As ironias da história levaram a que vários séculos depois o trono britânico ficasse nas mãos de um escocês de nascimento – a transposição temporal é grosseira na enunciação, mas é também constatável quando se fala de ténis. Andy Murray voltou a colocar os britânicos no topo da modalidade com a vitória em alguns dos principais torneios do circuito. Como há largas décadas não acontecia. Neste domingo, o nº2 do mundo esteve à cabeça do triunfo da Grã-Bretanha na Taça Davis. Para dar um reinado perfeito aos seus súbditos, já só faltará a Murray chegar ao primeiro lugar do ranking.

Essa conquista do rei do ténis britânico prevê-se muito difícil num curto-prazo – ou não fosse preciso destronar o super-Novak Djokovic (que tem quase o dobro dos pontos neste defeso tenístico). Mas, ao mesmo tempo que o sérvio se mostra inacessível a qualquer dos rivais do presente que queira tomar o seu lugar como líder da tabela mundial, nenhum outro britânico esteve mais perto do que Murray de voltar a ser o nº1 – voltando ao relógio das décadas para encontrar o último.

A vitória da Grã-Bretanha liderada por Andy Murray na Taça Davis cuja final terminou neste domingo na Bélgica pôs fim a um jejum de 79 anos que os britânicos estiveram sem levantar a saladeira. Há dois anos, o tenista de 28 anos nascido em Glasgow fez o mesmo quando venceu em Wimbledon. No ano anterior, tinha-o feito com o triunfo no US Open antecedido da vitória nos Jogos Olímpicos Londres 2012.



O triunfo olímpico é o que maior jejum quebrou; até pelo interregno que o ténis sofreu como modalidade olímpica entre 1928 e 1984. Os britânicos conquistaram as duas primeiras medalhas de ouro – Atenas 1896 (John Pius Boland) e Paris 1900 (Laurence Doherty) – e a da quarta olimpíada – Londres 1908 (Josiah Richie). E a Grã-Bretanha ficou-se por aí até os Jogos voltarem à capital de Inglaterra há três anos e o escocês fizesse ouvir o «God Save the Queen» no ténis.

Foi o início para Murray na sucessão ao inglês Fred Perry, o maior jogador de sempre da história do ténis britânico – uma história feita há mais das tais sete décadas. Ainda em 2012, o escocês voltou a colocar os britânicos na rota do Grand Slam ao vencer o US Open e quebrou o jejum britânico de 76 em relação as vitórias num «major». Perry ganhou oito «majors» (só contando os triunfos em singulares) entre 1934 e 1936. Até Murray, a Grã-Bretanha não mais ganhou algum.

Ao ano da estreia, o escocês ganhou (provavelmente) o troféu mais ambicionado por si e por qualquer britânico. Andy Murray venceu o torneio de Wimbledon em 2013 – acabou o jejum britânico de 77 anos que datava desde o tal anos de 1936, desde a última vitória, precisamente, de Fred Perry.



Andy Murray tem agora no currículo a vitória na Taça Davis, nos Jogos Olímpicos, no US Open e em Wimbledon. Foi finalista vencido por quatro vezes no Open da Austrália, na Hopman Cup e na final olímpica de Londres 2012 nos pares (não tendo conseguido melhor em Roland Garros do que as meias-finais por duas vezes). O escocês é o nº2 do mundo, posição que é sua desde o dia 9 deste mês e que ocupou pela primeira vez em 17 de agosto de 2009.

O jejum aberto desde Fred Perry no plano do ranking ainda não foi batido. O lendário tenista da década de 1930 dominou no seu tempo. Até 1972/73, com a fundação do ATP e do seu ranking, a avaliação dos tenistas era feita pelo desempenho anual. Perry este no topo pela primeira vez em 1934 e pela última em 1941. Após a criação a tabela ATP, nenhum britânico ocupou o lugar mais alto.

Tim Henman e Greg Rusedski forma os que estiveram mais perto do pódio, mas qualquer deles não passou do quarto lugar da tabela. Rudeski chegou a 4º em 6 de outubro de 1997; Henman em 8 de julho de 2002. E pouco mais fizeram na história mais rica do ténis. Rusedski ainda conseguiu chegar à final do US Open em 1997 – de forma semelhante como John Lloyd (21º lugar do ranking como o seu melhor em 1978) tinha conseguido em 1977 na Austrália – mas, entre Perry e Murray nada mais de britânico houve de significativo.

Andy Murray voltou a dar o orgulho e a esperança que o ténis britânico almejava de há sete décadas para cá. Esta final também isso refletiu quando uma nação depositou no seu jogador a maior responsabilidade de ser o mais decisivo para ganhar o troféu. Murray não desiludiu. Ganhou o seu encontro de singulares na sexta-feira, jogou o par com o seu irmão Jamie no sábado para dar a vantagem aos britânicos e, neste domingo, cumpriu o que lhe era pedido por quem jejuava há 79 anos: venceu o duelo com o nº11 belga, David Goffin, não deixando que qualquer dúvida ficasse por decidir num quinto encontro que já não dependesse de si.