O campeão de inverno fez-se de luta e muito suor. E talento, também. O Benfica venceu o clássico sem ter de abdicar da vertigem, da forma como gosta realmente de jogar. O FC Porto provou que está longe de ter os problemas resolvidos, mesmo que com Carlos Eduardo seja melhor do que com Josué, ou Defour ou outro qualquer. Ricardo Quaresma voltou de peito feito, mas pouco acrescentou ao que Licá já tinha feito. Não foi Mustang nem Harry Potter, apenas mais um.

Do lado dos encarnados, deu-se tudo. Os jogadores suaram tudo o que podiam para ganhar todas as bolas, e só assim foram capazes de controlar o rival que tantas tristezas lhe tem dado neste estádio. Acreditou mais, quis mais, chegou mais rápido, foi melhor.

Baralhar e dar de novo

Quando tudo parecia prever que Jorge Jesus ia apoiar-se num 4x3x3 com mais um médio de cobertura, como Amorim ou Fejsa, o treinador do Benfica manteve o plano original: Enzo e Matic, com Rodrigo e Lima na frente (4x4x2). Várias razões poderão ter estado na origem da decisão e só podemos tentar adivinhá-las, antes de o próprio as poder explicar na conferência de imprensa que se segue. 

Haverá ainda algum défice físico de Rúben, que tem regressado aos poucos? Fejsa ainda não terá convencido totalmente o treinador, pelo menos quando Matic também está no onze? Jesus não terá querido perder o bom momento dos dois avançados, que têm estado a melhor na forma como combinam na frente, e o faro de Rodrigo, que há bastante tempo não marcava tanto? Ou, simplesmente, terá sido um risco calculado, abdicando um pouco do controlo a meio-campo, onde os dragões se têm também mostrado algo frágeis, a favor da vertigem e do contra-ataque de sempre. Manter-se fiel às origens.

Fiel aos seus princípios (desde que descobriu Carlos Eduardo)

Paulo Fonseca manteve o plano B, o tal que entrou em vigor assim que deu espaço a Carlos Eduardo e que o FC Porto começou a melhorar. Licá continuou como opção, quando talvez se pensasse em alguém que apoiasse mais o meio-campo, como por exemplo Josué ou mesmo Defour, que chegou a fazer com Vítor Pereira essa posição. A arma Ricardo Quaresma e sobretudo o joker chamado Kelvin (que poderia, imagina-se, mexer com a cabeça dos homens de Jesus) ficariam guardados para mais tarde.

O equilíbrio, segundo Enzo

Os dragões sempre deram menos espaço aos rivais nas transições do que o contrário, mas os encarnados foram, por seu turno, capazes de cortar mais bolas em passes de risco do que os portistas. Para isso muito contribuiu a inteligência de Enzo, que sempre se conseguiu coordenar com Matic, Rodrigo, Lima e Markovic, mas não só. Também conseguiu estar perto da zona em que os rivais podiam falhar. Aos 13 minutos, só com a sua presença, forçou Lucho a um péssimo passe, e o talento em bruto de Markovic fez o resto. Diagonal em velocidade, e uma assistência fabulosa carregada de classe a colocar a bola à frente do pé esquerdo de Rodrigo, já preparado para explodir. Um grande golo em memória do King, o rei Eusébio, várias vezes lembrado esta noite.

Ainda antes dos 20 minutos, o Benfica cedeu. Deixou de controlar o que tinha conseguido até aí no que à bola diz respeito, perdendo-a com muita facilidade, e possibilitou que o FC Porto desenhasse caminhos até perto da baliza à guarda de Oblak. Sem perigo na maior parte das vezes, mas sempre em cima do risco de algo acontecer. O que podia ter surgido no último minuto do primeiro tempo, se Jackson não tivesse falhado o que não costuma, depois de bom trabalho de Licá.

Da segurança de Oblak ao «hat-trick» de Mangala

A segunda parte praticamente começa com Lucho mais subido e um FC Porto mais ofensivo, e com um livre direto muito perigoso, a favor dos dragões. Carlos Eduardo atirou com muito jeitinho para as mãos de Oblak, que nem pestanejou. Muito sereno sempre.

No entanto, o Benfica reequilibrou-se e começou a crescer, ganhando praticamente todos os duelos individuais no meio-campo rival. Com um Matic a ganhar força e um Markovic disponível para tudo (jogo mais consistente desde que chegou a Portugal?), os encarnados reconquistaram o domínio do encontro e colocaram o rival em xeque.

Do outro lado, Mangala começava a desfiar erros. Aos 52, impediu com a mão ao lado da cara que Matic cabeceasse para a baliza (penálti parece claro, visto da bancada), e na jogada seguinte chega tarde ao movimento de Garay, que cabeceia para o 2-0. Nove minutos depois, deixa-se passar por Rodrigo com uma facilidade anormal, o que só não deu o 3-0 porque o internacional sub-21 espanhol atirou demasiado alto perante Helton. Um hat-trick de erros graves.

A impotência naquele empurrão de Jackson (e não só)

Não só, mas também. Nos passes errados no primeiro tempo, de Otamendi, Helton e Mangala, estava a insinuação de algo não estava bem no dragão. Depois houve aquela forma disparatada como o colombiano encarou a maior agressividade de Maxi Pereira junto à linha lateral. Um empurrão que lhe valeu um cartão amarelo (boa decisão de Artur Soares Dias, já que não tem a intensidade de uma agressão) e muitas palavras azedas dos adversários, que pediam outra cor na cartolina.

E, depois, veio a simulação de Danilo, que já tinha um amarelo, na tentativa de inventar o penálti, e o consequente vermelho. O lateral portista viu naquela jogada a única forma de encurtar distâncias, já que mais nada resultava. O FC Porto foi mesmo de menos na Luz!