Raúl González ainda está por aí... E no ano que vem, com a idade de 37 anos, vai continuar a jogar. Ficou a saber-se nesta quinta-feira, quando foi anunciado que o antigo internacional espanhol vai representar o New York Cosmos na North American Soccer League.

Não é que Raúl tivesse anunciado – oficialmente – o fim da carreira de futebolista. Mas, com esta idade, há coisas que vão sendo inadiáveis. Mais para uns do para outros – é um facto. Há aqueles que adiam o fim da carreira, há os outros que abandonam mais cedo do que muitos esperam. Há também os que abandonam e regressam.

Há muitos, no geral, que não conseguem deixar de estar naquela que foi a maior parte da sua vida, mesmo que já tenham abandonado uma vez, ou mais... E que voltam ou permanecem quando o fim não é assumido oficialmente. Raúl já tinha deixado o futebol de elite da Europa. Até já tinha estado parado meio ano. Mas ainda não é desta que vai guardar as botas de futebol...

O jogador espanhol vai regressar aos jogos oficiais nos Estados Unidos – um país que está a contratar várias estrelas que na última década estiveram nos emblemas mais poderosos do futebol europeu: como Kaká ou Frank Lampard.

Raúl vai ser a estrela maior do segundo campeonato dos Estados Unidos. Depois de ter passado pelo Qatar. Depois de ter passado pelo Schalke 04. Depois de ter sido um dos símbolos do Real Madrid durante largos anos – a notícia da ida para o Cosmos aconteceu, curiosamente, um dia depois de serem assinalados 20 anos sobre a estreia do avançado pela equipa principal dos merengues.
 

O número 7 do Real deixou o Santiago Bernabéu quatro anos antes, em 2010. Foi para a Bundesliga quando o clube da capital espanhola entrou num processo de renovação que implicou a saída de vários históricos. Esteve duas épocas no Schalke, esteve outras duas no Al Sadd, até maio deste ano.

Sem clube, sem fim de carreira assumido, o anúncio oficial foi o de que Raúl volta a jogar em 2015; como vários outros futebolistas fizeram em 2014 – vários que já tinham mesmo terminado a carreira; exemplos que chegam da nova liga de futebol da Índia. A Indian Super League estreou-se há poucas semanas e nasceu com a mesma marca dos Estados Unidos (o país de patrocinadores fundamentais).

O campeonato indiano para onde foram muitos estrangeiros – onde se incluem vários portugueses – é marcado também pela decisão estratégica de ter (pelo menos) um [antigo] jogador com currículo europeu. Del Piero ou Trezeguet são talvez os exemplos maiores, mas estes são jogadores que nunca pararam, mesmo que tenham vindo a passar para ligas menores.

Marco Materazzi, Fredrik Ljungberg e Robert Pires tinham terminado as carreiras. O sueco foi o último a parar, em 2012, mas é também o mais novo deste trio: tem 37 anos. Já o italiano e o sueco têm 41 e a última temporada tinha terminado para cada um deles em 2011. Seja porque demoram a conseguir deixar de fazer o que sempre fizeram, seja por razões financeiras, seja ainda pela competição, muito são os exemplos daqueles que têm parado ou mesmo abandonado, mas, por qualquer que seja a razão, qualquer que seja o desporto, com o regresso em comum.

Regressos cheios de sucesso

Dois anos dececionantes na Brabham resultaram no primeiro abandono de Niki Lauda da Fórmula 1. O piloto austríaco chegou em 1978 à equipa de Bernie Ecclestone como campeão do mundo (pela Ferrari). Mas se o primeiro ano ainda foi suportado, apesar das nove desistências, os 11 abandonos em 13 corridas de 1979 levaram Lauda a nem sequer acabar a época. E foi dedicar-se a tempo inteiro à sua recém-criada companhia de aviação: a Lauda Air.

O ano do regresso foi 1982, depois de convencer os patrocinadores da McLaren. O piloto duas vezes campeão do mundo na década de 1970 (75 e 77) ganhou um lugar ao lado do britânico John Watson.

