«Era um jogador da treta. (...) Sinto-me muito melhor na pele de treinador do que de jogador».

A frase pertence a Rui Vitória, não foi dita assim, de seguida, mas com algumas considerações pelo meio. Contudo, acaba por resumir bem as ideias próprias do treinador do Benfica sobre a sua carreira, a forma como chegou a treinador e como escalou até se sagrar bicampeão nacional.

Neste ponto, de resto, Vitória começou com um aparte: «Não me revejo na história do campeão nacional.» Falava, naturalmente, do convite para falar sobre esse assunto, esta tarde. «Por vezes conquistamos o título, mas há trabalhos mais valiosos do que a de campeão nacional. Há manutenções, subidas, que são extremamente importantes e se calhar mais determinantes», afirmou, arrancando um aplauso espontâneo de uma plateia recheada de treinadores.

Depois, Rui Vitória falou então da sua evolução como técnico. «Acabei de jogar numa segunda e na terça-feira já era treinador no Vilafranquense. Os primeiros dois anos foram difíceis. Terminando essa fase tive convites para continuar trabalhar no futebol sénior, mas achei importante perceber algo mais de futebol de formação. Estive dois anos do Benfica. Depois voltei Fátima», descreveu.

«O que me fez treinador foi a mistura da base teórica e pratica, porque fiz a licenciatura em Educação Física e fui jogador. Mas antes de acabar nunca me quis colocar no trabalho dos treinadores», garantiu.

Questionado sobre o seu estilo de jogo preferido, Rui Vitória lembrou que atuava como médio e, por isso, «gostava de jogar bem».

«Na altura só víamos a bola por cima de nós e eu queria ter a bola nos pés. Todos temos boas ideias no futebol. A minha ideia de jogo foi influenciada por muitos dos treinadores que apanhei. Tirei Educação Física mas dou por mim a fazer muitas coisas que muitos treinadores faziam», conta.

Rui Vitória confessou ainda que sempre considerou importante envolver-se nos contextos dos clubes que estava a representar. E deu um exemplo: «Quando vou para o V. Guimarães, podia ter continuado a viver em Paços. Mas fui viver para junto do complexo. Era só atravessar a rua. Queria viver naquele contexto, precisava disso.»

Salientando que sempre que chegou a um clube apanhou-o vindo de uma boa fase, com o caso do Benfica bicampeonato nacional a ser o mais mediático, Rui Vitória explorou a questão da envolvência nos contextos alargando-a ao modelo de jogo.

«Em determinados contextos foi mais a ideia que tinha, outras foi aproveitar as características dos jogadores que tínhamos. Não há uma receita para ganhar, há várias», sublinha. Mas garante que a ambição é a mesma, seja qual for o contexto, contando até uma história curiosa: «Num clube que não vou revelar, depois de uma derrota estava um pouco agastado e um senhor de uma certa idade disse-me: ‘porque esta tão preocupado por perder. Nós ganhamos 5 ou 6 jogos por ano…’. A verdade é essa, uma equipa que luta para não descer é assim, mas a ambição tem de estar lá.»

De resto, o treinador encarnado confessou que há três coisas que gostava que os seus treinadores tivessem consigo e tenta passar também para os jogadores: confiança, coerência e justiça. «Mas nunca conseguimos ser justos com toda a gente», sublinhou.

De qualquer forma, deixar uma marca num jogador é uma responsabilidade inerente a qualquer treinador, defende Rui Vitória.

«Que tipo de jogador quero que ele seja depois de trabalhar comigo? O que posso acrescentar àquele jogador para que ele leva alguma coisa de mim? Preocuparmo-nos com o filho, se está bem instalado, se a Sport TV já esta lá em casa. Um jogador sentindo-se bem de cabeça, o resto é mais fácil», defendeu.