Começou por ser um hobby de dois amigos italianos, mas é hoje a plataforma mais utilizada pelos clubes. Criada em 2004, a Wyscout cresceu a uma rapidez impressionante, ao mesmo ritmo com que foi «encolhendo» o mundo do futebol, tornando-se uma ferramenta que os principais equipas, seleções e empresários mundiais já não dispensam. São mais de 300 clientes atualmente, incluindo os portugueses FC Porto, Benfica, Sporting, Sp. Braga, Estoril e Académica, assim como a Federação Portuguesa de Futebol e a empresa Gestifute, de Jorge Mendes. Nascida na cidade italiana de Chiavari, converteu-se num Big Brother do desporto-rei.

Não fugimos muito à verdade se dissermos que não há nada que um jogador profissional faça em campo que escape à Wyscout, seja em Portugal ou no Gabão. São mais de 150 os campeonatos seguidos por esta empresa, para um total de quase 300 mil jogadores catalogados, que é como quem diz: com perfil próprio e vídeos individuais. E entre 15 a 20 mil destes jogadores têm mesmo um relatório feito por olheiros ao serviço da empresa.

A oferta não fica por aqui, no que ao scouting diz respeito. A observação pode ser também coletiva, já que um clube pode utilizar a plataforma para ver os jogos de um adversário, por exemplo.

De Chiavari às Ilhas Cook

Foi isso que esteve na génese da empresa, de resto. Matteo Campodomico e Simoni Falzetti, os fundadores, começaram por gravar jogos locais, em Chiavari. E as dúvidas iniciais deram lugar a um projeto de sucesso. «Desde início que pensámos em criar um negócio, mas pesquisámos na net e encontrámos várias empresas do género, algumas grandes. Isto em 2004. Pensámos que não tínhamos hipóteses, e por isso trabalhámos localmente. Mas percebi que o produto era bom e entreguei um DVD ao treinador Sersi Cosmi, que estava então no Génova. Eles gostaram e começaram a trabalhar connosco», explica Matteo Campodomico ao Maisfutebol.

Em pouco tempo várias portas da Serie A abriram-se para a Wyscout. A análise a equipas conduziu depois à análise de jogadores. «Antigamente os clubes viam os DVD feitos pelos empresários. Alguns até aceleravam a imagem, para dar mais velocidade ao jogador. E antigamente os clubes tinham centenas de DVD, o que era difícil de arquivar. Por isso decidimos desenvolver um sistema», explica o co-fundador.

A empresa começou por criar um site mas, na altura, não teve muito sucesso. «Os clubes não confiavam nisso. Só confiavam na televisão», recorda Campodomico. Por isso decidiram proporcionar o serviço através de uma «box», como as da televisão por cabo. A ideia resultou, mas o mundo da tecnologia está sempre a evoluir, e a Wyscout soube acompanhar. «O passo seguinte foi a aplicação. Quando apareceu o iPad percebemos logo que era para nós. Oferecemos uma centena a clubes europeus», revela o CEO da Wyscout.

A empresa cresceu de forma impressionante ao longo destes nove anos. A entrada de um investidor em 2008 permitiu dar um importante salto. Um ano depois a Wyscout lançava a sua plataforma e conseguia o primeiro cliente internacional. Hoje em dia são mais de 300 clientes a utilizar o serviço, disponível no PC ou através da aplicação, em qualquer lugar. Para os clubes a primeira conta custa cerca de 750 euros, se falarmos do pacote completo, mais 100 euros por cada conta adicional. Em média os clubes gastam sete mil euros por ano.

O contributo português

A Wyscout conta, hoje em dia, com cerca de oitenta colaboradores, metade dos quais analistas. Em Portugal também há quem tenha dado o seu contributo ao projeto: Rui Malheiro liderou uma equipa que, entre fevereiro e setembro de 2012, elaborou relatórios para mais de cinco mil jogadores. «Montei uma equipa com o Alexandre Calado, o José Pedro Teixeira e o Joachim Rodrigues. Foi a primeira etapa da plataforma. Seguimos aquela que já era a minha linha de trabalho, com noventa parâmetros de avaliação: físicos, técnicos, táticos e psicológicos», explica o analista luso, que ficou encarregue da Liga portuguesa, os dois principais escalões de Inglaterra e Espanha, assim como a elite húngara, ucraniana e ainda uma compilação dos campeonatos asiáticos.

