Ponta de lança, português, produto da formação do FC Porto e titular na Liga portuguesa.

André Silva cumpre todos os requisitos e entra numa lista de elite, constituída nos últimos 42 anos apenas por mais cinco futebolistas:

Fernando Gomes (1974), Domingos Paciência (1988), Toni (1991), Hélder Postiga (2001) e Hugo Almeida (2005).

Função exigente, sim, de especificidade notória. Uma limitação, sugerem os números, no futebol português em geral e no FC Porto em particular.

Os dragões têm recorrido sobretudo ao mercado internacional para solucionar a necessidade levantada pela posição 9. Emil Kostadinov, Mário Jardel, Radamel Falcao, Jackson Martinez, apenas alguns bons exemplos do acerto do departamento de prospeção azul e branco.

A necessidade, porém, indica a mudança de paradigma e o regresso à aposta do ADN azul e branco. E é nas minas das camadas jovens que ele se encontra, abundante e irresistível.

Domingos Paciência, em reflexão feita ao Maisfutebol, aplaude a aposta em André Silva e explica o que sente um menino obrigado a fazer golos quando é lançado às feras.

Para Domingos, tudo começou por opção de Tomislav Ivic, num dérbi quentinho da Cidade Invicta: Salgueiros-FC Porto, no velhinho Vidal Pinheiro, 1 de maio de 1988.

A estreia de Domingos a titular no campeonato:

«Lembro-me muito bem da minha estreia a titular no campeonato. Foi contra o Salgueiros, num jogo em que fiz dupla com o Fernando Gomes. Ganhámos 1-5 e fui substituído pelo Raudnei [aos 75 minutos]», recorda Domingos, ele que já antes merecera minutos na equipa principal.

«Umas jornadas antes [13 de abril] tinha-me estreado no campeonato, também numa goleada. Foi diante do Elvas (4-0 nas Antas). Entrei e marquei».

O primeiro golo de Domingos (1m25s):


ESTREIA DOS AVANÇADOS DA FORMAÇÃO A TITULARES NA LIGA

Fernando Gomes: 17 anos, 9 meses, 17 dias
. 13 épocas no clube, 451 jogos oficiais/355 golos

Domingos Paciência: 19 anos, 3 meses, 30 dias
. 12 épocas no clube, 379 jogos oficiais/142 golos

Toni: 19 anos, 3 meses, 8 dias
. 3 épocas no clube, 34 jogos oficiais/8 golos

Hélder Postiga: 19 anos, 10 dias
. 6 épocas no clube, 165 jogos oficiais/48 golos

Hugo Almeida: 21 anos, 5 meses
. 4 épocas no clube, 50 jogos oficiais/4 golos

André Silva: 20 anos, 4 meses, 11 dias
. 1 época no clube, 9 jogos oficiais/sem golos *

* a decorrer

«Pressão? Estar em boa forma todos os jogos»

Domingos Paciência – 379 jogos/142 golos no FC Porto, 18 troféus coletivos, melhor marcador da Liga 95/96. A legitimidade de um goleador, expressa em números e revista nas palavras.

Qual o impacto do primeiro jogo na equipa inicial do FC Porto? O que terá sentido André Silva no passado fim de semana, diante do Nacional?

«Aquela camisola pesa muito. Acarreta uma responsabilidade muito grande», acentua Domingos, considerando que as várias épocas de dragão ao peito na formação podem atenuar as dores de debutante.

«Sim, felizmente fiz a minha formação no FC Porto e fui amadurecendo a ideia de que um dia iria estrear-me na equipa principal. Isso ajudou a diminuir aquele primeiro impacto».

Os adeptos esperam golos e grandes exibições dos meninos do clube. André Silva, como Gonçalo Paciência na época anterior, elevam os níveis de entusiasmo do tribunal do Dragão. Como lidar, então, com essa pressão vinda do exterior?

«Estando em boa forma todos os jogos», sintetiza Domingos.

«A pressão é essa. E um atleta jovem, vindo da formação e português, sabe bem o que é a grandeza do FC Porto. Na hora da estreia isso pode manifestar-se em algum nervosismo e retirar discernimento».

«Gonçalo e André têm qualidade para ser a dupla do FC Porto»

Gonçalo Paciência esteve muito perto de se antecipar a André Silva nesta lista. O filho de Domingos fez um jogo para a Liga – derrota em casa do Marítimo -, mas começando no banco de suplentes. Titular só em jogos da Taça da Liga.

O que dirá Domingos a Gonçalo no dia em que se estrear a titular no FC Porto para o campeonato?

«O que mais lhe digo é que tem de fazer tudo igualzinho ao que fazia nos juvenis, nos juniores ou na equipa B. Foi por isso que o escolheram. Não é tentando fazer algo de muito diferente que ele vai afirmar-se», considera Domingos Paciência.

«No dia do exame ele não pode mudar nada», sentencia a glória portista, satisfeito por ver André Silva a entrar nas escolhas iniciais de José Peseiro.

«Este é o momento ideal para se olhar para a formação com outros olhos e aproveitar o que se tem de bom. Não é por acaso que o FC Porto tem tantos jogadores emprestados a clubes da I e da II Liga», sublinha Domingos Paciência.

E se, 28 anos depois de Domingos fazer dupla com Fernando Gomes no ataque do FC Porto, André Silva e Gonçalo repetissem uma parelha totalmente nacional?

«Qualidade têm. É possível fazer uma dupla com jogadores portugueses. Há que lhes dar tempo e jogos para crescerem como jogadores. Não se pode dar apenas um ou dois jogos e fazer um exame com base nesse pouco tempo de jogo», regista Domingos, pedindo «cuidado e critério» na gestão da carreira destes atletas.

Depois de Fernando Gomes e Domingos, nomes unânimes no léxico azul e branco, surgiu timidamente Toni, embalado pelo título mundial de Sub20, em 1991. Uma década depois, Hélder Postiga e Hugo Almeida. André Silva surge agora, com Gonçalo Paciência a ameaçar.

Uma linhagem fina e rara: pontas de lança formados e lançados pelo FC Porto nos seniores.