PLAY é um espaço semanal de partilha, sugestão e crítica. Cultural, quero crer. O futebol espelhado no cinema, na música, na literatura, no teatro. Outros mundos, o mesmo ponto de partida. Mas não só. Ideias soltas, reflexões comuns, filmes e livros que foram perdendo a vez na fila de espera das nossas prioridades. PLAY.

SLOW MOTION:

1990 - UMA NOITE EM TURIM. Tensão máxima, ensurdecedora, mãos expectantes e dedos entrelaçados na cabeça, o coração a galopar numa voragem insuportável.

Meias-finais do Campeonato do Mundo, tudo a decidir nos pontapés de grande penalidade. Inglaterra e RFA. Gascoigne e Matthaus, Shilton e Illgner, Lineker e Voller.

Mal refeito da tragédia de Heysel, do hooliganismo demente e dos sucessivos escândalos financeiros, o futebol britânico chega inapelavelmente desacreditado ao Itália-90. Em seis jogos, tudo muda.

Sir Bobby Robson encontra em Paul Gascoigne o seu herói privado, os resultados entusiasmam, a nação une-se em redor de uma equipa capaz de afrontar as odds mais improváveis. Dois empates e um triunfo chegam para passar a primeira fase.

No prolongamento, a poderosa Bélgica cai nos oitavos. Seguem-se os leões indomáveis, os Camarões do velho Milla. Em Nápoles, o San Paolo torna-se uma estepe africana, até à salvação nos penáltis de Lineker. E depois, UMA NOITE EM TURIM.

O documentário é de 2010. Bobby Robson e «Crazy Gazza» são notáveis. O mestre e o delfim imperfeito. Doido, desequilibrado, adorado. Vale a pena voltar a este Mundial.



SOUNDCHECK:

«LA VIDA TOMBOLA», MANO CHAO. Escrever sobre o Itália-90 faz-me pensar em Maradona. Em Maradona e nos dias em que pedalava quilómetros para ser o primeiro cliente do dia na papelaria do sr. Branquinho.

«Três carteirinhas do Mundial, não é?». O homem já sabia. Aqueles 50 escudos eram para investir com prudência e rigor. Em cromos, claro. A expetativa era sempre a mesma. Ter Diego colado na minha caderneta. Já que Domingos Paciência não ia aos Mundiais, contentava-me com D10S.

Continuo a andar de bicicleta. De quatro em quatro anos também volto a ser prudente e rigoroso na compra (e venda) de cromos. É até provável que o sr. Branquinho ainda abra a porta na expetativa diária de me encontrar. Maradona é que deixou de ser cromo.

Vi há dias o documentário de Emir Kusturica sobre o Pelusa.

Termina com esta cena magnífica. Mano Chao a cantar, Diego de óculos escuros a tapar os olhos mareados. « Si yo fuera Maradona viviria como el, Si yo fuera Maradona, frente a cualquier porteria!».



PS: «An Awesome Wave», dos britânicos Alt-J, é a minha mais recente catarse musical. Uma miríade de sons psicadélicos, sussurrados numa voz melancólica e experimentalista. Há folk pomposa e eletrónica (!), refrões zulus, guitarras cinematográficas e grandes canções.

VIRAR A PÁGINA:

«EUROPEAN FIELDS», Hans van der Meer. Um mergulho ao futebol amador. Observações absurdas e poéticas, desenhos de campos pelados na Roménia, balneários rachados na Escócia e bancadas despidas na Rep. Checa. Para este holandês o futebol não podia ser mais simples: uma bola, 22 jogadores. O resto é dispensável. Um livro para quem ama, de facto, a modalidade.

«Play» é um espaço de opinião/sugestão do jornalista Pedro Jorge da Cunha. Pode indicar-lhe outros filmes, músicas, livros e/ou peças de teatro através do e-mail pcunha@mediacapital.pt. Siga-o no Twitter.