Fafe vive momentos de euforia com a subida do maior clube da cidade à Segunda Liga. É o regresso ao profissionalismo 28 anos depois da inédita presença no escalão maior do futebol português.

Mal o apito final do play-off com o Casa Pia soou, a festa tomou conta dos fafenses que do estádio à Câmara Municipal não pararam de celebrar. A cidade não dormiu de sábado para domingo a festejar um feito de 2015/16 que não é semelhante ao de 1988/89, mas para quem é adepto e vestiu a pele de jogador nesta conquista é mesmo «um sonho».

«Já posso morrer que o sonho de uma vida está concretizado», brincou João Nogueira, médio e um dos capitães da AD Fafe.

Aos 30 anos, o fafense de gema viveu um dos melhores momentos da sua vida no clube do coração, onde fez a formação desde muito novo e que representa na equipa principal há 10 anos.

«Cada vez que vejo vídeos, fotos... começo a chorar e a arrepiar-me. Correu tudo bem, muito bem organizado...a festa foi linda. Na Câmara Municipal foi impressionante, nunca me apercebi que Fafe tivesse tanta gente, sinceramente, foi muito bonito», descreveu.

Em seguida definiu «mais a sério» o que significou para si esta subida: «É o culminar de muitos anos aqui no Fafe e de muito trabalho. Estou aqui há bastante tempo e esta subida foi um sonho, o culminar de muita coisa, o extravazar de muita coisa acumulada, e por ser daqui, tal como outros colegas, sentimos mais um bocadinho»

E concluiu: «É um dia que recordarei para sempre na minha vida. Inesquecivel!»

Quem também foi fundamental nesta conquista foi o médio ofensivo Landinho, o autor do golo que decidiu o triunfo na eliminatória frente ao Casa Pia.

O jogador rejeita protagonismo pelo golo e realça o coletivo: «Não me sinto herói, o herói fomos todos nós porque trabalhámos para isto. Eu só empurrei a bola para dentro das redes. O Fafe já merecia isto há muito tempo.»

O Fafe ficou no segundo lugar da fase de subida da zona Norte e por isso teve que disputar o play-off com o Casa Pia, equipa que ficou no mesmo posto mas na parte Sul do campeonato. Apesar de na teoria as equipas partirem em igualdade pela classificação, João Nogueira relembra algo que podia ser favorável aos lisboetas.

«Fizemos uma época fantástica, fomos a única equipa que não perdeu na fase de subida, andámos quase sempre em primeiro, mas acabámos por quebrar um bocadinho e fomos para o play-off um bocadinho desiludidos. Pelo contrário, o Casa Pia estava em êxtase [porque conseguiu na última jornada chegar ao segundo lugar]. Iamos nessa situação para o play-off, não sabiamos o que podia acontecer mas o jogo lá acabou por correr bem e trouxemos um bom resultado. Em Fafe sabemos que é muito difícil ganharem-nos e com a envolvência de tudo, com o ambiente, a nossa concentração e dedicação sabíamos que íamos conseguir.»

O primeiro jogo realizou-se em Pina Manique e foi naquele estádio que foi marcado o único golo da eliminatória, já que na segunda mão houve nulo. Como já referido, Landinho marcou o tento decisivo.

Foi através de uma grande penalidade e o jogador confessa que não tremeu: «Nunca tinha batido um penálti num jogo tão importante, mas não senti pressão. Peguei na bola e disse mesmo: «Seja o que deus quiser» e correu bem, ainda bem.»

Landinho ao serviço do Fafe

Esse golo permitiu ao Fafe gerir a eliminatória em casa e com o apoio do público o objetivo foi conseguido, referem os dois médios. Ambos deixaram uma mensagem de agradecimento aos adeptos do clube fafense.

«Quero agradecer a todos os adeptos do Fafe que foram incansáveis durante a época. Chegar ao último jogo e ver o estádio cheio foi qualquer coisa. Ajudaram-nos e deram mais força e tudo correu bem. A subida é dedicada a eles», disse Landinho.

João Nogueira acrescentou: «Os adeptos e sócios acompanharam-nos sempre durante a época e neste jogo foi um pouco mais porque decidia tudo. Aproveito para deixar uma palavra de apreço aos adeptos e à claque que foram incansáveis. Durante a época não tivemos muitos momentos maus, mas houve um momento em que quebrámos e acabámos por não depender de nós para o primeiro lugar. Após o empate com o Pedras Rubras, lembro-me perfeitamente de chegar a Fafe e ter uma receção muito boa, sempre impecáveis. Esta subida não é dos jogadores, da equipa técnica, da estrutura, deve-se muito à força e ao muito apoio que eles nos deram.»

O jogador e capitão do clube não se cansa de elogiar os adeptos e deixa uma ideia curiosa sobre o facto de ter sido necessário disputar o play-off por ter perdido o primeiro lugar perto do fim para o Vizela: «Nos últimos anos, o Fafe para atingir algo tem que sofrer, tem que passar por muita coisa e este ano acabou por correr tudo bem, mas o sofrimento foi até ao fim.»

