*Com NUNO DANTAS

O dia 22 de novembro de 2015 entra direitinho para o livro de ouro do Amarante FC, um emblema com mais de 90 anos de história mas parcos feitos de alcance verdadeiramente nacional. Eliminar o Marítimo é um feito sem paralelo na história do clube do distrito do Porto, que assim se junta a um grupo cada vez menos restrito: já são quase 100 os tomba-gigantes da história da chamada prova-rainha do futebol português.

A equipa orientada por Pedro Pinto fez tombar o conjunto insular com um golo solitário de Miguelito. Foi preciso sofrer mas também é de sofrimento que se fazem os campeões, como é usual dizer-se.

Assim, ganha o estatuto de única equipa do Campeonato de Portugal entre os 16 melhores da edição deste ano. Nunca o Amarante tinha chegado aos oitavos de final.

No final do embate, o treinador deu logo conta do sentimento que vigorava: «Deve ser visível nas nossas caras, minha, dos jogadores, dos adeptos, que é com imensa alegria que fazemos história no nosso clube.» Faz sentido. Apesar de contar com três títulos da antiga III Divisão Nacional, o feito de agora dará, certamente outra dimensão ao clube.

Aliás, Miguelito, o herói, até por ser um homem da casa (está no Amarante desde os 6 anos), também não escondia o estado de espírito. Radiante, pois claro.


Miguelito, o herói, em ação (Foto: Agência Lusa)

Faz dupla de ataque habitualmente (e no jogo deste domingo) com Cesinha, um nome bem conhecido do futebol português. O brasileiro que despontou no Sp. Braga há mais de dez anos, está no Amarante desde janeiro. Tem, atualmente, 35 anos. É, em suma, dos mais habituados a tardes de festa como a de domingo, entre o plantel.

Em conversa com o Maisfutebol, após o jogo, Cesinha assumiu que a pressão foi semelhante a muitas outras vezes numa já longa carreira. Mas o sabor foi especial.

Diferente, mas especial. « Não tivemos tantas oportunidades como nos outros jogos, mas do outro lado estava uma equipa de I Liga. Tivemos dificuldades, tivemos de jogar com consciência. Aproveitámos a oportunidade que tivemos e depois conseguimos segurar lá atrás. Foi um jogo de muita luta e estamos de parabéns até por isso», analisou.

Cesinha faz uma análise lúcida à batalha que o seu Amarante teve de travar antes da festa. Tem muito futebol nas pernas, jogou no Brasil, Roménia, Grécia e Chipre, além de Portugal, claro. Caminha para ser treinador. Mas não para já.

«O profissionalismo que sempre tive ajuda-se a poder continuar a treinar bem, a jogar e a fazer o meu trabalho», explica. Mas um dia terá de parar, sabe bem, até porque não pensa jogar até aos 40. Estará dentro das quatro linhas enquanto «tiver condições».

«Miguelito podia estar a jogar na Liga»

Para já, contudo, é o feito do Amarante que domina o discurso. O avançado sublinha que a equipa foi obrigada a trabalhar muito «sem bola». Algo a que não está habituada.

«Pela qualidade do Marítimo, que está numa boa posição na Liga portuguesa, sabíamos que só poderiam vir jogar para ganhar. Por isso, primeiro tínhamos de nos preocupar com a parte defensiva e só depois com o ataque. Tivemos uma oportunidade, numa infelicidade do central, e conseguimos aproveitar»
, descreve.

Mérito de Miguelito. Cesinha aprova o talento de 25 anos, totalmente made in Amarante.

«Não digo que está desperdiçado aqui, mas desde que cheguei já lhe disse que é um grande jogador. Poderia estar na I Liga portuguesa, sem dúvida nenhuma. É muito inteligente e mostrou isso hoje. Aliás, já mostra desde que o conheço. Outros clubes deviam olhar um pouco para ele. Tem todas as qualidades: técnica, inteligência, leitura de jogo e merece estar num campeonato de Liga. Precisa desse incentivo. Torço por ele. É trabalhador, humilde, tem personalidade dentro do campo», considera.

O próprio Miguelito, no final do encontro, falou da possibilidade de ter dado nas vistas para outros clubes. «Este jogo pode ter aberto horizontes», comentou, salientando que, contudo, o pensamento está no Amarante.

«Estou aqui desde os meus seis anos, sinto-me bem e estou bem cá. Claro que se houver um convite para outras equipas, não posso pôr de parte. Dizem que temos de sair da nossa zona de conforto, mas quando nos sentimos bem num sítio, deixamo-nos ficar. Eu sinto-me bem cá», garantiu.

