«Campo retangular, bola redonda, não se pode usar as mãos. Ao fim de 90 minutos, ganham os alemães, os outros revoltam-se e os ingleses encolhem os ombros, dizendo que a verdadeira guerra foi ganha por eles em 1945.»

A conclusão histórica é de Pete Davies, escritor inglês, mas Gary Lineker viria mais tarde a popularizar o conceito. Nesta segunda-feira, quando Schurrle derrubou a resistência argelina, o antigo goleador recuperou num ápice a máxima. Argélia por terra em mais 120 minutos de grande qualidade no Mundial 2014. Segue-se a França.


Rabah Madjer, que anda nesta altura pelo Dubai, acreditou que a sua seleção poderia repetir a façanha de 1982, com nova surpresa frente à poderosa Alemanha (1-2). Porém, o antigo jogador do FC Porto assistiu a uma pobre imitação do seu golo na final da Taça dos Campeões Europeu. Andre Schurrle saltou do banco para reagir de forma improvisada ao cruzamento de Thomas Muller. 

Confira a FICHA DE JOGO  

O jogador do Chelsea entrou em campo ao intervalo, substituíndo o inoperante Gotze, mas teve de esperar pelo prolongamento para deixar a sua marca no encontro. Foi o 26º golo marcado por um suplente neste Mundial de 2014, demonstrando a crescente importância de um leque de escolhas alargado.


Os guarda-redes envolveram-se num duelo de titãs durante o tempo regulamentar. Rais Mbolhi (CKSA Sofia), nascido em França há 28 anos, foi uma muralha perante as ofensivas germânicas e terminou como Homem do Jogo para a FIFA. Porém, perdurará na memória coletiva o instinto de Manuel Neuer fora dos postes.    

Neuer saiu da área com incomum regularidade e tocou por 19 vezes na bola para lá dos habituais limites. No fundo, fez aquilo que sempre quis, já que em miúdo não desejava ser guarda-redes.



Perante uma Argélia acutilante nas transições ofensivas, aproveitando falhas no último reduto germânico, Manuel Neuer foi um líbero à imagem de Franz Beckenbauer, presidente honorário do seu Bayern Munique.


Os elogios foram chegando de todo o lado, incluíndo de alguns homólogos com nítidas preocupações sobre a exigência que passará a recair sobre eles. Bem Foster, guarda-redes internacional ingles, resumiu o sentimento.


Halliche (em fim de contrato com a Académica) e seus pares rebatiam as investidas germânicas, com Islam Slimani (Sporting) a comandar o ataque regular à baliza de Manuel Neuer. Ao minuto 89, como demonstração do equilíbrio que marcou o tempo regularmentar, o guarda-redes alemão viu-se obrigado a sair uma vez mais rapidamente dos postes para desarmar o isolado Feghouli.

Joachim Low chegou ao ponto de desespero e houve espaço para um truque pouco conhecido no livro alemão. Thomas Muller, geralmente frio e eficaz, abraçou um conceito duvidoso de jogada estudada.

Ao minuto 88, já sem grandes ideias, a seleção que goleou Portugal (4-0) conquistou um livre frontal. Vários jogadores à volta da bola, Schweinsteiger a esboçar um curioso sorriso e Muller a tropeçar porque sim, antes de partir para a área. Felizmente, os argelinos anularam o lance. E para a história fica apenas a parvoíce.


Chegou o justo prolongamento mas os homens de Vahid Halilhodzic, que terão iniciado o período de jejum do Ramadão no sábado, apresentavam já sinais de cansaço. No arranque do tempo-extra, Thomas Muller mostrou a melhor face e surgiu na área para assistir Schurrle. O passe saiu atrasado, para o pé esquerdo de Schurrle, mas este arriscou o toque ligeiro, já no limite, fazendo o que pode ou não ser um golo de calcanhar.

A Argélia parecia desistir. As pernas falhavam. Em cima da hora, após jogada de insistência, Ozil assinou o injusto 2-0. E ainda assim, a Alemanha não abandonou o relvado com o desfecho aparentemente tranquilo. Segundos mais tarde, Djabou reduziu a desvantagem e relançou o encontro. Infelizmente para a seleção africana, sem tempo para mais. O público, de qualquer forma, agradeceu. Mais um grande espectáculo neste Campeonato do Mundo de 2014.