'O Maestro' Rui Costa, o adepto especial e a camisola que «cheira um bocadinho mal»

Neste play-off, o Fafe levou muitos adeptos até Lisboa para a primeira mão e entre eles estava um muito especial: Rui Costa.

O agora dirigente do Benfica e outrora craque dos «encarnados» esteve em Pina Manique a ver o jogo e porquê? Rui Costa jogou no Fafe na época 1989/1990, temporada seguinte à despromoção da Primeira Liga e desde então ficou adepto do clube. Marcou presença no estádio e no final desceu ao balneário, onde teve um papel fundamental na eliminatória, diz João Nogueira.

«No fim do jogo estávamos contentes, não eufóricos, mas contentes porque sentimos que aquela vitória podia levar-nos à subida. Quando ele entrou o pessoal ficou um bocado apreensivo, sem saber o que fazer, e lembro-me das palavras dele. Disse-nos que não nos ia dar os parabéns porque nada estava conseguido. Nós acabámos por levar aquilo à letra e desde já agradeço a presença dele no estádio e por ter posto água na fervura.»

João tem 30 anos e não se lembra de ver Rui Costa com a camisola que hoje veste. Era muito jovem, mas conta como é visto Rui Costa em Fafe: «É um ídolo que durante as nossas infâncias nos habituamos a ver. Havia muito pessoal em Fafe que admirava o Rui e sabíamos que ele tinha uma ligação próxima com o nosso treinador que chegou a jogar com ele. Sabemos que ele sentiu muito este clube.»

Falar de Rui Costa é falar de um ídolo e no caso de João Nogueira é falar de camisola 10 para camisola 10. Naquele final de jogo ganhou uma recordação para a vida: «Ele assinou na parte frontal da minha camisola e essa camisola guardei-a. Não a lavei e joguei com ela no jogo da subida, não sei se o árbitro viu ou não (risos), certo é que joguei e está aqui a cheirar um pouquito mal (risos), mas não a lavo, vai ser para encaixilhar.»

Rui Costa assina a camisola de João Nogueira

Landinho, que é o médio ofensivo e estrela da equipa, teve direito a autógrafo também e revelou mais uma parte do discurso de Rui Costa: «Toda gente ficou contente por ver uma figura do futebol português, o nosso maestro, foi muito bom. Ele disse que esperava que ganhássemos e que gostava de festejar a vitória do Fafe, onde quer que estivesse.»

E agora, Fafe?

Apenas uma vez o Fafe esteve na Primeira Liga e é mais do que um sonho que isso volte a acontecer, diz João Nogueira, mas há vontade e ambição das partes diretivas em torná-lo realidade.

«Pelo que foi dito pelo nosso presidente, pelo presidente da Câmara e pelos vereadores sei que têm o objetivo de o conseguir a curto prazo, não imediatamente mas a curto prazo. Acredito que o Fafe vai ganhar alicerces e estabilidade porque este é um campeonato totalmente diferente e assim a curto médio prazo claro que pode chegar lá, porque tem estrutura para isso.»

Landinho está no seu primeiro ano em Fafe, mas já afirma que é uma questão de mérito o clube estar nos escalões profissionais: «O Fafe é um grande clube que já merece há muitos anos estar no futebol profissional. Tem que ir com calma, deve garantir primeiro a estabilidade na Segunda Liga, mas toda gente tem a ambição e gostava de pôr o Fafe na Primeira.»

O médio de 23 anos é um dos poucos do plantel que já esteve na Segunda Liga, ao serviço do Portimonense, embora a experiência não tenha corrido muito bem. Será que vai continuar em Fafe para se assumir? «Tive no Portimonense e não joguei muito, não tive tantas oportunidades como queria e o ano passado fui para o Amarante para jogar mais, mas tive uma lesão nos ligamentos que me estragou a época toda. Vim para aqui esta temporada e foi muito bom. Acabámos de festejar na segunda-feira e vou descansar. Depois vou falar com as pessoas.»

Independentemente da continuidade em Fafe, Landinho tem uma certeza: «Fazer tudo o que fiz após a recuperação e no final festejar assim foi memorável, vou guardar para a vida.»

Quanto a João Nogueira, que joga no seu clube do coração, tem alguma dificuldade para expressar o que sentiu com esta subida. E se fosse uma subida à Primeira Liga, João?

«Não sei se um dia vou conseguir ver isso outra vez [clube na Primeira Liga], mas claro que seria um dia muito especial. Só que viver algo como o de sábado... ufa! Tinha a noção que uma subida era uma coisa muito bonita, mas não pensei que fosse assim, que chorasse tanto, que me arrepiasse tanto, que me tocasse tanto… não tinha esta noção. Olho para trás e sei que vai ser um dia que vou recordar para sempre.»