A vida tem passado a correr por Tiago Cintra. Natural de um bairro popular e problemático de Matosinhos, o atleta já viu mais do que queria ver. Cresceu demasiado depressa, sofreu as agruras de uma educação parental desinteressada e viveu tragédias constantes com a perda de amigos próximos.
Em entrevista ao Maisfutebol, partilha vivências de um passado que o colocou à prova. Tiago soube resistir à tentação e ao lado lunar da vida. Hoje, com 20 anos, representa o clube do coração e tenta dar o exemplo. Jovem humilde, contornou as dificuldades maiores e agarrou-se à tábua de salvação: o futebol.
É de um bairro muito popular em Matosinhos, o Bairro da Biquinha. Como é que foi a sua infância/adolescência?
Foi muito difícil. Os meus pais deram-me uma educação muito má. Olhava para os meus amigos, via-os seguir por maus caminhos mas sabia que não podia fazer o mesmo. Optei pelo futebol e foi o futebol que me salvou.
«Estar aqui é um sonho realizado»
Se não fosse o futebol, o Tiago teria também optado pelos piores caminhos?
Se calhar... Isso depende da cabeça de cada um. Mas se não fosse o futebol, talvez optasse por outra coisa boa. Acho que nunca faria o que eles fizeram. Mas quem sabe...
Tem muitos exemplos negativos nos seus amigos de infância?
Tenho muitos exemplos desses. Um deles morava praticamente em minha casa. Era amigo do meu pai também. Foi para lá e alguns dias depois teve um acidente de moto e morreu. Outros estiveram presos, saíram e nem me reconhecem às vezes, porque eu era muito pequeno quando eles foram para a cadeia. Mas agora estou a jogar na primeira divisão e eles dizem-me «afinal conseguiste!» São vidas difíceis.
«Parecido com o Ronaldo? Só nos livres»
Ainda vive na Biquinha. Tenta falar com esses amigos e puxá-los para o lado bom da vida?
Todos os dias. Eu vou para casa e eles estão em grupo. Chamam-me sempre e eu digo-lhes para eles se acalmarem, para se afastarem desse tipo de vida, pois qualquer dia são eles a morrer. Mas levam isso na brincadeira, infelizmente.
O Tiago transporta para o relvado um bocadinho dessa rebeldia e irreverência que adquiriu no seu bairro?
Transporto, sem dúvida. Aquele futebol de rua, com raça. Por isso dizem que sou muito rebelde. Aprendi muito a jogar no bairro.