Em 1984, Lauda passou a dividir as atenções da McLaren com o talento de Alain Prost. Os dois travaram uma luta como nunca tinha sido visto na Fórmula 1 dominando a temporada e chegando à última corrida a disputar o título. No Autódromo do Estoril, Prost venceu, mas o segundo lugar em Portugal do austríaco deu-lhe o terceiro título de campeão mundial por meio ponto de vantagem.



A perda do título mundial para o bem mais velho Muhammad Ali (de 32 anos) em 1974 no famoso combate «The Rumble in the Jungle» deixou o George Foreman de 25 anos um ano afastado – sem combater, mas também sem se reformar. Foreman voltou aos ringues em 1976 e combateu ainda pelo ano seguinte.

Não houve um abandono oficial. Houve mais um novo afastamento; do boxe. Mas este durou 10 anos. Foreman dedicou-se à família e à religião numa conversão que manteve, mas que não o monopolizou para sempre. Em 1987, voltou. Tinha então 38 anos. E renasceu para o boxe com o desejo de defrontar Mike Tyson – o que nunca aconteceu.

Mas, aos 42 anos, George Foreman voltou a lutar por um título mundial: perdeu com Evander Holyfield. Aos 44, aconteceu o mesmo às mãos de Tommy Morrison. Em 1994, com 45 anos, George Foreman tornou-se o mais velho campeão mundial de pesos pesados deixando Michael Moorer (então com 27 anos) KO.



Michael Jordan foi o atleta que no seu primeiro regresso voltou exatamente como era. O Air Jordan deixou de jogar basquetebol em 1993, com três títulos consecutivos da NBA pelos Chicago Bulls. O desinteresse pelo jogo anunciado foi mais tarde explicado pela trágica morte do pai por assaltantes – peso emocional que também justificou a sua dedicação ao beisebol.

Em 1995, proferiu o histórico «I`m back!». Mixchael Jordan esteve meia época a ganhar rodagem e entre 1996 e 1998 ganhou mais três anéis de campeão da NBA tendo voltado a conquistar também o estatuto incontestado de melhor jogador que alguém pode ver atuar.

Mas Jordan não se limitou a sair uma vez e a voltar outra. Repetiu ambas. O desagregar da mítica equipas dos Bulls da década de 1990 levou-o a deixar de novo o basquetebol em 1999. Por mais dois anos. Voltou em 2001.

O segundo regresso de Michael Jordan acabou por tomar a forma de tributo ao maior jogador de basquetebol de sempre – se não o melhor atleta... – porque os resultados já não foram o que eram... O primeiro ano nos Washington Wizards ficou marcado pelas lesões; o segundo passou a ser o do «obrigado» a Air Jordan e o da última oportunidade para vê-lo jogar como sempre. Parou aos 40 anos.



Kim Clijsters tinha previsto o ano de 2007 como o marco para o final da sua carreira de tenista profissional. Assim aconteceu, mas uns meses mais cedo do que o previsto. As lesões acabaram por acelerar uma paragem que estava definida. As razões para essa meta vieram a perceber-se melhor depois.

A tenista belga decidiu abdicar da carreira pela maternidade. Ficou tudo explicado. A surpresa que Clijsters decidiu fazer e que já ninguém esperava foi regressar. A antiga nº1 do mundo e uma vez vencedora do US Open (com mais dois WTA Finals) voltou à alta roda do ténis em 2009. Como nunca antes.

Clijsters voltou a ganhar o major norte -americano logo nesse ano. Venceu um emotivo torneio do grand slam com a sua filha a ver no ano do regresso. Em 2010 voltou a ganhar o US Open, a que juntou mais uma WTA Finals. Em 2011 ganhou o Open da Austrália. E em fevereiro desse ano voltou a ser nº1 do mundo. Parou em 2012.





Em 1996, Steve Redgrave ganhou a quarta medalha de ouro na quarta Olimpíada consecutiva – igualando o recorde de Paulo Radmilovic estabelecido em 1920 – e todos concluíram a única coisa que podia ser concluída: o remador britânico despedia-se ao proferir a famosa frase «Alguém que me veja aproximar de um barco tem a minha autorização para me dar um tiro».



