Tomba-gigantes.
A fonética da palavra parece trazer agarrada àquela palavra composta o estrondo de algo a cair no chão.
O verbo a funcionar como primeiro impacto, o substantivo como o eco que se prolonga e dissipa na História do futebol português, que a partir deste domingo conta com 103 tomba-gigantes.
O Vilafranquense é o mais recente deles, mas o que a IV eliminatória da prova de 2016/17 nos trouxe foi uns tomba-gigantes modernos, muito diferentes do modelo típico e tradicional, como tentou ser o Aljustrelense.
O futebol mudou e embora a Taça continue uma festa e o jogo em si uma paixão para os adeptos, o «tomba-gigantes» começa a ser o que não era, entre clubes-ponte e dinheiro chinês.
Uma hora e meia depois do jogo, os Piranhas do Tejo ainda bebiam umas cervejas e entoavam cânticos de apoio à equipa. Esse era o lado jovial e romântico do futebol em Vila de Franca de Xira, onde caiu o Paços de Ferreira.
No lado oposto, o triunfo acrescentou pontos à notoriedade do negócio que se desenvolve na UD Vilafranquense e que todos os domingos entra em campo.
Um negócio às claras, diga-se:
«O propósito desta SAD é a valorização dos jogadores para tentar vendê-los. Em três anos subimos duas vezes. O projeto ainda não é autossustentável, mas acreditamos que vamos chegar lá. Isto tudo sem esquecer a formação. Hoje jogámos com dois juniores durante noventa minutos. E a este nível não temos um departamento de comunicação como o nosso. Temos uma televisão e uma revista, a Alma Vilafranquense.», o presidente da SAD, Rudolfo Frutuoso, em declarações após a partida
A UD Vilafranquense assume-se como um clube-ponte. Um projeto semelhante ao que a Traffic faz no Estoril, conforme explicado no Maisfutebol, quando os ribatejanos defrontaram o Sporting.
LEIA AQUI toda a reportagem sobre o Vilafranquense.
Um ano depois, voltam a ter tempo mediático, agora por igualarem «o feito de Rui Vitória, chegar aos oitavos de final», como recordou o presidente da SAD.
O treinador do Benfica tinha, em 2003/04, levado os ribatejanos às Antas, para defrontar o FC Porto, de José Mourinho. Essa viagem não se realizará agora, mas Sporting e Benfica «vivem» perto.
«Não estamos obcecados com um “grande”. Já defrontámos o Sporting na época passada. As pessoas gostam, claro, mas não estamos obcecados. Queremos ir o mais longe possível. Se nos calhar um grande haverá transmissão televisiva e o nosso campo não tem condições para tal. Nesse sentido, se for esse o sorteio, que seja no estádio do “grande”.», Rudolfo Frutuoso
A proximidade com Lisboa também permite que algumas pessoas com visibilidade futebolística facilmente vejam o projeto da UD Vilafranquense.
Esta tarde estiveram por lá Lito Vidigal (treinador do Arouca, que joga com o Paços na próxima jornada), Paulo Gonçalves (assessor do Benfica) e Luís Boa Morte (colaborador do Arsenal).
Foram apenas três entre os 1568 espectadores presentes no estádio. E outros que para lá espreitaram, de cada vez que passou um comboio. A linha fica ali mesmo ao pé ao campo e a Taça de Portugal ficou resvés com a vida de viajantes. Tal e qual as vitórias do Vilafranquense e o lado comercial o clube.
Primeiro a liga chinesa em Portugal, agora a Taça
O Torreense já não é novo nestas andanças. Já ganhou o direito a ser chamado de tomba-gigantes por cinco ocasiões. A última coincidira, precisamente, com a derradeira receção a um clube da Liga antes deste domingo.
O Nacional caiu no Manuel Marques como caíra o Gil Vicente em 2010/11. Por 1-0, com um golo a acabar.
Entre um momento e o outro muitas coisas mudaram.
Marçal, por exemplo.
Hoje está ligado ao Benfica, emprestado ao Guingamp, depois ter representado os dois clubes em duelo nesta tarde. Frente ao Gil Vicente, era o lateral-esquerdo do emblema de Torres Vedras.
Ainda assim, a transformação mais notória aconteceu na SAD. Comprada no ano passado por Qi Chen, empresário chinês, proprietário também do Oriental Dragon FC: era este emblema que jogava na «liga chinesa» que aconteceu em Portugal.
O Torreense não é só um histórico do futebol português. Hoje em dia é o clube em que atua Tiago Esgaio, irmão do lateral do Sporting, e uma antiga promessa do Benfica, como é Hélio Vaz.
E é também o emblema de cinco jogadores chineses, ali colocados por Qi Chen.
LEIA AQUI toda a reportagem sobre o projeto de Qi Chen.
Uma semana após se terem defrontado no Campeonato de Portugal, Torreense e Vilafranquense fizeram história em conjunto, com a Taça de Portugal, a prova rainha, também ela a «render-se» à vicissitudes do futebol moderno.
* O primeiro número é o total de vezes em que, jogando em escalões secundários, afastou equipas de primeira. O segundo é o total de vezes em que, estando na I divisão, foi vítima de tomba-gigantes. Há vários clubes, como Benfica, FC Porto e Sporting que já foram eliminados por equipas de divisões inferiores, mas que, tal como outras (ex: o Sp. Braga) nunca eliminaram um clube da Liga, quando militavam nos escalões secundários.