E Cesinha também. Veio do Chipre e fez questão de ficar em Portugal para estar perto da filha. Ficou alguns meses sem jogar à espera que o telefone tocasse. «Queria jogar na I Liga, mas a mentalidade de alguns clubes é difícil. Quando estive no Sp. Braga aconteceu o mesmo com alguns jogadores que tinham a idade que tenho agora», lamenta.

Apareceu o Amarante e não deixou passar a oportunidade: « Aqui quero dar o exemplo dentro e fora do campo. Tendo em conta onde já joguei tenho de mostrar muito. Não funciona ao contrário, porque depois as pessoas começam a comparar e a cobrar.»



A festa do Amarante (Foto Agência Lusa)

Desp. Aves é tomba-gigantes a dobrar

Em duas eliminatórias com emblemas na Liga principal, já se registaram seis duelos favoráveis a equipas de escalões inferiores, três na 3ª ronda e outros tantos na atual. A grande novidade é então a entrada do Amarante. Mas os dados a reter não ficam por aqui.

Outro ponto curioso é o Desp. Aves é tomba-gigantes a dobrar. Depois de deixar pelo caminho o Moreirense, na ronda anterior, afastou, agora, o U. Madeira. Foi a nona vez que festejou frente a um clube da Liga na prova rainha, igualando os registos dos maiores especialistas até então: Famalicão e Gil Vicente, que afastou o Tondela (caiu à primeira tentativa) na ronda anterior, ambos com nove triunfos.

Os outros «Davides» desta edição da Taçla foram o Penafiel, que afastou o V. Guimarães (continua a ser a equipa que mais vezes cai perante os pequenos – já são 17), e o Portimonense que infligiu a 11ª eliminação do Belenenses às mãos de um «pequeno». Com um dado importante: nunca os do Restelo afastaram um clube da Liga durante as suas incursões pelos escalões secundários.

Os 16 apurados para os oitavos de final

Todos os tomba-gigantes na história da Taça

Famalicão, 9/0*
Gil Vicente, 9/8
Desp. Aves, 9/1
V. Setúbal, 7/10
E. Amadora, 6/2
Tirsense, 6/2
Sp. Espinho, 6/3
Olhanense, 6/5
Estoril, 6/7
Penafiel, 7/8
Feirense, 5/1
Chaves, 5/6
Académica, 5/15
Torreense, 4/1
Moreirense, 4/2
Portimonense, 5/3
U. Leiria, 4/4
Barreirense, 4/6
Varzim, 4/8
Marítimo, 4/11
Arouca, 3/0
Odivelas, 3/0
Vila Real, 3/0
Dragões Sandinenses, 3/0
Juventude Évora, 3/0
Cova da Piedade, 3/0
Sanjoanense, 3/1
Vizela, 3/1
Naval, 3/2
Sp. Covilhã, 3/3
Atlético, 3/4
P. Ferreira, 3/6
Leixões, 3/6
Salgueiros, 3/7
Santa Maria, 2/0
Oliveirense, 2/0
Bragança, 2/0
Ac. Viseu, 2/0
Vasco da Gama, 2/0
Sacavenense, 2/0
U. Coimbra, 2/0
Ol. Moscavide, 2/0
Lusitânia de Lourosa, 2/0
Leões de Santarém, 2/0
Fafe, 2/1
Felgueiras, 2/1
U. Madeira, 2/3
O Elvas, 2/3
Boavista, 2/7
Farense, 2/8
Beira Mar, 2/9
Oriental, 1/0
Alcochetense, 1/0
Mirandela, 1/0
Freamunde, 1/0
Valenciano, 1/0
Maia, 1/0
Ribeirão, 1/0
Tourizense, 1/0
Lixa, 1/0
Ol. Hospital, 1/0
Gondomar, 1/0
Esposende, 1/0
Ovarense, 1/0
Louletano, 1/0
Valonguense, 1/0
Valadares, 1/0
Silves, 1/0
Cartaxo, 1/0
Torralta, 1/0
O. Douro, 1/0
Peniche, 1/0
Riopele, 1/0
Marinhais, 1/0
E. Portalegre, 1/0
Alcobaça, 1/0
Esp. Lagos, 1/0
Cabeça Gorda, 1/0
Paredes, 1/0
Merelinense, 1/0
Vianense, 1/0
U. Lamas, 1/0
Lordelo, 1/0
U. Santarém, 1/0
Lamego, 1/0
Sesimbra, 1/0
Alhandra, 1/0
Amarante, 1-0
CUF, 1/1
Leça, 1/1
Alverca, 1/1
Carcavelinhos, 1/1
Santa Clara, 1/2
Amora, 1/2
Nacional, 1/3
Rio Ave, 1/7
V. Guimarães, 1/17

* O primeiro número é o total de vezes que, jogando em escalões secundários, afastou equipas de primeira. O segundo é o total de vezes em que, estando na I divisão, foi vítima de tomba-gigantes.