Esta é uma história real que envolve um clube, uma adepta e um antigo jogador. É uma história com futebol, portanto. Mas não é só. Tornou-se também num gesto de solidariedade; mais, de humanidade. É uma história em que a dura realidade cruza uma mulher de 85 anos que foi desalojada da sua casa e um antigo futebolista que tem um cancro.

Parte da história já teve um final animador. A outra parte está a acontecer, naquilo que depende das capacidades humanas, sejam elas de generosidade, altruísmo ou médicas.

Carmen Martínez é a mulher de 85 anos, a adepta do Rayo Vallecano. Em novembro passado, foi desalojada da casa onde vivia, em Vallecas. Aconteceu-lhe o que a muitos compatriotas espanhóis aconteceu nos últimos tempos. A situação indignou os seus vizinhos. A situação comoveu o Rayo Vallecano e seus aficionados.



A indignação e a comoção transformaram-se em solidariedade, numa corrente humana que teve o Rayo Vallecano como condutor. Como se viu, o treinador da equipa de futebol deu o mote: «Não vamos ficar parados. Vamos ajudar». Nas bancadas, os adeptos assumiram «o Rayismo contra os desalojamentos». E a hashtag #CarmenSeQueda foi anunciada pelos grito de «sim, pode-se».

As receitas de bilheteira foram também apenas outro mote. A Fundação Rayo Vallecano promoveu uma iniciativa chamada «fila zero» para recolha de dinheiro que permitisse à octogenária, que tinha deixado de conseguir pagar a renda e que não tinha sítio onde viver, «voltar a ter um tecto».
 


Foram angariados 21.106 euros e 90 cêntimos. Foi mais do que suficiente para que Carmen Martínez deixasse de ser desalojada e voltasse a ter casa para viver. «Muito obrigado a todos pelo que fizeram por mim», agradeceu a vallecana «muito contente». Mas não se ficou por aqui. Não ficou pela parte animadora da sua história.

«Todos temos que fazer coisas boas», afirmou Carmen Martínez quando, na sexta-feira, recebeu dos dirigentes do Rayo Vallecano o cheque que vai repartir com outros. O dinheiro angariado dobra o valor que Carmen Martínez precisava. Por isso, a octogenária decidiu doar metade ao ter tomado «conhecimento de que havia um rapazito que estava mal».

Esse «rapazito» é Wilfred Agbonavbare, antigo guarda-redes do Rayo (entre 1990 e 1996). Wilfred tem um cancro «severo», de acordo com a comunicação social espanhola. Antigo internacional da Nigéria (suplente de Peter Rufai no Mundial 1994), internado num hospital espanhol. «Está muito mal e o seu único desejo é ver os três filhos que estão na Nigéria e que não vê há mais de 10 anos», referiu o presidente do Rayo, Raúl Martin Presa.

Carmen Martinez contou assim por que teve «muita pena» e por que decidiu repartir desta forma o dinheiro que excedia as suas necessidades: «Para que a sua família possa vir.» O clube já encetou diligências com as autoridades espanholas para agilizar a ida dos três filhos de Wilfred da Nigéria para Espanha.

E os dirigentes do Rayo salientaram também que Carmen Martínez «ficou apenas com o dinheiro de que precisava». A mulher de 85 anos, que ainda dizia não merecer «isto tudo», no meio da sua figura «tímida», lembrou que «fazer coisas boas é o mais bonito que pode haver e ainda mais com os pobres». Falta o resto da história, a de Wilfred. A de Carmen deixou este exemplo.



E, depois de #TodosConCarmen, a hashtag passou a ser #FuerzaWilfred, como já aconteceu neste sábado em conjunto com o At. Madrid.