É hoje. Daqui a umas horas entramos todos em modo Mundial. Se até hoje o assunto ainda não entrou nas nossas cabeças, a partir do final da tarde todos nós vamos fazer prognósticos, avaliar hipóteses e avançar candidatos. Serão poucos a apontar Portugal como favorito à conquista do título, até porque a Alemanha está muito forte, a Argentina tem Messi, o Brasil joga em casa e a Itália é... a Itália. E ainda há a Espanha, a Holanda, até a Bélgica ou a Colômbia, ou uma equipa africana. Portugal, enfim, tem Cristiano Ronaldo e é uma incógnita.

Como esta é a derradeira hipótese para fazer prognósticos arrogo-me a ser absolutamente otimista e tento calcular as hipóteses, mesmo que remotas, de CR7 levantar o caneco no mítico de todos os estádios: o Maracanã.

O exercício é facilitado por uma ferramenta elaborada pelo jornal «The Guardian», que possibilita a criação de um sorteio total, desde a distribuição das equipas pelos grupos até ao campeão do mundo. A solução que dá Portugal como vencedor do torneio não surge à primeira, mas é possível. O jornal refere que tem como critério primordial o ranking das seleções, adicionando-lhe um «extra», aquele sal que só o futebol possui e que pode muito bem chamar-se Cristiano Ronaldo.

Pois bem, o meu sorteio definiu que Portugal estará naquele que será considerado o «grupo da morte», pelo caminho vai enfrentar alguns dos seus demónios, mas terá a maior recompensa numa final com o anfitrião. É altamente improvável, todos sabemos, mas o percurso é possível.

Desde logo a fase de grupos, com a colocação de Portugal no H, juntamente com a Colômbia, a Inglaterra (sorteada como a seleção europeia a cair no pote 2) e os Estados Unidos. Apesar de possuir o pior ranking destas quatro, a Seleção Nacional ganha o grupo, deixando o segundo lugar para a Colômbia, enquanto a Inglaterra fica em terceiro e os Estados Unidos em quarto. Os jogos do grupo H têm lugar em Belo Horizonte, em Cuiabá, no Rio de Janeiro, em Porto Alegre, em São Paulo e em Curitiba. Ou seja, evita-se Manaus.

Nos oitavos-de-final o vencedor do grupo H defronta o segundo classificado do Grupo G. E quem é essa equipa? A França. Dá para rir, mas logo aqui podemos exorcizar um dos fantasmas de Portugal, com Cristiano Ronaldo a ter também a oportunidade de despachar Ribery. O jogo realiza-se na Arena Fonte Nova, em Salvador.

Seguem-se os quartos-de-final, que colocarão a Espanha no caminho de Portugal, depois de eliminar a Argentina. Haverá algo mais motivador do que ultrapassar a campeã do mundo em título, aquela que quase conseguimos vencer no último Europeu? Brasília será o palco ideal para que isso aconteça, a 5 de julho de 2014.

Nesta altura Portugal já é um dos principais favoritos à conquista da «Copa». Ficaram para trás, Inglaterra, França e Espanha. Está na hora de defrontar a outra grande surpresa do Mundial: a Croácia. Um duelo de outsiders, que ditará uma surpresa para a final. Portugal segue em frente e defronta o Brasil no Maracanã. A final sonhada, com o adversário sonhado, no palco de todos os sonhos.

O Guardian não dá pormenores sobre o resultado, sobre a marcha do marcador ou sobre as grandes figuras do encontro. Apenas coloca a Taça ao lado da bandeira de Portugal e ilustra a conquista com uma foto de Cristiano Ronaldo, que diz: «Eu estou aqui». O feito da Seleção, a confirmar-se, virá atualizar o conceito de «Maracanazo», cravado em 1950 pela conquista do Uruguai e mais precisamente pelo golo apontado por Alcides Ghiggia.

Um novo legado e a imortalidade para os jogadores portugueses. A hipótese parece tão remota que só mesmo uma sugestão aleatória, fabricada por uma máquina, nos permite construir o sonho.

Ghiggia, agora com 86 anos, vai estar na Costa do Sauípe para participar no sorteio do Mundial. Para ele só há um desejo: «Gostaria muito de uma nova final entre Brasil e Uruguai. Seria maravilhoso, mas no futebol é preciso ter sorte». Para um outro monstro do futebol, Zinedine Zidane, não é impossível Portugal sonhar com o título e por uma razão muito concreta. «O Cristiano Ronaldo vai fazer o que já tem vindo a fazer por Portugal e no Real Madrid. O que ele faz dentro de campo é monstruoso. É um exemplo e realmente carrega a equipa, impulsiona», disse o francês, habituado a eliminar o Brasil nos Mundiais.

Não sei como Nuno Matos vai gritar os golos de Portugal no Maracanã a 13 de julho. Talvez perca a voz entretanto, mas os muitos milhares de portugueses que estiverem naquelas bancadas não terão de esperar 50 anos para gritar o golo da vitória, como aconteceu com os uruguaios e ficou imortalizado num momento revisitado recentemente no estádio «El Centenário», em Montevideu.



PS: Enquanto escrevia este texto surgiu a notícia da morte de Nelson Mandela. Pensei reescrever tudo. Afinal não fazia muito sentido falar do Mundial se uma das personalidades dos últimos cem anos tinha acabado de morrer. Mas Madiba merece que continuemos a lutar por um futuro melhor, por uma sociedade mais justa, equalitária e com pessoas capazes de sonhar o impossível. Nasci num tempo em que Mandela estava preso, participei em manifestações pelo fim do apartheid, vi-o sair da prisão, um país a erguer a bandeira e a crescer. Vi Mandela sorrir novamente e ganhar o Prémio Nobel da Paz. Li Mandela, deixei-me inspirar pela sua luta e agradeci por poder ter vivido nos mesmos tempos que ele. Descanse em paz, senhor Mandela.

«Um domingo qualquer» é um espaço de opinião quinzenal do jornalista Filipe Caetano