Não abandonou. Dois dias depois, ainda em Atlanta, Steve Redgrave terá mudado de ideias. A oficialização da sua retirada não aconteceu contrariando o que se esperava nos tempos seguintes em que se ausentou. Redgrave não parou; simplesmente tirou férias durante quatro meses porque estava pronto para voltar. «Eu sabia que quando recomeçasse seria duro e eu queria fazer uma paragem», explicou depois.

O homem que anunciou o seu abandono e depois se arrependeu esteve de volta nos três anos que precederam os seguin Jogos Olímpicos em Sydney e ganhou aos 38 anos a quinta medalha de ouro olímpica – como nenhum outro fez. Em outubro de 2000 fez finalmente o comunicado oficial: «Não continuo. Mas não queria fazer o anúncio nas Olimpíadas.»

Regressos que não funcionaram

Como até já se viu com o segundo regresso de Michael Jordan, muitas vezes o regresso que se quer não tem muito a ver com o que acaba por acontecer. No caso dos futebolistas aqui referidos, o novo enquadramento de expectativas não pode se não corresponder a esta fase diferente das carreiras: não ter muitas.

Há casos, contudo, em que o regresso de abandonos mais ou menos precoces foram corrigidos (como os que já vimos), mas que não tiveram o retorno desportivo de outros tempos. São exemplos disso Lance Armstrong e Martina Hingis.

Armstrong anunciou o seu abandono em 2005 enquanto sete vezes vencedor em título da Volta a França. Como Redgrave fez em 1996 nos Jogos, também o ciclista norte-americano comunicou que se retirava no próprio dia quem ganhou o sétimo Tour. Tinha 33 anos e revelou querer dedicar-se à família e à sua fundação na luta contra o cancro.

Ficou quatro anos parado até voltar à ribalta. Em 2008, o texano anunciou que regressava no ano seguinte para correr especificamente a Volta a França 2009.



A volta do regresso, com a Astana, ainda lhe deu um terceiro lugar no Tour. Em 2010, com a Team Shack não foi além do 23º lugar. Foi o ano em que surgiram as primeiras denúncias de doping. Foi quando o mito Armstrong começou a desmoronar.

Martina Hingis tem um histórico de paragens e regressos que já data de há mais de dez anos estando a tenista suíça ainda em atividade. Em 2003, a helvética decidiu abandonar o ténis quando tinha apenas 22 anos. E já com cinco troféus grand slam e dois WTA Finals entre os 40 torneios ganhos em singulares (mais 36 em pares – com nove MAJORS).

A suíça regressou a partir de 2005, voltou a parar, voltou a regressar. No presente, Hingis continua a jogar aos 34 anos no circuito de pares. Neste ano, chegou à final do US Open fazendo dupla com Flavia Penetta.

Regressos que foram mesmo para esquecer

E, agora, chegamos aos casos em que as expetativas saíram bem frustradas. E que aconteceram com alguns que estão no pódio dos maiores de sempre do seu desporto. São os casos, por exemplo, de Björn Borg ou de Michael Schumacher.

Hexacampeão em Roland Garros e pentacampeão em Wimbledon, o tenista sueco foi saindo de cena nos meados da década de 1980. Borg fez um regresso a destempo dez anos depois. Em 1991, deixou crescer o cabelo como tinha quando ganhou os 11 MAJORS e recuperou a sua raquete de madeira. O campeão sueco perdeu os 12 primeiros encontros em que participou sem vencer um SET nos nove primeiros.

Schumacher foi sete vezes campeão do mundo retirando-se da competição em 2006, dois anos depois de ganhar o último título. Mas o piloto alemão não se afastou da Fórmula 1 ficando como consultor da Ferrari. A vontade de voltar à pista foi mais forte. Em 2010, Schumi regressou às corridas pela Mercedes.

A Schumacher aconteceu mais ou menos o mesmo que aconteceu a Borg. O piloto que mais títulos de campeão do mundo tem entre outros recordes não conseguiu, em três temporadas, melhor do que uma única volta mais rápida e um único terceiro lugar.