O râguebi inglês está virado de pantanas no rescaldo do dececionante desempenho no recente Campeonato do Mundo que a Inglaterra recebeu. O roupeiro da seleção está metido ao barulho – parece anedota, mas não será – e há jogadores já a dizer que deixou de haver confiança no grupo depois de o escândalo rebentar.

O caso é sério, com o selecionador que comandou os ingleses no falhanço caseiro com os dias contados e é o selecionador inglês campeão do mundo – na única vez que uma seleção europeia ganhou o Campeonato do Mundo – quem diz que a Inglaterra é o alvo de chacota do râguebi mundial – mas já lá iremos.

A Inglaterra tornou-se o único país anfitrião nas oito edições do Campeonato do Mundo de râguebi a ser eliminada na primeira fase da prova. A seleção inglesa até abriu a fase de grupos com um triunfo folgado sobre as Ilhas Fidji (35-11) e fechou a série de quatro jogos com uma vitória retumbante sobre o Uruguai (60-3). Mas, pelo meio, perdeu com o País de Gales (25-28) e foi arrasada pela Austrália (13-33).

Pelo meio desta eliminação também ficou agora a saber-se que houve um caso de investimentos bolsistas que correu mal e que terá contribuído para tal resultado por ter afetado o moral da equipa. A notícia foi avançada pelo «Sun on Sunday»: muitos jogadores da seleção inglesa perderam um total de mais de 100 mil libras (na ordem dos 141 mil euros) num investimento aconselhado pelo roupeiro da seleção que apanhou o Mundial pelo caminho.



Dave Tennison é considerado um competente responsável da equipa nacional inglesa de râguebi organizando desde os equipamentos de treino, aos de jogo, a toda a logística. O seu trabalho desenvolvido desde 2002 abrange 60 pessoas – entre jogadores e os outros elementos – e inclui o planeamento dos campos de treino ou das digressões. O que correu mal foram as dicas bolsistas.

O «Sun» revela que Tennison «enviou uma catadupa de e-mails a aconselhar os jogadores a investir na [empresa] LGO Energy» e que isso aconteceu «durante os estágios do verão [em julho] e até dois dias antes da estreia [no Mundial] com as Fidji». Contrariando os conselhos de Tennison, as ações da empresa caíram de 3,27 libras (4,60 euros) em julho para 1,30 £ (1,83 €). As ações da LGO valem ao dia de hoje cerca de 70 cêntimos.

A palavra do roupeiro da seleção inglesa foi tida em conta pelos jogadores porque se pensava que «ele tinha contactos na indústria da energia pelo seu passado militar», disse ao «Sun» uma «fonte próxima da equipa» sob anonimato. O jornal inglês refere vários jogadores da seleção que investiram dinheiro e que ficaram sujeitos às perdas sequentes, como Sam Burgess, Danny Care ou David Wilson.

«Isto passava-se nos bastidores, na preparação e durante o campeonato. Era um tema constante e não contribuía para acabar com os amuos. Era terrível para o moral e bastante escandaloso. Alguns dos rapazes investiram dinheiro na ordem das dezenas de milhares de libras», disse a fonte do «Sun».



O jornal frisa que o selecionador inglês, Stuart Lancaster, e a sua equipa técnica nada sabiam das dicas bolsistas. Mas os resultados desportivos não perdoaram e as responsabilizações – que incluirão uma substituição de Lancaster já na calha – estão em marcha. A federação inglesa de râguebi (RFU) já prometeu reações. «A RFU toma as alegações como extremamente sérias. É um assunto interno e estamos a tomar as medidas apropriadas», disse um porta-voz ao «Sun».

A fonte próxima da equipa disse ao jornal que «ninguém está a dizer que as dicas sobre as ações foram a razão» para a Inglaterra ter estado «tão mal» no Mundial, mas que «certamente não ajudaram». E acrescenta na responsabilização: «É espantoso como alguém na sua posição tenha agido desta forma quando a nação estava envolvida em algo tão crucial.»

Mas a forma como estas revelações têm vindo a público também se tornou ela mesma mais uma fonte de desestabilização. Mike Brown mostrou publicamente o seu repúdio não só pelo que foi contado sobre as jogadas na bolsa dentro da seleção inglesa de râguebi como pelo anonimato sob o qual foi contado.

«No fim de semana houve uma história absolutamente ridícula e por isso a confiança acabou no que a mim me diz respeito», disse o internacional inglês ao «The Telegraph». Brown frisou que agora será «mais difícil» ter essa confiança quando a seleção voltar a reunir-se condenando o anonimato que «incendeia» o ambiente; mas, prometendo também confrontar quem falou: «Vai saber-se quem foi e vai ser interessante quando se souber. Eu vou ser um dos primeiros a falar com eles.»



O ambiente está a ferver no râguebi inglês. Em várias frentes; não só na seleção. O já aqui referido Sam Burgess é um jogador de nascimento inglês, mas que fez carreira na liga australiana. Na última época foi contratado pela inglesa Rugby Union. Foi convocado para o Mundial. Este ano mudou-se outra vez para a Rugby League australiana. O regresso ao South Sydney um ano depois foi mais um episódio que caiu mal no meio inglês.

Frisando que não responsabiliza o jogador que o Bath não conseguiu manter, Clive Woodward desferiu um violento ataque à RFU. «Chegámos a um dos pontos mais baixos e embaraçosos de sempre na história do râguebi inglês», escreveu na sua crónica no «Mail».

As palavras do selecionador inglês que levou o seu país a ganhar o único título mundial que a Europa tem em contraponto com os sete que foram para o hemisfério sul não poupam as instâncias locais: «A RFU passou os últimos quatro anos a congratular-se pela direção que tomámos, mas a verdade é que caminhámos de forma confiante para a barafunda total.»

«O rescaldo do Mundial 2011 foi uma balbúrdia. Jogadores e treinadores apanhados em falso por fugas para os media, homens bons expostos como bodes expiatórios e homens menores escondendo-se e escapulindo-se às responsabilidades. Nada mudou», afirmou Woodward com uma conclusão duríssima: «Somos o alvo da chacota não só do mundo do râguebi, como também do desporto e dos negócios.»

Diz, quem o conhece tão bem, que o país do râguebi está virado de pantanas. E a culpa não parece ser só do roupeiro...