«É fantástico pensar que tive responsabilidade numa contratação. Dou o exemplo do Mkitharyan, sabendo que fomos nós que fizemos o relatório há um ano e meio, e que o Dortmund utiliza a plataforma. Foi a nossa equipa que fez também o relatório do Iago Aspas, que foi para o Liverpool. O mesmo se aplica ao Ola John e ao Djuricic», revela.

Embora a plataforma ofereça vídeos do comportamento individual dos jogadores, a equipa de Rui Malheiro optou por analisá-los no contexto coletivo: «Víamos seis jogos de cada equipa, com graus de dificuldade diferentes: jogos com equipas do cimo da tabela, do fundo, em casa e fora. É melhor ver o jogador enquadrado num jogo contra outras equipas. A análise individual serve para ver os golos marcados, ou as bolas paradas. Era preciso ver os jogos completos. O jogador podia enganar-nos com dez minutos brilhantes e depois passar oitenta a passear em campo.»

Rui Malheiro entende que a Wyscout é um projeto que «está sempre vivo, não se esgota». «Há sempre novos jogos disponíveis. É possível ver jogos do Gabão, do Butão, do Botswana, Chade, Ilhas Cook. Não faz sentido um grande clube ficar de fora. E para um clube médio pode ser caro ter a versão completa, mas pode poupar dinheiro que gastaria numa má transferência», defende.

«Claro que os clubes devem continuar a ver os jogadores ao vivo, mas antes é preciso referenciá-los. E, se calhar, quando estão de olho num avançado acabam por referenciar também um central e otimizam a viagem», lembra Matteo Campodomico, co-fundador.

No que diz respeito ao futuro, a Wyscout está a «dar os primeiros passos na análise de equipas». «Já é possível ver os golos de bola parada, ou o comportamento nos cantos. Mais tarde ou mais cedo irá por aí», revela Rui Malheiro, que até dá um exemplo: «O Estoril deve ter sentido dificuldades para observar o Pasching, adversário na Liga Europa, e eu vi dois jogos deles através da plataforma.»

O analisa defende, ainda assim, que a Wyscout «vai continuar a observar jogadores». «Faz sentido atualizar o que foi escrito há um ano. Os jogadores evoluem», acrescenta.

O futuro e as outras ofertas

Matteo Campodomico levanta um pouco do véu, para o Maisfutebol. «Não é fácil ter informação de jogadores jovens. Esse é o desafio», atira. Mas Rui Malheiro alerta que a quantidade de informação «é incrível». Até a esse nível. «Um responsável pela formação do Dortmund pode estar no seu escritório e ver jogos dos sub-10 ou sub-12 do Benfica», explica.

Porém, a Wyscout não oferece apenas esta base de dados de jogadores. A empresa quer alimentar também uma rede social futebolística: «Queremos criar um site para promover novos jogadores. Uma espécie de facebook do futebol, para que os jogadores se mostrem aos clubes», explica Matteo Campodomico.

A visão da empresa não se limita ao mundo virtual. A Wyscout gosta de promover também o contacto direto, e por isso costuma organizar fóruns onde se juntam clubes e empresários. Uma espécie de «speed dating» do futebol. «Promovemos a troca de informação cara a cara. Colocar as pessoas do futebol no mesmo local e deixar que se conheçam», sustenta o co-fundador. A próximo edição destina-se ao mercado sul-americano, e está marcada para o Rio de Janeiro, a 21 e 22 de outubro. Segue-se uma reunião no Médio Oriente, em Abu Dhabi (5 e 6 de novembro), e depois um fórum global, em Londres, no último mês do ano.