-o, sugerindo que o E podia ser tomado como uma alusão ao ecstasy.

PS: «DJANGO DJANGO» - Django Django. Refrescante, inovador, assumidamente alternativo. É um dos grandes álbuns de 2012 e uma paleta de sonoridades tão díspares quanto compatíveis. Default vive de uma guitarra suicida, Waveforms é um sopro de agitação, Skies Over Cairo é uma vénia ao faquir encantador de serpentes.

VIRAR A PÁGINA:

«INGLATERRA-ARGENTINA: Mundiais e outras pequenas guerras» - David Downing. Margaret Thatcher morreu, a questão entre Inglaterra e Argentina nas Malvinas foi relembrada. Lembrei-me deste livro que evoca, precisamente, a rivalidade ancestral entre dois países distantes geográfica e socialmente. Já no Mundial de 1966, Alf Ramsey, selecionador inglês, chamava animais aos sul-americanos. Num jogo em que a Inglaterra fez quase o dobro das faltas.



«PLAY» é um espaço de opinião/sugestão do jornalista Pedro Jorge da Cunha. Pode indicar-lhe outros filmes, músicas, livros e/ou peças de teatro através do e-mail pcunha@mediacapital.pt. Siga-o no Twitter.